William G. Johnsson
Fonte: Romanos, uma carta de amor de Jesus
Finalmente chegamos à seção final da carta de Paulo. Como tudo o que consideramos, tem muito interesse e inspiração. Mas primeiro vamos fazer uma pausa e dar uma olhada na carta em sua totalidade.
Romanos é dividido em três partes distintas: 1. Romanos capítulos 1-11, teológico. Paulo desenvolve sua compreensão do plano de Deus para salvar a humanidade. O plano centra-se na graça, o dom da justiça de Deus para os indignos. Os primeiros oito capítulos apresentam sistematicamente o argumento de Paulo, nos capítulos 9-11 ele aborda a relação dos judeus com este plano.
Para alguns expositores de Romanos, os capítulos 1-8 são primários e muito importantes; tudo o que vem depois é secundário e de muito menos peso. Outros expositores, no entanto, veem Romanos 9-11 como revelando o propósito de Paulo ao escrever a epístola: ele quer estabelecer que a salvação não é apenas para os gentios. Por meio de Jesus Cristo, Deus tornou a salvação disponível para todos, independentemente da etnia.
2. Romanos 12:1-15:13, conselhos práticos. Nesta seção, Paulo expõe as implicações do Evangelho para a vida cristã. Ele tomou conhecimento dos problemas entre os seguidores de Cristo na igreja em Roma, como disputas sobre dieta e observância de dias especiais, e deseja aconselhá-los sobre esses assuntos. Para alguns comentaristas recentes de Romanos, esta parte, em vez dos 11 capítulos teológicos anteriores, apresenta o propósito de Paulo ao escrever a carta.
3. Romanos 15:14-16:27, pessoal. Concluindo a carta, Paulo compartilha seus planos de viagem – ele pretende visitar Roma – e envia cumprimentos a uma longa lista de pessoas que ele conhece e com quem trabalhou. Para alguns intérpretes, essa parte do fechamento da carta, embora interessante, não merece um estudo cuidadoso. Eles basicamente terminam seu estudo de Romanos com o capítulo 15. 149
Na minha opinião, porém, esta seção de Romanos oferece insights valiosos sobre a personalidade, o caráter e a missão de Paulo, bem como a dinâmica do cristianismo primitivo. Ignorar Romanos 15:14-16:27 é perder informações importantes e inspiradoras.
O que podemos aprender em Romanos 15:14-16:27? Pelo menos o seguinte:
1- Paulo, o homem. O apóstolo Paulo era alguém que você gostaria de convidar para o almoço de sábado? Sabemos que ele tinha uma mente teológica brilhante, mas ele era frio e austero, esse solteirão que viajava e escrevia tanto?
As cartas de Paulo, e especialmente a última parte de Romanos, mostram que ele era uma pessoa calorosa e interessada em outras pessoas. Paulo, de fato, compartilha mais de si mesmo do que qualquer outro escritor do Novo Testamento. Ele era um estudioso talentoso, sim, mas não permitia que sua erudição se intrometesse nas relações pessoais, como costuma acontecer.
Em Romanos 15 ele compartilha seus planos de viagem com os crentes em Roma. Ele está ansioso para conhecê-lo; Ele nunca visitou Roma. Ele lhes diz que tem certeza de que estão “cheios de bondade. Vocês conhecem essas coisas tão bem que podem ensinar uns aos outros sobre elas” (Romanos 15:14).
Como esse elogio faria seus leitores se sentirem? Ele lhes diz que teria vindo visitá-los muito mais cedo, mas muitas vezes foi impedido. Mas seu plano é finalmente ir até eles, realizando um desejo que ele tem há muitos anos.
Paulo escreve de Corinto, mas não iria diretamente a eles. Primeiro, ele iria para Jerusalém. Ele é acompanhado por irmãos das províncias da Macedônia e Acaia; eles carregam consigo uma oferta monetária que Paulo coletou para beneficiar os santos pobres de lá.
O grande apóstolo contempla a próxima viagem com sentimentos contraditórios. Embora espere fazer novos amigos, ele sabe que a viagem pode ser perigosa. Já no curso de seu ministério ele suportou muitas dificuldades nas mãos de seus inimigos: ele foi espancado, apedrejado, preso, perseguido (veja 2 Coríntios 11:23-27). Além dos perigos que podem estar à frente, Paulo não tem certeza sobre sua recepção nas mãos dos líderes da igreja em Jerusalém. No passado, muitos o viam com desconfiança, como uma pessoa perigosa que desencaminha os outros.
Assim, como Paulo escreve aos crentes em Roma, ele pede que orem fervorosamente por ele enquanto ele parte para a longa jornada (Romanos 15:30-31).
Paulo então envia saudações à igreja (Romanos 16). Ele não apenas faz uma saudação geral a todos, ele nomeia indivíduos, 26 deles. Esse fato me parece intrigante. Como Paulo conhecia tantas pessoas em uma cidade que ele nunca havia visitado? Provavelmente porque Roma era o centro do império, com todas as estradas que levavam a ela. As pessoas viajavam de um lugar para outro e as comunicações eram muito melhores do que costumamos pensar.
O ponto a ter em mente, no entanto, é o seguinte: Paulo estava interessado em pessoas, ele se esforçou para lembrar seus nomes. Não apenas seus nomes: em Romanos 16 ele acrescenta algumas palavras a cada saudação que mostram que ele se lembra de detalhes sobre eles, como “saudações a Priscila e Áquila… ; Saudações ao meu querido amigo Epeneto. Ele foi a primeira pessoa da província da Ásia a se tornar um cristão” (Romanos 16:5); “Saudações a Maria, que trabalhou tanto para o seu bem” (Romanos 16:6), e assim por diante.
É óbvio — Paulo amava as pessoas, especialmente os crentes. Ele tinha uma personalidade calorosa e extrovertida.
2. Paulo, o destemido. Paulo foi um pioneiro. Ele deliberadamente escolheu evangelizar onde ninguém tinha ido antes com o Evangelho. “Minha ambição sempre foi pregar as boas novas onde o nome de Cristo nunca foi ouvido, e não onde alguém já começou uma igreja” (Romanos 15:20).
Isso exigia coragem. Quando Paulo viajava de cidade em cidade, ele nunca sabia o que esperar. Ele pode ser saudado como um deus descendo em forma humana ou pode ter que fugir para salvar sua vida. Quando entrava em uma cidade, não podia ter certeza de que sairia vivo dela. Multidões, motins, calúnias, falsas acusações, tribunais, cadeias — Paulo aguentou tudo.
Em 1728 em Yorkshire, Inglaterra, um menino nasceu em uma cabana chamada biggin. Como seus irmãos e outros de sua geração, esse menino, chamado James Cook, podia esperar viver sua vida dentro do estreito triângulo de lar, campos e igreja. Mas James Cook foi além de todas as expectativas. Com a ajuda de um benfeitor, ele se formou e foi para o mar.
Cook acabou se tornando capitão de seu próprio navio e começou a explorar o mundo. Suas viagens foram extraordinárias: das latitudes mais profundas do sul, onde o gelo e a neve engolfavam o cordame, às amenas ilhas havaianas, ao extremo norte do continente norte-americano, Cook expandiu cada vez mais os limites do conhecimento. Saiu do mapa. Tudo em pequenos veleiros de madeira.
Sua sede de explorar novos oceanos e novas terras não conhecia limites; ele escreveu no diário de bordo de seu navio: “A ambição me leva não apenas a ir mais longe do que qualquer homem foi antes de mim, mas até onde eu acho que é possível para um homem ir.” O menino do chefão em Yorkshire morreu longe de casa, morto por lanças em uma visita de retorno às ilhas havaianas.
Muito antes de Cook, porém, o apóstolo Paulo, ele de espírito implacável, havia trilhado um caminho cada vez mais ousado. Sua ambição, ele escreveu, “sempre foi pregar as boas novas onde o nome de Cristo nunca foi ouvido, e não onde alguém já começou uma igreja” (Romanos 15:20).
Que homem! Audaz, engenhoso, intrépido, foi o missionário Paulo.
Ele nunca perdeu de vista seu chamado do Senhor, apresentado primeiro em Damasco e repetido em Jerusalém. Ele tinha uma comissão divina: levar o Evangelho aos gentios. Paulo nunca vacilou, nunca voltou atrás.
Que homem!
Sua contribuição ao cristianismo não pode ser exagerada. Roland Murray disse bem:
“Em pouco mais de dez anos, São Paulo estabeleceu a Igreja em quatro províncias do império: Galácia, Macedônia, Acaia e Ásia. Antes do ano 47 não havia igrejas naquelas províncias; em 57 d.C. Paulo poderia dizer que seu trabalho ali já havia sido feito e ele poderia planejar extensas visitas ao Far West sem ansiedade para que as igrejas que ele havia fundado não perecessem em sua ausência por falta de sua orientação e apoio.”
3. Paulo, o pregador da graça gratuita. Nos escritos de Paulo, sua palavra favorita é charis (χάρις), graça. Ele se refere a ela mais do que qualquer outro escritor do Novo Testamento. Muitas de suas cartas começam com “graça [charis] e paz da parte de Deus Pai e do Senhor Jesus Cristo”, assim como em Romanos (Romanos 1:7).
4. Paulo e o dinheiro. Nos Estados Unidos hoje alguns pregadores são enriquecidos pelo Evangelho. Eles pregam uma mensagem popular que atrai muitas pessoas, eles têm seu próprio programa de TV, eles pedem dinheiro, e eles chegam aos poucos. Eles vivem em uma mansão e viajam pelo país em seu avião particular.
Outros pregadores, contando com o que a congregação lhes dá para viver, vivem de boca em boca, sempre tomando cuidado para não ofender potenciais doadores.
Por outro lado, alguns ministros cujo salário não depende do que sua congregação dá, como os adventistas, pregam como se referências a dinheiro não tivessem lugar no púlpito.
Paulo oferece instruções para todos os itens acima. Ele mesmo não dependia da renda de sua pregação para prover sua vida e ministério.
Ele deixou claro que “aqueles que pregam as boas novas devem ser apoiados por aqueles que se beneficiam delas” (1 Coríntios 9:14). No entanto, Paulo se recusou a usar esse direito: ele se sustentou, trabalhando como fabricante de tendas.
Mas Paulo não hesitou em dedicar-se a arrecadar fundos para os santos pobres de Jerusalém. Ele passou pelo menos dois anos incentivando os crentes nas províncias de Acaia e Macedônia a contribuir para esse projeto. Quando toda a oferta foi coletada, Paulo se esforçou para garantir que os fundos fossem administrados com integridade de uma maneira que Deus e os crentes aprovassem (1 Coríntios 16:1-4). Ele fez com que as próprias igrejas designassem quem deveria acompanhar o apóstolo enquanto os fundos eram levados a Jerusalém.
O conselho e a prática de Paulo sobre este assunto são urgentemente necessários para a igreja hoje.
5. A Igreja Cristã primitiva. Na época de Paulo e por mais de 200 anos depois, o cristianismo não tinha status legal no Império Romano. Por essa razão, os seguidores de Jesus podiam ser presos, julgados e executados simplesmente por praticar sua religião. Isso também significava que eles não tinham permissão para ter casas de culto.
Onde então os cristãos se reuniam para adoração? Nas casas. Em Romanos 16 encontramos Paulo enviando saudações não apenas para seus amigos e colegas Prisca (Priscila) e Áquila, mas também para a igreja em sua casa (Romanos 16:5).
Pode ter havido várias igrejas domésticas em Roma. Uma casa, mesmo de alguém rico, poderia acomodar no máximo 60-70 pessoas e o número de crentes provavelmente era muito maior do que isso.
Em Romanos 16:10 Paulo escreve: “Saudações aos crentes da casa de Aristóbulo”. No versículo seguinte, ele envia uma saudação semelhante aos que pertencem à família de Narciso. Observe que Paulo não envia saudações a Aristóbulo e Narciso. Eles provavelmente não eram seguidores de Cristo; no entanto, eles tinham escravos ou servos que eram, e esses cristãos podem ter adorado em igrejas domésticas separadas.
Em Romanos 16:14, Paulo envia saudações a várias pessoas pelo nome e acrescenta: “e os irmãos e irmãs que se reúnem com eles”. No versículo seguinte ele lista várias outras pessoas pelo nome e acrescenta “e todos os crentes que estão com eles”. Isso sugere duas casas da igreja.
Romanos 16, portanto, mostra evidências de várias igrejas domésticas na cidade.
A lista de nomes em si é de grande interesse. Alguns nomes eram claramente os dos escravos, como Tércio, o escriba que escreveu a carta que Paulo lhe ditou. O nome significa “terceiro”: os escravos receberam nomes como Primeiro, Segundo, Terceiro e Quarto. Quartus (Romanos 16:23) significa “quarto”, indicando que ele também era um escravo.
Em contraste, encontramos mencionado “Erasto, o tesoureiro da cidade” (Romanos 16:23), isto é, de Corinto, de onde Paulo escreve. O nome veio à tona nas escavações arqueológicas da cidade de Corinto. Uma inscrição de meados do século I menciona um Erasto que era diretor de rua e que construiu uma rua às suas próprias custas. É quase certamente o mesmo Erasto que se junta a Paulo para enviar saudações aos crentes em Roma.
Uma observação final nesta lista: as mulheres surgem em papéis importantes na Igreja primitiva. Paulo menciona Prisca (Priscila) antes de seu marido, Áquila; Ela era a líder da igreja em sua casa? Ele elogia Febe, que presumivelmente carrega a preciosa carta e a chama de “diácona” (Romanos 16:1). E o mais incrível de tudo, ele saúda Júnia e a inclui entre aqueles que são “muito respeitados entre os apóstolos” (Romanos 16:7).
Que instantâneo esclarecedor da Igreja Cristã primitiva! A importância de Paulo.
O que diremos dessa figura imponente que mudou o curso da história humana? Aquele erudito, escritor, apóstolo, missionário, aquela pessoa amada e odiada, magnífica e martirizada? Qual é a importância de Paulo, o próprio Paulo, Paulo além de suas realizações e suas epístolas?
Ele nos dá a resposta: “Para mim, viver significa viver para Cristo, e morrer é ainda melhor” (Filipenses 1:21). “Meu velho eu foi crucificado com Cristo. Já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim. Assim vivo neste corpo terreno confiando no Filho de Deus, que me amou e se entregou por mim” (Gálatas 2:20).
Paulo e Jesus são inseparáveis; Paulo não pode ser descoberto sem Jesus.
Paulo conheceu Jesus de Nazaré. Jesus apareceu para ele como uma luz ofuscante no caminho de Damasco e mudou sua vida para sempre. Daquele dia em diante Paulo nunca duvidou, nunca poderia duvidar que Jesus estava vivo.
Não é Paulo a maior evidência de que Jesus ressuscitou dos mortos?
Não é essa a relevância máxima de sua vida e obra?
Os críticos da ressurreição apontam as diferenças nos relatos dos evangelhos. Eles apresentam várias explicações para o túmulo vazio – Jesus não estava realmente morto e havia voltado à vida na caverna, os discípulos queriam tanto que Jesus voltasse à vida que imaginavam que isso havia acontecido, e assim por diante.
Um fato confunde suas objeções: Paulo.
Certa vez, um imperador romano zombou de Paulo dizendo que chegaria o dia em que as pessoas chamariam seus cães de Paulo. Mas chegou o dia em que deram a seus cães o nome de Nero e seus filhos de Paulo.
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