“Em agosto de 1980, um grupo de 114 estudiosos se reuniu para analisar os argumentos oferecidos pelo teólogo australiano Desmond Ford, que colocavam em xeque a tradicional interpretação adventista sobre o santuário. O encontro contribuiu para a rejeição das ideias de Ford, consolidando a clássica posição defendida pela igreja. Como resultado prático desses debates, o Instituto de Pesquisa Bíblica da sede mundial da denominação (BRI, em inglês) lançou sete livros entre 1986 e 1992, publicados em português pela editora Unaspress como volumes da série “Santuário e Profecias Apocalípticas”.”
Você pode adquirir esta obra completa aqui
Embora o apóstolo João nunca cite diretamente o Antigo Testamento em sua profecia, é evidente que ele se utiliza consideravelmente de suas imagens. Estas alusões, formando um verdadeiro mosaico da fraseologia do Antigo Testamento, podem ser classificadas sob dois formatos: (1) ecos e (2) alusões diretas.
Através dos séculos, muitos conceitos do Antigo Testamento se separaram de suas raízes bíblicas para formar um acervo de ideias simbólicas comumente usadas e compreendidas por todos. A utilização desses símbolos comuns por João pode ser denominada “ecos” (do Antigo Testamento); eles transmitem seu próprio significado, além de sua matriz original do Antigo Testamento.
Por outro lado, João às vezes modela determinada porção de sua profecia por uma seleção do Antigo Testamento que ele pretende que seus leitores notem. Designadas como “alusões diretas”, essas passagens do Antigo Testamento podem esclarecer o significado daquela porção do Apocalipse em que João usa as imagens emprestadas.
Neste capítulo, o presente autor classifica as “alusões diretas” segundo sua utilidade na interpretação do Apocalipse e sugere os critérios pelos quais elas podem ser identificadas como “alusões diretas”.
Que ninguém pense que por não poder explicar o significado de cada símbolo do Apocalipse, é-lhe inútil pesquisar este livro numa tentativa de conhecer o significado da verdade que ele contém. Aquele que revelou estes mistérios a João dará ao diligente pesquisador da verdade um antegozo das coisas celestiais. Aqueles cujo coração está aberto à recepção da verdade serão capacitados a compreender seus ensinos, e ser-lhes-á garantida a bênção prometida àqueles que “ouvem as palavras desta profecia, e guardam as coisas que nela estão escritas” (WHITE, 2007, p. 584-585).
Embora não devamos esquecer o conselho acima, os guias de estudo sugeridos neste capítulo habilitarão o sério estudante da Bíblia a explorar com maior precisão os veios da verdade espiritual por baixo da superfície desta superior profecia das Escrituras.
O livro de Apocalipse: sua natureza
Deus tem considerado apropriado em cada estágio da produção das Escrituras oferecer Sua revelação em linguagem apropriada ao tempo, local e circunstâncias do escritor original. Deus não ignora a cultura, formação, estilo literário ou maneiras de pensar dos indivíduos a quem Ele se revela. Em vez disto, Ele procura diligentemente encontrá-los onde eles estão a fim de que possam compreender, o máximo possível, Suas revelações a eles e por intermédio deles (cf. 1Co 9:19-23).
Por exemplo, Deus apresentou a mesma mensagem básica a Nabucodonosor em Daniel 2 como Ele fez ao profeta em Daniel 7. Mas para o rei pagão as nações foram retratadas na forma de um ídolo. Isto é natural, sendo que ele compreendia as nações como gloriosas e brilhantes representações dos deuses a quem elas serviam. Para o profeta hebreu, por outro lado, as nações foram retratadas como ele as via: animais devoradores e ferozes que estavam escravizando e destruindo o seu povo. Deus falou a cada um dentro da sua linguagem e ambiente cultural a fim de comunicar uma mensagem acerca de Seus planos para o futuro.
As palavras que as pessoas usam e os significados que essas palavras transmitem são o produto da experiência passada de uma pessoa. A linguagem está limitada em expressão ao que é familiar às pessoas em um determinado tempo e lugar. Mesmo o futuro só pode ser descrito na linguagem da experiência passada e presente de uma pessoa.
Quando o Êxodo de Israel do Egito é descrito no Antigo Testamento, por exemplo, a linguagem usada faz lembrar ao leitor a fraseologia pela qual a poderosa atividade divina na Criação e no Dilúvio é descrita no livro de Gênesis. Por exemplo, tanto Noé como Moisés foram livrados por uma “arca” calafetada com betume (Êxodo 2:3; cf. Gênesis 6:14). No Êxodo, como na Criação, a presença divina trouxe luz para as trevas e um divisor das águas (Êxodo 13:21; cf. Gênesis 1:3-5; Êxodo 14-21; cf. Gênesis 1:6-8). Comum a todas as três descrições é o uso de “terra seca” (Josué 4:18; Êxodo 14:21, 29; cf. Gênesis 8:11, 13; 1:9, 10) e “sede frutíferos e multiplicai-vos” (Êxodo 1:7; cf. Gênesis 9:7; 1:28).
Precisamente como a descrição do Êxodo se utiliza das descrições de ações divinas anteriores, assim o exílio para Babilônia e a restauração de Babilônia são descritos nos profetas pela linguagem da Criação e do Êxodo. A Criação, por exemplo, é o modelo para Isaías 65:17-19. O Êxodo provê o modelo para vários dos profetas (Os 2:8-15; Mc 7:15-20; Is 4:2-6; 11:15-16; 43:16-19).
Da mesma maneira, as profecias concernentes ao Messias foram proclamadas em termos de um profeta como Moisés, um filho de Davi e um sacerdote segundo a ordem de Melquisedeque. Deus, em cada caso, usou a linguagem do passado como uma ferramenta para comunicar Sua vontade presente e/ou Seu plano para o futuro.
Portanto, não deve ser nenhuma surpresa descobrir que as visões do Apocalipse não estão cheiras de helicópteros, espaçonaves, computadores e bombas nucleares. Em vez disto, elas estão expressas nas imagens do passado da igreja do Novo Testamento. Embora se originando no trono de Deus, o Apocalipse foi comunicado em linguagem apropriada ao tempo, lugar e circunstâncias do autor humano, João.
“A Bíblia não nos é dada em elevada linguagem sobre-humana. A fim de chegar aos homens onde eles se encontram, Jesus revestiu-Se da humanidade. A Bíblia precisa ser dada na linguagem dos homens” (WHITE, 2008, v. 1, p. 20). Embora uma profecia de eventos futuros a partir da perspectiva do autor, a linguagem da experiência anterior da igreja proveu a linguagem com a qual descrever esse futuro.
Conquanto a Bíblia possa frequentemente descrever nosso futuro, é importante ter em mente que a linguagem por meio da qual tais profecias foram comunicadas era a linguagem de outro tempo e lugar que não os nossos. É muito fácil impor ao texto significados mais apropriados ao nosso tempo e lugar do que à situação em que Deus originalmente falou. Descobrir o significado original da linguagem do texto nos guarda contra nossa tendência natural de recriar o texto bíblico à nossa própria imagem.1
Quando falamos de “significado original”, é claro, não devemos supor que o autor original ou a audiência original compreendia plenamente o propósito divino na revelação a eles comunicada. O que estamos afirmando é que o propósito divino foi plena e adequadamente representado na frágil e localizada expressão de um falível escritor humano.2 Portanto, o significado original da linguagem do texto é decisivo para uma correta compreensão das Escrituras. Aplicar à linguagem do texto significados mais apropriados ao nosso tempo e lugar é lançar-nos em uma jornada para todos os tipos de destinos fantásticos que, embora possam parecer bíblicos, são de fato contrários à intenção divina para essa passagem.
Portanto, nosso estudo do método se iniciará com um cuidadoso exame da linguagem do Apocalipse a fim de determinar que procedimentos são mais apropriados para o estudo do livro. Somente se formos pacientes o suficiente para estudar o Apocalipse em seus próprios termos compreenderemos corretamente as visões concedidas ao seu autor (FIORENZA, 1976, p. 13).
Um livro cristão
É evidente pela primeira frase (“revelação de Jesus Cristo”) que o Apocalipse é um livro cristão (1:1). Jesus Cristo está presente em toda parte, tanto explicitamente (Ap 1:1, 2, 5, 9; 11:15; 12:10, 17; 14:12; 17:6; 19:10; 20:4, 6; 22:16, 20, 21) quanto em símbolos (Ap 1:12-16; 5:5-7; 7:17; 12:5, 11; 14:1-3). Há referências a igrejas (Ap 1–3; 22:16) e à cruz (Ap 1:18; 5:6, 9, 12; 11:8; 12:11). O leitor atento também se torna consciente de dezenas, se não centenas, de ecos recordando temas, vocabulário e teologia do Novo Testamento.3 Embora o livro tenha um diferente estilo, vocabulário e assunto, não devemos esperar, portanto, que sua teologia seja radicalmente diferente do que encontramos em outros textos do Novo Testamento (HALVER, 1969, v. 32, p. 58).
Uma revelação divina
Segundo o prefácio (1:1-3), o autor compreende sua obra como sendo a de transmitir à igreja uma mensagem visionária de Deus. Ele repetidamente aponta para uma origem sobrenatural as cenas descritas em seu livro (Ap 1:10-20; 2:7, 11, etc.; 4:1-2; 10:11; 17:1-3; 19:9-10; 22:6-10). Ele se considera um profeta e sua obra uma profecia. Sua autoridade é igual à dos apóstolos e dos profetas do Antigo Testamento. As “palavras da profecia” devem ser obedecidas (1:3). Sua autoridade é tão inquestionável que nenhuma palavra deve ser adicionada ou subtraída (22:18-19).
Por outro lado, há considerável evidência (esboçada abaixo) de que uma multidão de alusões à literatura anterior com a qual João estava familiarizado são borrifadas através das visões. Até que ponto o livro é visionário e até que ponto é ele pesquisado, desenvolvido e escrito pelo autor humano? Felizmente, não precisamos fazer tão difícil distinção. Quer as alusões venham de Deus quer sejam o resultado da meditação de João sobre as visões, isso não faz nenhuma diferença para o resultado. Se, como ressaltamos acima, Deus sempre fala no tempo, lugar e circunstâncias do escritor original, o produto final (o texto) fala adequadamente em nome de ambos! Por amor à conveniência e facilidade de expressão, porém, neste capítulo falaremos geralmente em termos de “a intenção do autor” ou “intenção de João” sem, através disso, pretender insinuar que o livro é meramente um produto humano.
Para os adventistas do sétimo dia, talvez seja instrutivo relembrar a experiência de Ellen G. White, que teve visões das coisas celestiais semelhantes àquelas de João. Recentes estudos têm indicado, porém, que ela pesquisou longa e arduamente para encontrar a melhor maneira de expressar o que ela havia recebido na linguagem que seria apropriada aos leitores em seu tempo e lugar.
Visões e pesquisa podem trabalhar juntas dentro de um simples ser humano para produzir um livro que transmita comunicações da mente de Deus.
A presença do elemento divino no Apocalipse indica que o significado final do livro frequentemente vai além do que o autor humano poderia ter compreendido. Isto, porém, não autoriza intérpretes a procurar indiscriminadamente no livro todos os tipos de ampliados significados. Precisamente como Deus limitou-Se a Si mesmo quando assumiu a natureza humana na encarnação, assim também Se limitou quando escolheu expressar-Se na Escrituras através da linguagem de autores humanos.4
Conquanto a intenção de Deus possa transcender a compreensão do autor humano, sua intenção é expressa por meio da linguagem escolhida pelo autor humano. Portanto, qualquer que seja a intenção divina percebida na passagem, ela deve ser uma extensão natural da própria linguagem e propósito do autor.5
Um livro profético
Relacionada com a questão da intenção divina é a reivindicação do livro de prover informação verdadeira em relação ao futuro. O Apocalipse diz respeito às coisas que “em breve devem acontecer” (1:1); coisas que “hão de acontecer depois destas” (1:19). Fala do regresso de Cristo e dAquele que “há de vir” (1:7- 8; 4:8). Promete recompensas ao vencedor (2:7, 11 etc.).
O Apocalipse aponta para um futuro tempo de selamento (7:1-3); para uma futura “hora da provação” (3:10; 7:14); para uma futura multidão redimida (7:9-11; 19:1-3); para uma grande proclamação final do evangelho (10:8-11; 14:6-12); para um juízo final (11:18; 20:11-15); e para uma grande batalha final (12–20) culminando na vinda de Cristo (14:14-20; 19:11-13.), introduzindo o final e universal domínio de Deus (11:15-17; 21–22:5). Assim, o Apocalipse está preocupado principalmente com eventos que são futuros a partir da perspectiva do autor.
Ambiente da Ásia Menor
O texto do Apocalipse esclarece que o livro foi dirigido a sete igrejas da província romana da Ásia (1:4; cf. 22:16).6 Portanto, não nos deve surpreender se às vezes o livro usa símbolos e conceitos que ocorrem na literatura não bíblica e na mitologia. O autor não pesquisou, necessariamente, esses símbolos; eles lhe vieram como expressões vivas que seriam familiares a qualquer um que vivesse na época na Ásia Menor (MORANT, 1969, p. 19).
Conquanto em princípio possamos estar um tanto desconfortáveis com a ideia de que um escritor bíblico possa ter empregado em seu livro algumas figuras mitológicas (por exemplo, animais de sete cabeças), devemos lembrar a natureza profética do Apocalipse. Os profetas usavam a linguagem comum da época para comunicar eficazmente. Assim, os estudiosos que têm encontrado antigas analogias para várias partes do Apocalipse podem nos ajudar a compreender melhor a intenção das imagens do livro (ver BETZ, 1969, p. 155; HEDRIK, 1971, p. 94-95; SWEET, 1979, p. 41).7
Linguagem apocalíptica
É imediatamente evidente que o livro de Apocalipse não está escrito em prosa comum. Logo no início o livro é declarado ser “revelado em símbolos” (1:1, tradução literal). Uma águia fala, gafanhotos ignoram a vegetação, um grande dragão vermelho persegue uma mulher através do céu, um leão é transformado em um cordeiro que vence tudo. Esta não é a linguagem típica do Novo Testamento (HALVER, 1964, v. 32, p.156). O Apocalipse é tão simbólico que o leitor precisa evitar ser demasiado literal na interpretação (MAURO, 1925, p. 23).8
Contudo, tal simbolismo cósmico era uma forma um tanto comum de procedimento literário naqueles dias. Livros como Enoque Etiópico, 4 Esdras e 2 Baruque expressam sentimentos e teologia no que tem sido denominada ”linguagem apocalíptica” (ver CHARLESWORTH, 1983-1984, v. 1). Assim, embora a linguagem do Apocalipse seja frequentemente estranha e simbólica, sua mensagem está fundamentada firmemente na realidade. Muito provavelmente o leitor cristão do primeiro século tinha relativamente pouca dificuldade em compreender os principais símbolos do livro (BARR, 1984, p. 40-41).9
Portanto, o intérprete do Apocalipse dos dias modernos precisará levar em consideração a literatura apocalíptica dos tempos, que o ajudará a compreender como a linguagem apocalíptica era entendida no primeiro século d.C.
Importância do Antigo Testamento
Embora possam aparecer algumas alusões a fontes não bíblicas, é certo que o Apocalipse não pode ser compreendido sem contínua referência ao Antigo Testamento (BULLINGER, 1970, p. 17; FEUILLET, 1959, p. 55; SCROGGIIE, p. 22). Ele é “um perfeito mosaico de passagens do Antigo Testamento” (MILLIGAN, 1892, p. 72). A total infiltração do Antigo Testamento no Apocalipse indica que ele é a principal chave para desvendar o significado dos símbolos do livro. Os ouvidos da audiência de João estavam muito melhor sintonizados para assimilar as alusões ao Antigo Testamento do que é o caso hoje com muitas congregações cristãs (LINDARS, 1976, p. 65). O Antigo Testamento fornecia um meio de “descodificar” a mensagem do Apocalipse que não estava disponível ao observador externo (HOYT, 1953, p. 7).10
Nosso estudo do Apocalipse deve, portanto, incluir uma completa compreensão da história, poesia, linguagem e temas do Antigo Testamento. Sem tal compreensão, o significado do livro permanece oculto em grande parte.
Problema de alusões
Afirmar que o Apocalipse está saturado de conceitos do Antigo Testamento por si só não aborda a questão de como eles são usados no livro. O leitor totalmente familiarizado com o Antigo Testamento percebe rapidamente que o Apocalipse jamais cita o Antigo Testamento.11 Antes, alude a ele com uma palavra aqui, um conceito ali, uma frase em outro lugar (HASEL, 1982, v. 1, p. 105; SWEET, 1979, p. 39). Conquanto esteja claro que o Antigo Testamento é básico para qualquer compreensão do Apocalipse, nem sempre está claro a que parte do Antigo Testamento está se fazendo alusão em um dado verso (VOS, 1965, p. 18).
Um método exegético que desvendará os símbolos do Apocalipse deve incluir diretrizes para determinar quando e de que maneira o autor está aludindo ao Antigo Testamento.
Estrutura repetitiva
À medida que o leitor obtém maior familiaridade com o Apocalipse, torna-se claro que a estrutura do livro está estritamente relacionada com o seu significado. Há sete igrejas, sete selos, sete trombetas e sete cálices ou taças. Muitos temas e símbolos que reaparecem em intervalos regulares (BARR, 1984, p. 43). Quase cada passagem tem analogias em outro lugar do livro. O Apocalipse contém tal complexidade de entrelaçadas analogias que determinada passagem pode estar mais estreitamente relacionada com material da outra extremidade do livro do que com passagens vizinhas (THOMPSON, 1985, p. 16-17). Assim, o intérprete precisa ter um bom conhecimento da estrutura e conteúdo de todo o livro e estar ciente do impacto do todo sobre a passagem em estudo.12
Um ambiente de adoração
Uma das mais impressionantes características do Apocalipse é a sua repetida descrição de cenas de adoração no Céu, geralmente no contexto de imagens relacionadas com o santuário do Antigo Testamento (Ap 4; 5; 7:9-12; 8:2- 6; 11:15-19; 15:5-8; 19:1-8). Não somente há um grande número de hinos no livro (Ap 4:11; 5:9, 10, 12, 13; 7:10, 12; 11:15, 17), mas as próprias bênçãos e maldições sobre aqueles que leem e ouvem o Apocalipse indicam uma leitura pública do livro em um ambiente de adoração (1:3; 22:18-19).
Estes fatos sugerem que precisa ser dada atenção às práticas cristãs de adoração do primeiro século, às imagens do santuário do Antigo Testamento, aos serviços religiosos da sinagoga judaica e aos targuns aramaicos que se desenvolveram nas sinagogas judaicas.
Conclusão
As características do livro de Apocalipse já examinadas chamam a atenção para o método. O método adequado para o estudo do Apocalipse refletirá estas características e as utilizará para esclarecer a intenção do autor. Volvemo-nos agora para um método proposto a fim de “decifrar o código” deste fascinante livro, com ênfase especial sobre como descobrir e validar alusões feitas por João a fontes do Antigo Testamento.
Interpretando o Apocalipse
As realidades previamente observadas no texto de Apocalipse sugerem que o intérprete deve seguir quatro passos fundamentais em seu estudo: (1) Fazer uma exegese básica (ou exposição) da passagem que está sendo estudada. (2) Examinar analogias relevantes em outras partes do Apocalipse. (3) Encontrar as fontes das imagens do Antigo Testamento. (4) Descobrir se o Novo Testamento expande o significado desses símbolos à luz do evento-Cristo.
Exegese básica
O primeiro passo em torno da compreensão da mensagem do Apocalipse é determinar o que o autor estava dizendo aos seus leitores originais em seu tempo, lugar e circunstâncias. O termo “exegese” é uma palavra derivada do grego que significa “extrair”. Assim isto veio designar o processo de permitir que o texto bíblico fale por si mesmo, em vez de impor à passagem um significado que se origina com o leitor. Consequentemente, a exegese básica dá atenção ao significado das palavras (pelo uso de léxicos e dicionários teológicos), à sintaxe (como as palavras se relacionam umas com as outras em uma sentença), à estrutura da passagem e seu contexto imediato e à relação que a passagem tem com sua situação contemporânea.
A situação contemporânea é esclarecida aprendendo-se o que pode ser conhecido acerca dos primeiros ouvintes e seu ambiente social, as preocupações que estimularam o autor a escrever e a literatura paralela da época, se disponível.
Prestimosas introduções ao Apocalipse podem ser encontradas em muitos comentários e em “introduções ao Novo Testamento”. Para o Apocalipse, um exame de outros escritos apocalípticos é especialmente proveitoso.
Tais métodos de exegese, cuidadosamente efetuados, produzem uma compreensão razoavelmente clara da maioria dos livros do Novo Testamento. Mas no Apocalipse eles produzem um resultado insatisfatório. É possível em Apocalipse conhecer plenamente bem o que João está dizendo e ainda não ter absolutamente nenhuma ideia do que ele tem em vista (HALVER, 1964, v. 32, p. 7). Assim, é necessário um método mais amplo, mais teológico de exegese para fazer justiça ao Apocalipse.
Paralelos dentro do Apocalipse
O próximo passo é examinar como os símbolos e estruturas de uma dada passagem são usados em outros lugares no Apocalipse. Quando o autor tem claramente definido sua intenção no contexto, é sem propósito procurar interpretações criativas fora do livro. Por exemplo, em 3:21 e 11:18 o autor fornece um resumo interpretativo em adiantamento do material a seguir. Ignorar esse resumo em favor de alguma “chave” externa limitaria, em vez de realçar, a compreensão de sua intenção.
O Apocalipse é singular por sua estrutura incrivelmente entrelaçada. Isto é tanto assim que a chave para o material em uma extremidade do livro pode frequentemente ser encontrada na extremidade oposta. O contexto imediato de qualquer passagem pode ser tão vasto como todo o livro. Exemplos de óbvias estruturas paralelas em Apocalipse incluem as trombetas e as taças, e o cavaleiro do cavalo branco nos capítulos 6 e 19.
O exame de tais estruturas paralelas habilita o estudante a aplicar às passagens difíceis ideias obtidas das mais claras. Por exemplo, muitos exegetas concordam que as sete taças ou pragas (cap. 16) são juízos de Deus sobre aqueles que o rejeitaram. Pareceria razoável, portanto, esperar um tema similar nas sete trombetas, um segmento em que há pouca concordância.
A fonte do Antigo Testamento
O próximo passo importante é determinar a que texto(s) do Antigo Testamento João está aludindo.
Enquanto nos movemos para esta seção decisiva, o leitor é lembrado da discussão anterior sobre a autoria divino-humana do Apocalipse. A impressão deixada pelo livro é de visões celestiais escritas por alguém que pesquisou cuidadosamente suas expressões nas Escrituras do Antigo Testamento. Sendo que João em Patmos talvez não tenha tido acesso ao Antigo Testamento, é possível que ele possa ter “pesquisado” sua memória ou tivesse as alusões trazidas à sua mente diretamente por Deus.
Todavia, quer as alusões surgissem na mente de Deus quer na de João, elas refletem a mente de Deus e a mente de João à qual Deus se revelou.
Como salientamos anteriormente, expressões tais como “o autor”, “o intento de João” ou “o autor cita” não devem ser compreendidas como significando que o livro de Apocalipse é meramente um produto humano. Tais expressões são apenas uma maneira conveniente de se referir à complexidade da autoria divino-humana do livro em sua totalidade.
Torna-se cada vez mais evidente para aqueles que estudam em profundidade o Apocalipse que as expressões do livro estão inteiramente saturadas da linguagem, história e ideias do Antigo Testamento. Assim, é impossível compreender corretamente o Apocalipse se o seu antecedente veterotestamental não for levado a sério.
“Podemos dizer de uma forma geral, que até que tenhamos sucesso em expor a fonte do Antigo Testamento para uma profecia apocalíptica, não temos interpretado essa passagem” (KRAFT, 1974, v. 16a, p. 16).
Somente quando é compreendida a base ou antecedente do Antigo Testamento se pode esperar que o Apocalipse revele segredos que podem ter sido perfeitamente claros para o leitor do primeiro século (CORSINI, 1983, v. 5, p. 33; HOYT, 1953, p. 1-2, 7; MOUBCE, 1977, v. 17, p. 39; TENNEY, 1957, p. 112). O problema é como saber que texto(s) do Antigo Testamento João tinha em mente quando ele escreveu (GUNDRY, 1967, p. 4-5; TENNEY, 1957, p. 101; TRUDINGEN, 1963, p. 40; VOS, 1965, p. 18-19, 112). Contudo, o profeta jamais cita o Antigo Testamento; meramente alude a ele.13 O problema de identificar uma alusão torna-se mais complicado quando descobrimos que em muitas ocasiões João parece ter citado imprecisamente de memória (JOHNSON, 1896, p. 29; SMITH JR., 1972, p. 61; TOY, 1884, p. xx), ou adaptado à linguagem do Antigo Testamento para se ajustar à sua necessidade (COLLINS, 1984, p. 42; CORSINI, 1983, v. 5, p. 32; FEED, 1965, p. 129; PERMAN, 1941, p. 53; PRESTON; HANSON, 1949, p. 35; STAGG, 1975, p. 333-334; STENDAHL, 1954, p. 159; VANHOYE, 1962, p. 461-472; VOS, 1965, p. 23-32). É também muito possível que ele tenha usado uma tradição textual diferente da que temos à nossa disposição (NICOLE, 1940, p. 9-11; TENNEY, 1957; TRUDINGER, 1963, p. 17).
Para complicar as coisas ainda mais, o Antigo Testamento é escrito em uma língua diferente da do Novo Testamento. Assim, expressões do Antigo Testamento em hebraico são encontradas na “tradução grega” do Novo Testamento (NICOLE, 1940, p. 11-12). Simplificaria grandemente as coisas se o autor do Apocalipse sempre tivesse citado da tradução grega do Antigo Testamento como a Septuaginta. Mas estudos recentes têm mostrado que o Apocalipse diverge amplamente da Septuaginta. É muito possível que João fizesse sua tradução (CHARLES, 1920, v. 1, p. lxvi) e às vezes se utilizasse de tradições textuais que nos são relativamente desconhecidas, tais como os targuns aramaicos e a tradição textual hebraica representada em Qumran (TRUDINGER, 1966a, p. 82-88).
Assim, a busca de alusões não pode ser considerada cientificamente completa sem um exame muito mais amplo das fontes do Antigo Testamento do que tem sido possível no passado.14 Felizmente, não é necessário identificar cada alusão à Bíblia Hebraica a fim de responder ao Apocalipse (COLLINS, 1984, p. 44, 48). No entanto, controles cuidadosos devem ser postos em prática se uma lista de analogias do Antigo Testamento ao Apocalipse deve ser digna de alguma coisa (BLACK, 1976, p. 135). É interessante observar que dez importantes comentaristas sobre o livro de Apocalipse apresentam listas amplamente divergentes de alusões ao Antigo Testamento no Apocalipse (ver PAULIEN, 1988, v. 11, p. 121-154). Isto demonstra que a tarefa não é fácil.
Duas espécies de alusões. Antes de esboçar um método para determinar a presença de uma alusão ao Antigo Testamento, devemos distinguir entre duas espécies de alusões. Uma espécie assume a intenção do autor em apontar para o leitor uma obra anterior como um meio de expandir os horizontes do leitor. A porção do texto em estudo só pode ser compreendida à luz da alusão em seu contexto original.15 Uma alusão intencional como esta é chamada “alusão direta”.
O outro tipo de alusão, que chamaremos de “eco”, não depende da atenta consciência de um uso literário anterior (HOLLANDER, 1981, p. 95). Muitas das figuras literárias do Apocalipse eram incertas no ambiente em que João vivia (ALTICK, 1975, p. 94). Embora ele utilize um “símbolo vivo” mencionado em dezenas de lugares do Antigo Testamento, ele não está necessariamente ciente de sua história. Antes, ele extrai de um fundo comum de linguagem prontamente compreendido por seus leitores (HEDRIK, 1971, p. 17; EZELL, 1977, p. 21).
Um eco está assim divorciado de seu contexto original. Enumerar passagens do Antigo Testamento em que um eco é encontrado não é proveitoso. O que importa é o significado básico do eco. Um bom exemplo de eco é a figura de vegetação como um símbolo para o povo de Deus. Usado com tal regularidade parece ter atingido um significado fixo nos tempos do Antigo Testamento (compare Sl 1:3; Is 5:1-7; Jr 2:21 com Ap 8:7; 9:4). Isto de modo algum exclui, porém, a possibilidade de que um eco de significado bastante fixo pudesse ser aplicado diferentemente em diferentes contextos.16
Resumindo, referências alusivas ao Antigo Testamento podem entrar no Apocalipse de duas maneiras. João pode usar uma fonte do Antigo Testamento direta e conscientemente tendo em mente o seu contexto original. Tal alusão é “vontade de ser” (BAKER, 1984, p. 7-8). João está plenamente consciente da fonte bem como sua relevância para sua composição. Ele admite o conhecimento do leitor tanto da fonte quanto da intenção do autor em recorrer àquela fonte (HOLLANDER, 1981, p. 106).
Por outro lado, o profeta pode “ecoar” ideias do Antigo Testamento, cuja origem não o preocupa. Em um eco ele não aponta ao leitor uma fonte de fundo específico; meramente utiliza um “símbolo vivo” que geralmente será compreendido por seus leitores contemporâneos.
A distinção entre alusões diretas e ecos é muito significativa para o estudo do Apocalipse. Deixando de fazer esta distinção, os comentaristas às vezes têm interpretado ecos como se o autor tivesse a intenção de que seu leitor incorporasse o contexto de uma fonte em sua compreensão do Apocalipse. A distinção entre alusões e ecos realmente exigem duas diferentes abordagens à interpretação, dependendo da natureza da relação do autor com uma fonte específica em uma determinada passagem (ALTICK, 1975, p. 95-96).
Alusões diretas. A presença de uma alusão direta requer que o intérprete associe o material à sua fonte (HOLLANDER, 1981, p. 106). João assume que a fonte de literatura é conhecida e que o leitor pode extrair ideias do contexto da fonte que melhorem sua compreensão da profecia do Apocalipse. Mas a fim de lidar adequadamente com alusões diretas é necessário identificar corretamente suas fontes.
O procedimento para a identificação de alusões diretas opera por um processo de eliminação. Analogias sugeridas podem ser recolhidas de comentários, referências marginais e listas de alusões ao Antigo Testamento. Estas são então examinadas para ver se satisfazem um ou mais dos três critérios para uma alusão direta (veja abaixo). Quanto mais critérios uma referência satisfaz, mais provável é que João tinha em mente essa passagem específica do Antigo Testamento quando escreveu essa porção do Apocalipse.
Os três critérios são os seguintes:
1. Paralelos verbais. O termo “citação” não está claramente definido na literatura (TRUDINGER, 1963, p. 12-15; 1966b). Todavia, uma boa definição é dada por Trudinger (1966a, p. 82): “Alguém pode dizer que está citando quando usa combinações de palavras de uma forma em que não poderia usá-las se não fosse por um conhecimento de sua ocorrência nesta forma específica em outra fonte.”
Por esta definição é evidente que o termo “citação” só pode raramente, se alguma vez, ser aplicado ao uso do Antigo Testamento pelo profeta. Apenas ocasionalmente João usa mais de três ou quatro palavras na mesma sequência em que elas são encontradas no Antigo Testamento (TENNEY, 1957, p. 101). Assim, os paralelos verbais podem ser compreendidos em um sentido mais amplo do que as citações.
Um paralelo verbal, portanto, é definido como ocorrendo sempre que pelo menos duas palavras de mais do que menor significado (artigos, preposições e conjunções menores são normalmente excluídos) são paralelas entre uma passagem do Apocalipse e uma da Septuaginta ou de outra versão do primeiro século d.C.17 Essas duas importantes palavras podem ser acopladas em uma frase, ou podem até mesmo ser separadas – desde que estejam em clara relação entre si em ambas as passagens do paralelo sugerido.
Os paralelos verbais são descobertos colocando-se o texto de Apocalipse lado a lado com o texto-fonte em potencial. O fraseado que é exato ou semelhante e enfatizado, e a relação em potencial entre as passagens e avaliada em uma base preliminar.
Um bom exemplo de paralelo verbal e encontrado em Apocalipse 9:2: “E a fumaça do poço subiu como a fumaça de uma grande fornalha (tradução do autor). Isto tem uma notável semelhança com o fraseado de Êxodo 19:18 na Septuaginta.18 Um exemplo de um paralelo verbal onde duas palavras-chave não estão ligadas gramaticalmente pode ser visto comparando-se Apocalipse 9:2 com Genesis 1:2.19 Quanto mais palavras importantes que são encontradas em comum, maior a probabilidade que uma alusão direta esteja presente. Uma alusão direta não deve ser assumida com todo paralelo verbal; a observação de fraseado comum é apenas parte do processo de acumular evidência para uma alusão direta.
2. Paralelos temáticos. Muitas vezes o profeta claramente tem em mente uma passagem do Antigo Testamento, mas usa uma diferente palavra grega da Septuaginta, ou usa apenas uma simples palavra para fazer a conexão. Isto não deve surpreender. As alusões por sua própria natureza não são obrigadas a reproduzir o fraseado preciso do original (VOS, 1965, p. 112). Podem envolver ideias bem como fraseado, e incluir semelhança de tema e deliberado contraste (BAKER, 1984, p. 10; TENNEY, 1957, p. 101). Tais paralelos de uma só palavra são distinguidos dos “ecos” em que há uma evidente relação temática entre os contextos em que as palavras paralelas são encontradas.
Os paralelos temáticos podem ser encontrados não somente pela comparação com a Septuaginta, mas também comparando-se o intento do grego do Apocalipse com o hebraico e o aramaico do Antigo Testamento (ver MCNAMARA, 1978, v. 27a; TRUDINGER, 1966a). Tais equivalentes Greco semíticos são colocados em uma categoria separada por causa do maior nível de incerteza quanto à intenção do autor.
Um exemplo de paralelo temático é dado por Tenney (1957, p. 102). Ele nota que embora o termo “todo-poderoso” ocorra muitas vezes no Antigo Testamento, somente em Amós 4:13 (LXX) ele é usado em um contexto que é paralelo a Apocalipse 1:8. O conceito de contextos paralelos provê uma salvaguarda conta a seleção indiscriminada.
Outro paralelo temático pode ser encontrado comparando-se Apocalipse 9:4 e Ezequiel 9:4. Em ambos os casos é colocado um sinal na testa com a finalidade de proteção contra os juízos divinos. As duas passagens são claramente paralelas, embora seja usada uma palavra grega diferente para “marca”.20 Contudo, não se deve supor automaticamente apenas deste paralelo que o revelador está apontando para Ezequiel 9:4. Mas a observação deste tema semelhante é parte do processo de acumular evidência para determinar a intenção de João.
3. Paralelos estruturais. Às vezes o profeta de Apocalipse usa o Antigo Testamento construindo sobre a estrutura literária ou teológica de seções inteiras sem necessariamente seguir o fraseado exato (BEALE, 1984, p. 307; HEDRIK, 1971, p. 17; VANHOYE, 1962, p. 440-441).21 Ocorre um paralelo estrutural quando João modela uma determinada passagem em um texto do Antigo Testamento, utilizando sua linguagem e temas em aproximadamente a mesma ordem.
Um bom exemplo de tal paralelo estrutural pode ser visto comparando-se Apocalipse 9:1-11 com Joel 2:1-11. Note que ambas as passagens começam com um toque de trombeta, mencionam trevas, um exército de gafanhotos, uma descrição daquele exército e finalmente uma referência ao líder daquele exército. Outros paralelos entre as duas passagens incluem a ansiedade daqueles que são afligidos pelo exército de gafanhotos, o escurecimento do sol e um ruído de carros.22
Os paralelos estruturais não estão limitados às passagens paralelas. Às vezes eles ocorrem em relação com estruturas históricas ou teológicas mais amplas que vão além de passagens específicas do Antigo Testamento. Por exemplo, as sete trombetas bem como as sete últimas pragas de Apocalipse são inquestionavelmente paralelas às pragas de Êxodo descritas explicitamente em Êxodo 7–12 e outras porções do Antigo Testamento (Sl 78, 105, 135, 136) e implicitamente em uma multidão de referências nos profetas. Os relatos veterotestamentais da Criação, da queda de Babilônia e da conquista de Jericó são vistos como estando na base do material das sete trombetas.
O que está acima pode parecer semelhante aos paralelos temáticos, mas ali há uma sutil e importante diferença. Um paralelo temático está limitado a uma ideia específica em Apocalipse que tem um antecessor em potencial em uma passagem específica do Antigo Testamento. Juntamente com os paralelos verbais, os paralelos temáticos constituem os básicos blocos de construção pelos quais podem ser tomadas decisões concernentes à influência.
Contrastando, os paralelos estruturais ocorrem se uma seção de Apocalipse baseia-se ou em um antecessor literário (como Joel 2:1-11 para Apocalipse 9:1- 11) ou em uma grande estrutura teológica como o tema de Êxodo. Tais paralelos estruturais normalmente compreendem vários paralelos verbais e/ou temáticos.
Resumo de critérios. A fim de se qualificar como uma alusão direta ao Antigo Testamento, uma palavra ou frase de Apocalipse deve satisfazer no mínimo um dos critérios acima. Muitos satisfarão mais do que um.
Dos três, os paralelos verbais são frequentemente o critério mais fraco. Seu valor como evidência aumenta, porém, quando as várias palavras paralelas aumentam e ao ponto em que as palavras paralelas são ordenadas de um modo semelhante em ambas as passagens. Sendo que os paralelos estruturais consistem de vários paralelos verbais e temáticos integrados, eles normalmente constituem a mais forte evidência para uma alusão direta.
Quanto mais critérios uma alusão direta específica se ajusta, mais certo é que o autor conscientemente moldou sua passagem tendo em mente o contexto do Antigo Testamento (DODD, 1952, p. 126). A certeza é também afetada pelas várias passagens da literatura anterior em que palavras, conceitos e estruturas específicas
são encontrados. Quando determinado paralelo é singular em literatura anterior, a probabilidade de que João está dirigindo nossa atenção àquela passagem específica é correspondentemente aumentada (HARTMAN, 1966, p. 85, 115).
Classificação de alusões diretas
Nossa lista de alusões diretas ao Antigo Testamento em Apocalipse são apenas probabilidades. Aquele que cria a lista de alusões deve, portanto, indicar o nível de incerteza envolvido e, onde possível, as razões para essa incerteza.
As alusões em potencial podem ser classificadas em cinco categorias de probabilidade: alusões certas, alusões prováveis, alusões possíveis, alusões incertas, e não alusões.
Alusões certas. Estas existem quando a evidência para dependência é tão decisiva que o intérprete está certo ou praticamente certo de que João estava apontando para um texto antecedente. Um exemplo de alusão certa é a referência à sétima praga do Egito na primeira trombeta (cf. Êx 9:23-26; Ap 8:7). As pragas do Êxodo são um paralelo estrutural subjacente às sete trombetas como um todo.
Assim, esperaríamos que João refletisse pragas específicas em vários pontos da narrativa. A ação tanto da primeira trombeta quanto da sétima praga se origina no Céu, envolve uma mistura de saraiva e fogo caindo sobre a Terra, e resulta em destruição para a vegetação da Terra. Há também um paralelo temático: ambos os lances são juízos divinos sobre aqueles que se opõem a Deus e ao seu povo. Esta afluência de evidência leva esta alusão direta a um alto nível de certeza que é raro em Apocalipse.
Alusões prováveis. Essa classificação é atribuída a uma passagem quando a evidência de sua relação é considerável, mas fica aquém da certeza absoluta.
Um exemplo de alusão provável é a relação entre a primeira trombeta e Ezequiel 38:22. Os paralelos verbais e temáticos são virtualmente tão extensos como é o caso com Êxodo 9:23-26. Não somente isso, mas a combinação de saraiva, fogo e sangue que está sendo usada em juízo é exclusiva para Ezequiel 38.
Todavia, as sete trombetas são uma porção do Apocalipse que tem apenas referências mínimas a Ezequiel, de sorte que o paralelo estrutural está ausente. Assim, existe incerteza suficiente no tocante a essa alusão direta para levá-la a ser classificada como “provável” em vez de “certa”. Contudo, sendo que as alusões tanto certas quanto prováveis são consideradas suscetíveis de ter estado na mente do revelador quando ele escreveu, o intérprete deve levar em consideração o contexto original do texto de origem na interpretação da passagem de Apocalipse que contém a alusão.
Alusões possíveis. Em uma alusão possível, há evidência suficiente para indicar que João pode ter estado fazendo uma alusão direta à passagem do Antigo Testamento, mas não suficiente para ser razoavelmente certa. Um exemplo de uma alusão possível é a relação entre a primeira trombeta e Isaías 30:30.
Em Isaías 30:30, fogo e saraiva são derramados como juízos sobre os assírios. Contudo, embora a primeira trombeta contenha um paralelo verbal e um paralelo temático a Isaías 30:30, não se pode falar em nenhum paralelo estrutural, e os outros paralelos são relativamente fracos. Assim, é possível que João tivesse em mente essa passagem do Antigo Testamento quando escreveu a primeira trombeta, mas não há suficiente evidência para uma certeza razoável. Tal paralelo pode ser instrutivo para o intérprete, mas nunca deve ser usado como a única evidência para uma interpretação.
Alusões incertas. Estas parecem ter algumas ideias paralelas, mas as alusões são muito fracas. Entretanto, o intérprete não pode conclusivamente negar que elas são alusões diretas.
Na margem da vigésima-sexta edição do Novo Testamento Grego de Nestle-Aland, Ezequiel 5:12 está enumerado como paralelo para a primeira trombeta. A ausência de paralelos verbais e temáticos indica que é incerto que João aqui tivesse especificamente em mente Ezequiel 5:12, embora a expressão “terça parte” esteja presente em ambas as passagens. Mas se o conceito de uma “terça” foi extraído do Antigo Testamento, foi provavelmente baseado em Ezequiel 5:1-4 ou Zacarias 13:8-9 em vez de nessa passagem.23 O contexto de uma alusão incerta não deve ser usado na interpretação do Apocalipse, mas pode ser uma fonte para definir um ou mais “ecos”.
Não alusões. A categoria de “não alusão” é relevante somente quando se avalia as listas de alusões sugeridas. Depois de examinar, o intérprete conclui que não há nenhuma evidência de que o autor tinha em vista um paralelo entre os dois textos. Eugen Hühn, por exemplo, achava que a primeira trombeta fazia referência a Isaías 2:13, em que árvores são usadas como um símbolo do soberbo e altivo a quem Deus humilhará (HÜHN, 1900, p. 247). A ausência de
um paralelo verbal no grego, e de quaisquer paralelos temáticos ou estruturais, nega a esse paralelo sugerido a condição de uma alusão direta. A definição de árvores por Isaías, porém, pode ser “ecoada” por João na primeira trombeta.
A conclusão de tal estudo deve, é claro, permanecer um tanto experimental. Mas não é necessário traçar cada paralelo ao Antigo Testamento a fim de compreender a mensagem básica do livro (COLLINS, 1984, 44, 48). Conquanto o intérprete deva ser receptivo a nova evidência que possa levar paralelos específicos a serem reavaliados de vez em quando, o procedimento acima coloca em uma base mais objetiva a interpretação de alusões diretas ao Antigo Testamento em Apocalipse.
O Novo Testamento
Já temos notado que o livro de Apocalipse é um livro cristão e está repleto de uma multidão de paralelos a outros livros do Novo Testamento. O que temos no Apocalipse é uma declaração de Jesus em “muitas, muitas telas” (SCHMIDT, 1947, p. 177). Como um verdadeiro resumo da mensagem do Novo Testamento, ele é com razão colocado no final do cânon neotestamentário (HALVER, 1964, v. 32, p. 58).
Traçar paralelos de ambos os Testamentos sugere que o livro de Apocalipse é praticamente uma declaração sumária dos temas de toda a Bíblia (MOLATT, 1984, p. 30). Um estudioso chama o Apocalipse de “o final da sinfonia bíblica” (MOLATT, 1984, p. 30). Outro declara: “Neste livro todos os outros livros da Bíblia terminam e se encontram” (JAMIESON; FAUSSET; BROWN, 1961, p. 1526).24
Portanto, o autor do Apocalipse não usa a linguagem e ideias do Antigo Testamento de um modo insipidamente literal (VOS, 1965, p. 36-40). O significado sugerido pelas alusões ao Antigo Testamento para os símbolos do Apocalipse deve ser visto à luz do evento Cristo (EZELL, 1977, p. 23; FORD, 1982, p. 98; KRAFT, 1974, v. 16a, p. 85; LESTRINGANT, 1942, 152). A vitória de Jesus Cristo é o novo princípio organizador da história no Apocalipse (SCHLIER, 1964, p. 361).
É claro que sua experiência com Jesus e a inspiração do Espírito Santo (1:10) levou João a cristianizar os materiais do Antigo Testamento com os quais ele estava trabalhando (BARR, 1984, p. 42). Assim, nós também devemos interpretar esses conceitos através do prisma do evento-Cristo (EZELL, 1977, p. 23; FORD, 1982, p. 98). A melhor maneira de fazer isto é procurar paralelos do Novo Testamento para as expressões do Antigo Testamento no livro de Apocalipse. Este processo pode ocorrer por meio do mesmo método usado para determinar alusões ao Antigo Testamento no Apocalipse.
Os escritores do Novo Testamento compreendiam a Cristo como cumprimento do intento básico do Antigo Testamento.25 Isto é verdade não apenas de escolhidas profecias messiânicas, mas de todo o espectro da história do Antigo Testamento. Jesus é a nova criação (2Co 5:17), nascido por meio do Espírito que envolve Maria (cf. Lc 1:35 com Gn 1:2). Ele é o novo Adão (Rm 5 e 1Co 15); feito à imagem de Deus (2Co 4:4; Cl 1:15), casado com uma nova Eva (Ef 5:32- 33 — a igreja), e em pleno domínio sobre a Terra (Jo 6:16-21), sobre os peixes do mar (Lc 5:1-11; Jo 21), e sobre todos os seres vivos (Mc 11:2).
Jesus Cristo é um novo Moisés (Jo 5:45-47), que é ameaçado em seu nascimento por um rei hostil (Mt 2), passa 40 dias jejuando no deserto, impera sobre 12 e ordena 70, dá a lei de um alto monte (Mt 5:1-2), alimenta seu povo com o pão do céu (Jo 6:28-35) e ascende ao Céu depois da ressurreição. Ele é o novo Israel, que sai do Egito (Mt 2), passa pelas águas (Mt 3:13-17), é levado pelo Espírito ao deserto, passa pelas águas uma segunda vez (Lc 12:50 — batismo na cruz) e entra na Canaã celestial.
Tais exemplos poderiam ser multiplicados. No Novo Testamento, Jesus é o novo Isaque, o novo Davi, o novo Salomão, o novo Eliseu, o novo Josué e o novo Ciro. Os escritores do Novo Testamento veem a vida, morte e ressurreição de Jesus como cumprindo toda a experiência do povo de Deus desde Adão até João Batista.
Como deveria o cristão se relacionar com esta história? Cumprindo todo o Antigo Testamento em Sua própria experiência, Jesus estava atualizando essa experiência para todos os que estão “nEle”. NEle o crente se torna um verdadeiro israelita (Gl 3:29; At 13:32-33; 2Co 1:20) quando confessa que Jesus é o Messias (Jo 1:47-50), Aquele que deveria realizar as esperanças de Israel. Assim todo o Antigo Testamento torna-se relevante para a experiência do cristão. Quem crê em Cristo é parte de um novo Israel (LARONDELLE, 1983, p. 121). “Não há nenhuma mudança na fraseologia empregada no Novo Testamento, mas há positivamente uma mudança concernente ao povo a quem essas profecias e designações agora se aplicam. No Novo Testamento, fala-se da igreja na linguagem empregada no Antigo Testamento concernente a Israel” (WERE, 1977, p. 30).
A transferência do Novo Testamento do termo “Israel” da nação judaica para a igreja tem um profundo impacto sobre a maneira como a história e a profecia do Antigo Testamento é colocada a serviço da igreja. O Novo Testamento universaliza as promessas da aliança (PAULIEN, 1984, p. 375). Israel não deve ser mais visto em termos étnicos ou geográficos (1Pe 2:4-10; Tg 1:1). O Shekiná é visto na reunião daqueles que creem em Jesus (Mt 18:20). O verdadeiro templo na Terra é espiritual e mundial, modelado segundo o verdadeiro tabernáculo dos lugares celestiais (2Co 6:14-18; Gl 4:26; Hb 8:1-2). Babilônia e Egito são também espiritualizados e representam os inimigos da igreja.
Assim, as imagens do Antigo Testamento não devem ser insipidamente aplicadas ao livro de Apocalipse. Como os autores do Novo Testamento, João está plenamente cônscio do impacto do evento Cristo sobre as realidades espirituais. A menos que o significado de Jesus Cristo e a cruz sejam deixados a permear os símbolos do Apocalipse, a interpretação resultante não será cristã, não importa quão frequentemente Cristo possa ser nomeado em sua explicação.26
Considerações finais
Por causa das limitações de espaço, este capítulo é demasiado breve para mostrar todas as implicações de um método exegético para o estudo do Apocalipse. Assim, os aspectos do método que poderiam ser pertinentes para o especialista foram deixados de lado. Aqueles que gostariam de explorar em profundidade os problemas envolvidos na aplicação do método para as complexidades das línguas originais seriam aconselhados a examinar o meu livro mais técnico sobre o assunto (ver PAULIEN, 1988, v. 11).
O método não pode ser aprendido pela mera leitura deste capítulo. Deve ser descoberto em experiência interativa com o texto. Quanto mais tempo se gasta examinando os paralelos verbais, temáticos e estruturais, mais se tem a sensação da dinâmica envolvida no uso da linguagem pelo autor.
Para examinar onde o autor está fazendo uma alusão direta, temos de lidar com probabilidades. Onde não temos certeza se João está fazendo uma alusão direta, seria melhor deixar o contexto do Antigo Testamento fora da discussão deste texto específico do Apocalipse.
Embora não seja irrazoável, não é historicamente certo que o autor do Apocalipse tivesse acesso a qualquer dos documentos do Novo Testamento. Seu conhecimento do ensino do Novo Testamento pode ter vindo através de experiência direta com Cristo, com a tradição oral e/ou documentos agora perdidos para a história. Assim, é geralmente mais seguro admitir que João se baseia em uma tradição comumente compreendida do que em documentos específicos do Novo Testamento.
Sem dúvida, o não especialista que ler este capítulo se sentirá desanimado acerca das possibilidades de usar tal método. Com pouca experiência na prática da exegese, pouca ou nenhuma experiência da apocalíptica judaica ou do ambiente cultural da Ásia Menor do primeiro século, nenhum conhecimento do grego, hebraico, ou aramaico, muitos leitores serão tentados a levantar as mãos em desespero.
Felizmente, embora esse conhecimento e habilidades sejam extremamente proveitosos, eles são raramente decisivos para a interpretação do livro de Apocalipse. Por exemplo, a vasta maioria de alusões ao Antigo Testamento no livro de Apocalipse é claramente evidente até mesmo nas traduções em nosso idioma. As imagens apocalípticas são certamente estranhas, mas para aqueles que estão familiarizados com o Antigo Testamento, o livro perde bastante de sua estranheza.
Deve-se admitir, é claro, que as habilidades acadêmicas e o preparo do especialista podem salvaguardá-lo de opiniões falhas baseadas em informação inadequada.
Todavia, indivíduos não familiarizados com as línguas originais ou com antigos materiais básicos podem contribuir grandemente para o contínuo crescimento da igreja nesta área pela aplicação de outras salvaguardas como as seguintes:
1. Em todas as oportunidades para o estudo, o estudante do Apocalipse deve orar fervorosamente por uma atitude de aprendizagem e uma abertura à direção do Espírito Santo. Sem oração e a iluminação do Espírito Santo, a obra até mesmo do mais excelente erudito pode sutilmente se desviar. A intenção divina não é controlada por mentes seculares. O testemunho unido das Escrituras é que os “pensamentos [de Deus] não são os vossos pensamentos” (Is 55:8) e as coisas espirituais “se discernem espiritualmente” (1Co 2:14).
2. O uso de várias traduções pode proteger o estudo da Bíblia da aberração ocasional introduzida por tradução defeituosa ou por erros na transmissão manuscrita. Estas podem ser complementadas pelo uso de uma concordância analítica, como a de Strong ou de Young, que levará o estudante de volta ao fraseado original sem a necessidade de aprender um alfabeto desconhecido.
3. A maior parte de um período de estudo da Bíblia deve ser gasta nas seções das Escrituras que são razoavelmente claras. É através de passagens claras das Escrituras que as passagens obscuras, tais como os selos e as trombetas do Apocalipse, podem ser compreendidas mais exatamente. A fascinação excessiva por textos e assuntos problemáticos pode resultar em distorção gradual da compreensão, levando a opiniões estreitas e frequentemente fanáticas que dividirão a igreja.
4. Os resultados do estudo detalhado, como pesquisas de concordância e análise de alusões, devem ser comparados com muita leitura geral das Escrituras para que a obsessão com detalhes não desvie ninguém da ênfase central da passagem que está sendo estudada. É possível provar quase tudo com uma concordância. Este perigo é minimizado, porém, quando cada passagem é compreendida à luz de muita leitura geral das Escrituras no contexto, preferivelmente em uma tradução clara e atualizada onde o contexto mais amplo pode ser visto a surgir.
5. Os métodos eficientes devem ser aplicados às contribuições que Ellen White oferece para a compreensão de textos difíceis.27 Muito dano pode ser feito quando sua autoridade na igreja é usada de uma maneira irregular, resultando em uma distorção da intenção do escritor das Escrituras. Corretamente compreendida, a inspiração se harmoniza consigo mesma. Os princípios 3 e 4 acima se aplicam também aos escritos do Espírito de Profecia.
6. É prudente que os intérpretes individuais estejam abertos às críticas construtivas de seus colegas, principalmente daqueles que discordam deles.
Aqueles que discordam de nós frequentemente podem apontar para realidades no texto que temos omitido por causa de nossas estreitas perspectivas. Tal crítica é particularmente valiosa quando vem de indivíduos que são dotados de capacidade invulgar e/ou com recursos, como o conhecimento das línguas originais, que pode ajudar na exegese.
Concluindo, a tarefa delineada neste capítulo não é fácil, mas é emocionante. Por meio de uma cuidadosa aplicação do método, os estudantes da Bíblia podem obter uma compreensão mais profunda da mensagem do Apocalipse. Ao serem tais percepções partilhadas dentro do corpo da igreja, correção mútua pode ocorrer. Juntos, podemos crescer em nossa compreensão do Apocalipse e caminhar em direção daquele grande reavivamento prometido.28
_______
1 Embora um conhecimento do grego e do hebraico não seja imprescindível para a compreensão da Bíblia (veja a conclusão deste capítulo), a leitura do texto na língua original nos ajuda a fugir das associações familiares que as palavras em nosso idioma têm com nosso ambiente moderno. Na tradução é mais fácil importar inconscientemente significados contemporâneos para nossa leitura do texto.
2 ”A Bíblia foi escrita por homens inspirados, mas não é a maneira de pensar e exprimir-se de Deus. Esta é da humanidade. Deus, como escritor, não se acha representado. Os homens dirão muitas vezes que tal expressão não é própria de Deus. Ele, porém, não se pôs à prova na Bíblia em palavras, em lógica, em retórica. Os escritores da Bíblia foram os instrumentos de Deus, não sua pena. Olhai os diversos escritores. Não são as palavras da Bíblia que são inspiradas, mas os homens é que o foram. A inspiração não atua nas palavras do homem ou em suas expressões, mas no próprio homem que, sob a influência do Espírito Santo, é possuído de pensamentos. As palavras, porém, recebem o cunho da mente individual. A mente divina é difusa. A mente divina, bem como sua vontade, é combinada com a mente e a vontade humanas; assim as declarações do homem são a Palavra de Deus” (WHITE, 2008, v.1, p. 21).
3 Para listas de paralelos à linguagem e temas do Novo Testamento, veja Rudolf Halver (1964, v. 32, p. 58-70), William Milligan (1892, p. 42-70) e Henry B. Swete (1906).
4 “A Escritura Sagrada, com suas divinas verdades, expressas em linguagem de homens, apresenta uma união do divino com o humano. União semelhante existiu na natureza de Cristo, que era o Filho de Deus e Filho do homem. Assim, é verdade com relação à Escritura, como o foi em relação a Cristo, que ‘o Verbo [ou Palavra] se fez carne e habitou entre nós’ (Jo 1:14)” (WHITE, 2005, p. vi).
5 Os escritores inspirados nem sempre compreendiam o conteúdo da revelação divina (veja Daniel e 1Pe 1:10-13). Mas eles retinham o controle do texto (veja nota 8). No caso do Apocalipse, o texto objetivava fazer sentido para seus leitores originais (Ap 1:3-4, 9-11; 22:16) bem posteriores.
Nota editorial: A opinião de que o Apocalipse “fazia sentido” para seus leitores originais não significa que os últimos viam ou esperavam cumprimentos imediatos da profecia total em seus dias (opinião preterista). Muitos aspectos da visão estavam no futuro distante. As profecias messiânicas também “faziam sentido” para os profetas do Antigo Testamento, mas eles sabiam que seu cumprimento seria futuro para os seus tempos (1Pe 1:10-12).
6 Como com qualquer comunicação apostólica inspirada, a profecia teria tido significado igualmente para outras congregações cristãs (cf. Cl 4:16).
7 De especial auxílio é o comentário sobre Apocalipse de David Aune da série Word Biblical Commentary. Aune é um especialista tanto no Apocalipse como no antigo mundo romano.
8 Não há dúvida de que muitos assuntos em Apocalipse se destinam a ser tomadas literalmente (as sete igrejas, Cristo, João, guerra, e morte etc.), mas a declaração clara no início (1:1) combinada com os fenômenos do livro indica que simbolismo é a ferramenta principal do idioma usado no livro.
9 A construção grega em Ap 1:3 (αкоυō no acusativo) indica que os leitores e ouvintes deveriam ter suficiente compreensão do livro para obedecê-lo.
10 Embora a autora sem dúvida tivesse experiências visionárias, o que ela escreveu é também claramente o produto de interpretação e reflexão teológica.
11 Das dezenas de estudiosos que fazem esta asserção, alguns importantes personagens serão suficientes, como: Kurt Aland (1975, p. 903), Adela Yarbro Collins (1984, p. 42), Elizabeth Schüssler Fiorenza (1980, p. 108), Halver (1964, v. 32, p. 11-12), Pierre Prigent (1981, p. 368) e H. Barclay Swete (1902, p. 392).
12 Algumas das melhores estruturas de Apocalipse incluem as apresentadas pelos seguintes autores: John Wick Bowman (1955, p. 440-43), Elisabeth Schüssler Fiorenza (1977, p. 358-66), Leroy C. Spinks (1978, p. 211-22) e K. A. Strand (1972, p. 48).
13 Contraste Apocalipse com o Evangelho de Mateus, que geralmente identifica a fonte de suas citações do Antigo Testamento (Mt 2:17, 19; 33:3 etc) (VANHOYE, 1962, p. 436).
14 Além da Sptuaginta, traduções gregas tais como Áquila, Símaco e Teodocião; Targuns Aramaicos tais como Neofiti I e Pseudo-Jônatas sobre o Pentateuco, e as traduções massoréticas, Qumran e Samaritana do hebraico deveriam ser consultadas.
15 Note as palavras de John Hollander (1981, p. 95) em seu The figure of Echo: A Mode of Allusion in Milton and After: “O texto ao qual se faz referência não está totalmente ausente, mas é parte da biblioteca portátil partilhada pelo autor e sua audiência ideal. A intenção de aludir reconhecidamente é essencial para o conceito.”
16 Contraste Apocalipse 7:1-3 e 9:4, onde os vegetais são protegidos dos juízos divinos por uma marca, com Ap 8:7, onde a vegetação é destruída pelos juízos divinos.
17 As versões existentes na Héxapla de Origenes (FIELD, 1964) provavelmente reflete ao menos algumas versões correntes quando o Apocalipse foi escrito. Os paralelos verbais não operam na tradução a menos que a transliteração esteja envolvida. Exemplo: “Messias” é claramente um paralelo verbal do hebraico meshiach.
18 Ap 9:2, kai anebē kapnos ek tou phreatos ōs kapnos kaminou megalēs; Êx 19:18 na LXX, kai anebainen ho kapnos, hōsei kapnos kaminou.
19 As conexões principais são os termos “trevas” (substantivo, skotos; verbo, skotoō) e “abismo” (abussos). Gn 1:2, LXX, kai skotos, epanō tēs abussou […] Ap 9:2, kai ēnoixen to phrear tēs abusou […] kai eskotōthē ho hēlios kai ho aēr.
20 Ez 9:4, LXX, semeiōn; Ap 9:4, sphragida.
21 Este critério inclui o que Morton Smith (p. 78, 115) chama “paralelos de forma literária” e “paralelos em tipos de associação”. Lars Hartman (1966, p. 126, 95, 118, 137) parece estar sugerindo algo semelhante ao meu conceito de “paralelo estrutural” em seu uso da frase “padrões de pensamento”. Ele também observa que Zc 12:2-4 provê a “estrutura” para 1 Enoque 56:5-8 (HARTMAN, 1966, p. 89).
22 Outros exemplos de paralelos na estrutura literária podem ser vistos comparando-se Apocalipse 1:12-18 com Daniel 7:9-13, e Daniel 10; Apocalipse 13 com Daniel 3 e 7; Apocalipse 18 com Ezequiel 26-28; e Apocalipse 19:11-16 com Isaías 63:1-6. Alguns até mesmo sugerem que todo o livro de Apocalipse está estruturado para se assemelhar ao livro de Ezequiel (ver GOULDER, 1981, p. 343-50; VANHOYE, 1962, p. 436-76)
23 Ezequiel 5:12 poderia concebivelmente ser relacionado com 5:1-4, que é uma provável alusão, mas isto não acrescentaria nada à nossa compreensão da primeira trombeta.
24 Note a aprovação de Ellen G. White (2007, p. 585) a esta declaração em Atos dos Apóstolos (paralelo verbal e temático!).
25 João 5:39-40; Lucas 24:25-27, 44-47. Um excelente estudo partindo de uma perspectiva adventista é Hans K. LaRondelle (1983).
26 Uma excelente aplicação deste princípio pode ser encontrada em Hans K. LaRondelle (1987, p. 108-145).
27 Veja neste volume, capítulo 7, “Uso de Daniel e Apocalipse por Ellen G. White”, e capítulo 8, “O uso dos escritos de Ellen G. White pelo intérprete”.
28 Ellen G. White (2002, p. 113) alega que: “Quando nós, como um povo, compreendermos o que este livro [Apocalipse] para nós significa, será visto entre nós grande reavivamento.”
Referências
ALAND, B.; ALAND, K.; KARAVIDOPOULOS, J.; MARTINI, C. M. METZGER, B. M. The
Greek New Testament. New York: United Bible Societies, 1975.
ALTICK, R. T. The Art of Literary Research. New York: W.W. Norton & Co., 1975.
BAKER, C. The Echoing Green: Romanticism, Modernism and Phenomena of Transference in Poetry. Princeton: Princeton University Press, 1984.
BARR, D. L. The Apocalypse as a Symbolic Transformation of the World: A Literary Analysis. Interpretation, v. 38, n. 1, p. 39-50, jan. 1984.
BEALE, G. K. The Use of Daniel in Jewish Apocalyptic Literature and in the Revelation of St. John. Lanham: [s. n.], 1984.
BETZ, H. D. On the Problem of the Religio-Historical Understanding of Apocalypticism. Journal of Theology and the Church, v. 6, p. 134-156, 1969.
BLACK, M. Some Greek Words With ‘Hebrew’ Meanings in the Epistles and Apocalypse. In: MCKAY, J. R.; MILLER, J. F. (Eds.). Biblical Studies: Essays in Honour of William Barcaly. Londres: Collins, 1976.
BOWMAN, J. W. The Revelation to John: Its Dramatic Structure and Message. Interpretation, v. 9, n. 4, p. 453-456, 1955.
BULLINGER, E. W. The Apocalypse. Londres: Attic Press, 1935.
CHARLES, R. H. The Revelation of St. John. Edimburgo: [s. n.], 1920. v. 1.
CHARLESWORTH, J. H. (Ed.). The Old Testament Pseudepigrapha. Garden City: Doubleday, 1983. v. 1.
COLLINS, A. Y. Crisis and Catharsis: the power of the Apocalypse. Philadelphia: Westminster Press, 1984.
CORSINI, E. The Apocalypse: the perennial revelation of Jesus Christ. Wilmington: Veritas Publications, 1983. (Good News Studies, 5). DODD, C. H. According to the Scriptures: the sub-structure of New Testament Theology. Londres: Nisbet, 1952.
EZELL, D. Revelations on Revelation: new sounds from old symbols. Waco: Word Books, 1977.
FARRER, A. A Rebirth of Images: the making of St. John Apocalypse. Gloucester: University Press, Glasgow, 1970.
FEUILLET, A. Le Messie et sa Mere d’apres le chapitre XII de l’Apocalypse. Revue Biblique, v. 66, n. 1, p. 55-86, jan. 1959.
FIELD, F. Origenis Hexaplorum. Hildesheim: Georg Olms Verlagsbuchhandlung, 1964.
FIORENZA, E. S. Apokalypsis and Propheteia: the book of Revelation in the context of Early Christian Prophecy. In: LAMBRECHT, J.; BEASLEY-MURRAY, G. R. (Eds.). l’Apocalypse johannique et l’Apocalyptique dans le Nouveau Testament. Michigan: J. Duculot, 1980. Composition and Structure of the Book of Revelation. Catholic Biblical Quarterly, v. 39, n. 3, p. 344-366, 1977.
FIORENZA, E. S. The Apocalypse. Chicago: [s. n.], 1976.
FORD, D. Crisis: a commentary on the Book of Revelation. Newcastle: Desmond Ford Publications, 1982.
FREED, E. D. Old Testament Quotations in the Gospel of John. Leiden, 1965. (Supplement to New Testament, 11).
GOULDER, M. D. The Apocalypse as an Annual Cycle of Prophecies. New Testament Studies, v. 27, n. 3, p. 342-367, 1981.
GUNDRY, R. H. The Use of the Old Testament in St. Matthew’s Gospel. Leiden: E. J. Brill, 1967. (Supplements to New Testament, 18).
HALVER, R. Der Mythos im Letzten Buch der Bibel: ein Untersuchung der Bildersprache der Johannes-Apokalypse. Hamburg-Bergstedt: Reich, 1964. (Theologische Forschung, 32).
HARTMAN, L. Prophecy Interpreted. Uppsala, 1966. (Coniectanea Biblica, New Testament Series, 1).
HASEL, G. F. La Prophetie et son accomplissement. In: LESHER, R. (Ed.). Prophetie et Eschatologie. Washington: Biblical Research Institute, 1982. v. 1.
HEDRIK, W. K. The Sources and Use of the Imagery in Apocalypse 12. Thesis (Th.D.), Theological Union, [S.l.], 1971.
HOLLANDER, J. The figure of Echo: A Mode of Allusion in Milton and After. Berkeley: University of California Press, 1981.
HOYT, E. A. Studies in the Apocalypse of John of Patmos. Ann Harbor: Literary Licensing, 1953.
HÜHN, E. Die alttestamentliche Citate und Reminiscenzen im Neuem Testament. Tübingen: [s. n.], 1900.
JAMIESON, R.; FAUSSET, A. F.; BROWN, D. Commentary Practical and Explanatory on the Whole Bible. Grand Rapids: Zondervan, 1961.
JOHNSON, F. The Quotations of the New Testament from the Old: considered in the light of general literature. Philadelphia: [s. n.], 1896.
KRAFT, H. Die Offenbarung des Johannes. Tübingen: Mohr, 1974. (Handbuch zum Neuen Testament, 16a).
LARONDELLE, H. K. Chariots of Salvation: The Biblical Drama of Armageddon. Washington: Adventist Book Center New Jersey, 1987.
_________The Israel of God in Prophecy: principles of prophetic interpretation. Berrien Springs: Andrews University Press, 1983.
LESTRINGANT, P. Essai sur l’unité de la revelation biblique: le problème de l’unité de l’evangile et de l’ecriture aux deux premiers siècles. Paris: Je Sers, 1942.
LINDARS, B. The place of the Old Testament in the formation of New Testament Theology. New Testament Studies, v. 23, n. 1, p. 59-66, 1976.
MAURO, P. The Patmos visions: a study of the Apocalypse. Boston: Literary Licensing, 1925.
MCNAMARA, M. The New Testament and the Palestinian Targum to the Pentateuch. Roma: Pontificio Instituto Biblico, 1978. (Analecta Biblica, 27a).
MILLIGAN, W. Lectures on the Apocalypse. Londres: [S.n], 1892.
MOLATT, D. Une Lecture pour aujourd’hui: L’Apocalypse. Paris: Éditions du Cerf, 1984.
MORANT, P. Das Kommen des Herrn: Eine Erklärung der Offenbarung des Johannes. Zürich: Thomas-Verlag, 1969.
MOUNCE, R. H. The book of Revelation. Grand Rapids: Wm. B. Eerdmans Publishing Co., 1977. (The New International Commentary on the New Testament, 17).
NICOLE, R. A Study of the Old Testament Quotations in the New Testament With Reference to the Doctrine of the Inspiration of the Scriptures. Dissertação (Mestrado), Gordon College of Theology and Missions, [s. n.], 1940.
PAULIEN, J. Critical Review: The Israel of God in Prophecy. Andrews University Seminary Studies, v. 22, 1984.
_____________. Decoding Revelation’s Trumpets. Berrien Springs: [s. n.], 1988. (Andrews University Seminary Dissertation Series, 11).
PERMAN E. L. Living Messages from Patmos. New York: [s. n.], 1941.
PRESTON, R. H.; HANSON, A. T. The Revelation of Saint John the Divine: the book of glory. Londres: SCM Press, 1949.
PRINGET, P. L’Apocalypse de Saint Jean. Lausanne: [s. n.], 1981. (Commentaire du Nouveau Testament, 14).
SCHLIER, H. Besinnung auf das Neue Testament: Exegetische Aufsdtze und Vortrdge. Freiburg: Herder, 1964.
SCHMIDT, K. L. Die Bildersprache in der Johannes-Apokalypse. Theologische Zeitschrift, v. 3, n. 3, p. 161-177, 1947.
SCROGGIE, W. G. The Great Unveiling. Grand Rapids: Marshall Pickering, 1979.
SMITH JR., D. M. The use of the Old Testament in the New. In: EFIRD J. M. (Ed.). The use of the Old Testament in the New and other essays. Durham: 1972.
SPINKS, L. C. Critical Examination of J. W. Bowman’s Proposed Structure of the Revelation. Evangelical Quarterly, v. 50, p. 211-222, 1978.
STAGG, F. Interpreting the Book of Revelation. Review & Expositor, v. 72, n. 3, p. 331-343, 1975.
STENDAHL, K. The School of St. Matthew. Uppsala: [s. n.], 1954.
STRAND, K. A. The Open Gates of Heaven. Washington: Ann Arbor, 1969.
SWEET, J. P. M. Revelation. Philadelphia: [s. n.], 1979. (Westminster Pelican Commentaries).
SWETE, H. B. An Introduction to the Old Testament. Cambridge: [s. n], 1902.
_____________. The Apocalypse of St. John. Londres: [s. n.], 1906.
TENNEY, M. C. Interpreting Revelation. Grand Rapids: Wm. B. Eerdmans Publishing Co., 1957.
THOMPSON, L. The Mythic Unity of the Apocalypse. In: RICHARDS, K. H. (Ed.). Society of Biblical Literature 1985 Seminar Papers. Atlanta: Society of Biblical Literature, 1985.
TOY, C. H. Quotations in the New Testament. New York: [s. n.], 1884.
TRUDINGER, L. P. The text of the Old Testament in the Book of Revelation. Tese. (Doutorado em Teologia). Universidade de Boston, Boston, 1963.
_____________. Some Observations Concerning the Text of the Old Testament in the Book of Revelation. Journal of Theological Studies, v. 17, n. 1, 1966a.
_____________. The Text of the Old Testament in the Book of Revelation. Journal of Theological Studies, v. 17, n. 1, 1966b.
VANHOYE, A. L’utilisation du livre d’ Ezechiel dans l’Apocalypse. Biblica, v. 43, 1962.
VOS, L. A. The Synoptic Traditions in the Apocalypse. Kampen: J. H. Kok, 1965.
WERE, L. F. The Moral Purpose of Prophecy: The Harmony Between Christian Experience and Prophetic Interpretation. Christian Realities Revealed in the Prophetic Pictures of the Apocalypse. [s. l.]: First Impressions, 1980.
WHITE, E. G. Atos dos apóstolos. Tatuí: Casa Publicadora Brasileira, 2007.
_____________. Mensagens escolhidas. Tatuí: Casa Publicadora Brasileira, 2008. v. 1.
_____________. O grande conflito. Tatuí: Casa Publicadora Brasileira, 2005.
_____________. Testemunhos para ministros. Tatuí: Casa Publicadora Brasileira, 2002.