Pequenos Deuses

“Não farás para ti imagem de escultura, nem semelhança alguma do que há em cima nos céus, nem embaixo na terra, nem nas águas debaixo da terra. Não as adorarás, nem lhes darás culto; porque eu sou o SENHOR, teu Deus, Deus zeloso, que visito a iniqüidade dos pais nos filhos até à terceira e quarta geração daqueles que me aborrecem e faço misericórdia até mil gerações daqueles que me amam e guardam os meus mandamentos.” (Êxodo 20:4-6)
(pág. 21-26)
O Segundo Mandamento
Por Loron Wade
Ainda estava escuro quando saímos de casa e começamos a percorrer as ruas desertas. Em pouco tempo, o brilho da cidade havia sumido atrás de nós, e continuamos a viagem seguindo o túnel de luz criado pelos faróis. Durante um bom tempo, o único som era o zumbido do motor e dos pneus sobre o pavimento.
Por fim, um toque de vermelho no horizonte começou a anunciar a aproximação do dia. Não demorou muito para que víssemos uma borda estreita marcada por intensa luminosidade. Era o Sol espiando por trás da colina próxima. De alguma forma, sem parecer que estivesse em movimento, ele se mostrou cada vez mais visível até que, minutos mais tarde, era dia.
Foi nosso filho mais velho quem quebrou o silêncio. Com apenas quatro anos de idade, David nos surpreendia constantemente com suas curiosas observações.
– Papai – disse ele – se viermos aqui amanhã cedinho e subirmos aquela montanha, você acha que poderemos estender a mão e pegar o Sol quando ele passar?
Pensei: Que visão de como trabalha a mente infantil! Não é que as crianças se considerem grandes; o que ocorre é que elas tornam o mundo pequeno. A vasta imensidão do Universo não cabe na sua pequena mente e, por isso, elas reduzem o tamanho de tudo.
Lá na floresta um homem está trabalhando. “Primeiro vou pegar um pouco de argila”, diz ele. “Depois, vou modelar assim. Veja, aqui estão os olhos e o nariz. Agora coloco isto ao sol por um pouco e, quando a argila estiver seca, vou pintá-la com minhas cores preferidas. Quer saber o que estou fazendo? É Deus, claro. Não adivinhou? Não, não é o próprio Deus. É a Sua representação. É assim que Ele Se parece.”
Meu pequeno de quatro anos achou que podia estender a mãozinha e tocar o Sol. E o homem na floresta acredita que pode fazer uma imagem de Deus. Ambos estão cometendo o mesmo erro.
O rei Salomão tinha um conceito melhor. Construiu um belo templo em Jerusalém. Quando estava pronto, ele organizou uma comemoração que durou vários dias. Em meio a toda aquela euforia, contudo, ele não perdeu de vista o verdadeiro significado do evento. Falou com Deus em oração e disse: “Eis que os céus e até o céu dos céus não Te podem conter, quanto menos esta casa que eu edifiquei” (2 Crônicas 6:18).
Por que o segundo mandamento proíbe fazer ídolos ou imagens para representar Deus? Porque, não importa quão grande os façamos ou quanto de ouro, diamantes e outras coisas usemos para cobri-los, a única coisa que conseguimos é tornar Deus menor. Inevitavelmente, nós O reduziremos à dimensão de um conceito meramente humano. E esse é realmente o âmago do problema. Uma imagem mental pobre acerca de Deus é o pecado fundamental que o segundo mandamento procura ajudar-nos a evitar.
Os racionalistas modernos cometem o mesmo erro. Lançam a pequena rede de sua habilidade intelectual no vasto oceano do Universo. O que conseguem captar é limitado pelo curto alcance dos seus sentidos e de sua capacidade de processar as informações obtidas. Tornam-se os donos daquela parcela de informação e negam a existência de tudo o mais. Como eu disse, é o mesmo erro, e isso prova que esse problema não se limita a pessoas ignorantes.
O Próprio Pai Ama Você
Nos tempos antigos, o resultado lógico da idolatria foi o politeísmo, a crença de que existem muitos deuses. As pessoas inventavam mais deuses porque não podiam imaginar que um só seria suficiente, que uma deidade conseguiria tomar conta de tudo.
Os cristãos primitivos se apegaram à idéia de que havia um só Deus. Porém, infelizmente, muitos dos novos conversos do paganismo entravam para a igreja com o mesmo conceito pobre a respeito de Deus que tinham antes. Inclinavam-se a ver Deus como um ser semelhante às divindades que costumavam adorar – seres esquecidos e indiferentes, não dispostos a ajudá-los. Eles sentiam que precisavam suplicar e implorar constantemente para vencer a apatia de Deus e convencê-Lo a interessar- Se por suas necessidades.

É difícil imaginar um erro maior. A Bíblia compara Deus com a mais poderosa expressão do amor humano, dizendo: “Acaso, pode uma mulher esquecer-se do filho que ainda mama, de sorte que não se compadeça do filho do seu ventre? Mas ainda que esta viesse a se esquecer dele, Eu, todavia, não Me esquecerei de ti. Eis que nas palmas das Minhas mãos te gravei” (Isaías 49:15 e 16).

Apesar dessa garantia, muitas pessoas chegaram a imaginar Deus como esquecido e relutante, com um exército de intercessores ao redor do Seu trono, clamando dia e noite para conseguir que nos ajude. Mas Jesus disse aos Seus seguidores: “Não vos digo que rogarei ao Pai por vós. Porque o próprio Pai vos ama” (João 16:26 e 27). E o apóstolo insistiu: “Acheguemo-nos, portanto, confiadamente, junto ao trono da graça,a fim de recebermos misericórdia e acharmos graça para socorro em ocasião oportuna” (Hebreus 4:16).
A idéia da intercessão por parte dos santos mortos viola claramente o segundo mandamento, porque se baseia no conceito pagão de um Deus limitado que dificilmente possa ser convencido a nos auxiliar.
Por Que Você Duvida?
Certo dia, eu estava parado nas docas de Guanaja, Honduras, enquanto um amigo me mostrava os barcos de pesca de camarão atracados nas docas. Seus guindastes estavam erguidos e as gigantescas redes secavam ao sol. Naquele entardecer, sairiam de novo. O amigo me contou acerca das toneladas de camarões que os barcos traziam cada dia.
Alarmado, pensei comigo mesmo: Nesse ritmo, não vai demorar para que os oceanos se esvaziem!
Na manhã seguinte, ao partir, voei ao longo da costa entre Guanaja e Puerto Cabezas. Sob a asa esquerda do avião, pude ver a silhueta azul das montanhas costeiras e, à direita, a imensidão do mar. Tentei adivinhar a quantos quilômetros de distância ficaria o ponto onde o horizonte se confunde com o céu.

Alguns minutos depois, vi três barcos de pesca de camarão lá embaixo, balançando-se sobre as ondas enquanto arrastavam as redes. Eram dos mesmos que eu tinha visto no dia anterior, mas agora pareciam minúsculos! E que contraste entre o seu tamanho e a vastidão do oceano! Então pensei: Que podem fazer esses pequeninos barcos para esgotar todo o tesouro que Deus tem estocado na Sua despensa? Como as coisas mudam quando as vemos de uma perspectiva diferente!

Refleti: E o que dizer da perspectiva de Deus? Por vezes, nossos problemas parecem encher a Terra e o céu. Como acha você que Deus os vê? Essa foi a lição que Pedro aprendeu numa noite tempestuosa, no Mar da Galileia. As gigantescas ondas e os ventos o encheram de pânico, e ele gritou: “Salva-me, Senhor!” (Mateus 14:30).

“E, prontamente, Jesus, estendendo a mão, tomou-o e lhe disse: Homem de pequena fé, por que duvidaste?” (verso 31). Medo e ansiedade vêm da falta de fé, e violam o segundo mandamento, porque mostram que na nossa mente Deus é muito pequeno.


Nunca Subestime o Poder de um Ídolo

O salmista escreveu acerca dos ídolos: “Tornem-se semelhantes a eles os que os fazem” (Salmo 115:8). O apóstolo Paulo observou o mesmo fenômeno em seus dias. Disse que os idólatras haviam mudado “a glória do Deus incorruptível em semelhança da imagem de homem corruptível, bem como de aves, quadrúpedes e répteis”.

Por isso, disse Paulo, “Deus os entregou a uma disposição mental reprovável, para praticarem coisas inconvenientes”. Ele esclarece o que quer dizer com “coisas inconvenientes” ao citar uma lista de pecados que incluem avareza, maldade, inveja, homicídio, contenda, dolo, malignidade, difamação, calúnia, insolência, arrogância, presunção, desobediência aos pais, perfídia, ausência de afeição natural e de misericórdia (Romanos 1:23, 28-31).

Não é um quadro bonito, concorda? Mas você acha que é um exagero? Há pouco tempo, fui ver as impressionantes ruínas do Monte Albán, em Oaxaca, México. Elas contêm imagens dos antigos deuses zapotecas, na forma de serpentes emplumadas, animais selvagens à espreita de suas vítimas e dezenas de figuras humanas com expressões grotescas de raiva e ódio. O guia nos mostrou um altar onde os sacerdotes arrancavam corações de vítimas vivas por ocasião das cerimônias. Depois nos levou a um campo de jogo, explicando que o time vencedor ou o perdedor era sempre sacrificado aos deuses. Referindo-se aos ídolos e seus adoradores, o salmista disse: “Tornem-se semelhantes a eles os que os fazem.” Ao meio-dia, retornei à cidade e fui a um restaurante. O lugar vibrava com o ritmo de uma canção popular, enquanto um “ídolo” moderno berrava:

“O dia todo penso em sexo.
A noite toda penso em sexo.
E o tempo todo penso em sexo
Com você, com você.”

As canções seguintes só eram diferentes no sentido de usar termos ainda mais vulgares para repetir a mesma mensagem.

Quem duvida de que os ídolos modernos tenham pelo menos tanto poder sobre as pessoas quanto os antigos? E ainda é verdade que aqueles que os fazem se tornam como eles. Em muitos sentidos, os resultados da idolatria moderna ultrapassam o que o apóstolo Paulo descreveu na sua época.


Milhares de Gerações

Algumas pessoas se surpreendem porque o segundo mandamento contém uma séria advertência acerca de imagens: “Não as adorarás, nem lhes darás culto; porque Eu sou o Senhor, teu Deus, Deus zeloso, que visito a iniquidade dos pais nos filhos até à terceira e quarta geração daqueles que Me aborrecem” (Êxodo 20:5). O que as assusta é o fato de Deus ter dito que é “zeloso”. Além disso, Ele declara que até três ou quatro gerações vão sofrer por causa dos pecados dos seus antepassados.

O problema vem de uma leitura superficial do texto. Note que aquilo que acontece com essas gerações não é uma vingança por parte de um Deus irado. O mandamento simplesmente diz que o “castigo” que essas pessoas sofrem é a “iniquidade dos pais”. Isso é exatamente o que o apóstolo Paulo tinha em mente na passagem mencionada antes. Ele diz que a adoração a ídolos, a exaltação da criatura acima do Criador, remove as barreiras e abre as comportas da depravação humana.

Quando as pessoas se tornam como seus ídolos, a terra se enche com violência, e o coração do povo se volta para a “malícia, avareza… inveja, homicídio, contenda, dolo e malignidade” (Romanos 1:29). Os indivíduos se tornam “caluniadores, aborrecidos de Deus, insolentes, soberbos, presunçosos, inventores de males, desobedientes aos pais, insensatos, pérfidos, sem afeição natural e sem misericórdia” (versos 30 e 31).

Você acha que seria um castigo viver numa sociedade como a que Paulo retrata? Essa é a consequência que alcança a “terceira e quarta geração”, o fatídico resultado que Deus deseja que evitemos, ao dar-nos essa advertência no segundo mandamento. Por isso, Ele é “zeloso”. O ciúme humano é uma exibição de interesse próprio, mas o mandamento deixa claro que Deus é ciumento em favor do Seu povo.
Em contraste, a misericórdia e a bondade de Deus se estenderão até “mil gerações” dos que O amam e guardam os Seus mandamentos (Êxodo 20:6). Isso, naturalmente, se refere à promessa da vida eterna. Jesus disse: “Pai, a Minha vontade é que onde Eu estou, estejam também comigo os que Me deste, para que vejam a Minha glória que Me conferiste, porque Me amaste antes da fundação do mundo” (João 17:24).


Mensagem de Liberdade

O segundo mandamento é o complemento perfeito do primeiro. As pessoas que tomarem a decisão de colocar a Deus no centro de sua existência não permitirão que qualquer coisa criada ocupe o lugar que pertence somente ao Criador. E não haverá confusão com respeito à verdadeira adoração, porque essas pessoas se afastarão de tudo que diminua a importância de Deus em sua vida.

Para aqueles que guardam o primeiro e o segundo mandamentos, a obediência aos demais será completamente natural. Se amamos a Deus – se Ele está no trono da nossa vida – nosso coração transbordará de amor pelas outras pessoas também. O apóstolo Tiago chamou os Dez Mandamentos de “lei perfeita, lei da liberdade” (Tiago 1:25). A esta altura, consideramos apenas dois preceitos da lei, mas o significado dessa perfeição e liberdade já está claro. Como diz o salmista, “grande paz têm os que amam a Tua lei; para eles não há tropeço” (Salmo 119:165).
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