Tarsee Li
Site para compra: Casa Publicadora Brasileira
“E o Senhor Deus lhe deu esta ordem: De toda árvore do jardim comerás livremente, mas da árvore do conhecimento do bem e do mal não comerás; porque, no dia em que dela comeres, certamente morrerás, […]” (Gn 2:16, 17).
Para explicar o fato de Adão e Eva não terem morrido no exato dia em que comeram do fruto proibido, alega-se, por vezes, que, como um dia para Deus é como mil anos (2Pe 3:8), e Adão viveu menos de mil anos (Gn 5:5), o primeiro homem morreu, portanto, dentro do “dia” longo de mil anos de duração. Outra explicação popular é que Adão e Eva começaram a morrer, imediatamente. Uma terceira explicação é a de que a pena de morte foi comutada porque Deus prometeu um salvador em Gênesis 3:15. No entanto, um entendimento correto das expressões da passagem em hebraico aponta para outra possibilidade.
No sexto dia da semana da criação, Deus colocou Adão no Éden e lhe disse que poderia comer livremente de toda árvore do jardim, exceto de uma: a árvore do conhecimento do bem e do mal. Antes que Adão e Eva “pudessem tornar-se eternamente livres de perigo” (MG, p. 38), a fidelidade deles devia ser provada. A advertência era clara e direta: “no dia em que dela comeres, certamente morrerás.”
O significado de “no dia em que” – Em hebraico, a expressão “no dia em que” ocorre cinco outras vezes em Gênesis (2:4; 3:5; 5:1, 2; 21:8). A comparação das diferentes traduções desses versículos revela que ela é traduzida alternadamente como “no dia em que”, “quando”, “nesse dia em que”, “logo que”, etc., dependendo do contexto. Uma razão para a discrepância de traduções é que a palavra hebraica para “no dia em que” (beyom + infinitivo) é muitas vezes imprecisa quanto ao ponto exato ou período de tempo referido. Pode significar um momento, um dia ou qualquer outra unidade não específica de tempo. O termo beyom é empregado de forma semelhante em Gênesis 30:33, em que a expressão beyom machar (literalmente, “no dia de amanhã”) significa “num tempo futuro”, referindo-se a um tempo futuro indeterminado, e não a um dia específico. Portanto, a menos que o contexto indique algo diferente, a expressão beyom + infinitivo significa simplesmente “quando”.1 Embora pareça literal, a tradução “no dia em que” leva quem lê em português a pensar que se refere a um “dia” específico. Ao contrário, o tradutor que, em vez da palavra “dia”, emprega “quando” ou “logo que” capta melhor a intenção da língua hebraica.
O sentido de “certamente morrereis” – Em hebraico, “certamente” é expresso pelo infinitivo absoluto de “morrer”. Isso reforça a “noção de certeza”. 2 A função que o advérbio desempenha em Gênesis 2:17 é destacar a certeza da morte, e não a hora da morte.
Um paralelo interessante entre Gênesis 2:17 e 1 Reis 2 talvez ajude a explicar isso. De acordo com 1 Reis 2:36-46, Salomão colocou Simei em prisão domiciliar e lhe fez uma advertência que contém paralelismos gramaticais com Gênesis 2:17: “porque há de ser que, no dia em que saíres [beyom + infinitivo] e passares o ribeiro de Cedrom, fica sabendo [infinitivo + verbo finito] que serás morto [infinitivo + verbo finito]; o teu sangue cairá, então, sobre a tua cabeça” (1Rs 2:37, ver v. 42).
Três anos depois, dois servos de Simei fugiram. Simei foi a Gate e os levou de volta para casa. Algum tempo depois do retorno de Simei, Salomão soube do incidente e mandou prender Simei e executá-lo. Embora não se relate quanto tempo levou para tudo isso acontecer, essa série de eventos consome normalmente alguns dias, o que significa que Simei não foi executado no dia que saiu de casa. Portanto, as palavras de Salomão de advertência no v. 37 (“no dia em que saíres […] serás mmorto”) não significam que Simei morreria exatamente no dia em que saísse. O que as palavras de Salomão enfatizam é a certeza da pena de morte, e não o tempo de sua execução. Ou seja, assim que descumpriu o acordo, Simei estava destinado a morrer, mesmo que não fosse executado no exato dia em que saiu.
As palavras de Deus são verdadeiras – As palavras de Deus em Gênesis 2:17 não sugerem que a morte de Adão ocorreria no exato dia em que ele comesse do fruto proibido, mas que, a partir do momento em que o comesse, sua morte estaria determinada. Uma tradução mais adequada do hebraico talvez seja: “Assim que comerdes, certamente estareis destinados à morte.” Por isso, a serpente não disse que Adão não morreria “naquele dia”, mas que certamente não morreria (Gn 3:4). Afinal, Gênesis 2:17 de fato se cumpriu. Adão e Eva foram expulsos do Éden e, de fato morreram. Embora as palavras da serpente fossem parcialmente verdadeiras (isto é, os olhos deles se abriram e conheceram o bem e o mal, Gn 3:5, 22), as palavras de Deus não foram parcialmente, mas totalmente cumpridas.
A morte de Adão e Eva dá testemunho da realidade de que “o salário do pecado é a morte” (Rm 6:23). Apesar disso, “como, em Adão, todos morrem, assim também todos serão vivificados em Cristo” (1Co 15:22).
Necessitamos da história autêntica da origem da Terra, da queda do querubim cobridor e da introdução do pecado em nosso mundo. Sem a Bíblia, seríamos confundidos pelas falsas teorias. (MS, p. 89)
_____________
1 Ver L. J. Copes “ywm”, em Theological Wordbook of the Old Testament, ed. R. Laird Harris, et al. 2 volumes (Chicago: Moody Press, 1980), v. 1, p. 370, 371.
2 Bruce K. Waltke and M. O’Connor, An Introduction to Biblical Hebrew Syntax (Winona Lake, IN: Eisenbrauns, 1990), p. 584; para ver também toda a discussão, p. 584-588.