Interludio: O Anjo de Luz, o Livro e as Duas Testemunhas Assim como no sexto selo, o sexto shofar tem um período de transição antes do sétimo shofar. E do mesmo modo que os selos, o interlúdio é uma pausa para uma olhada no acampamento de Deus.
O Anjo de Luz
Em contraste com a estrela cadente, o anjo da morte e do caos (Apocalipse 9:1, 2), agora contemplamos um poderoso anjo de luz, um anjo de Deus (Apocalipse 10:1). O arco íris sobre sua cabeça é o sinal da aliança de Deus com a humanidade (Gênesis 1:12, 13). Seus pés, colocados tanto na terra como no mar, evocam a criação por Deus da água da terra. (verso 9ff.).
O ser parece com o Filho do homem em sua primeira visão no Apocalipse. Como Ele, Sua face é “como o sol” (Apocalipse 10.1; cf. 1:16), seus pés como colunas de fogo (Apocalipse 10:3; cf. 1:15). E como Ele, nuvens escoltam-nO (Apocalipse 10:1; cf. 1:7).
Mas tomada como um todo, a nossa passagem é ainda mais semelhante à última visão do profeta Daniel. Em Daniel 12 ele reconta esta mesma visão de um ser estando sobre ambos a terra e mar, que levanta suas mãos para o céu jurando “por aquele que vive eternamente” (Daniel 12:7). O juramento constitui a resposta à pergunta no verso precedente “Quanto tempo?” (verso 6). Mas a resposta aparentemente não satisfaz Daniel – ele não entende (verso 8). O homem vestido em linho então responde-lhe que estas palavras estão “seladas até o tempo do fim” (verso 9), acrescentando: “Bem-aventurado é o que espera e chega aos mil trezentos e trinta e cinco dias” (verso 12). Somente naqueles dias a resposta completa à questão “quanto tempo?” deve ser revelada.
Somente esse período leva para o “tempo do fim”. Mas uma visão anterior já tem mencionado este “tempo do fim”. Daniel 8 lembra outra visão do diálogo entre os dois seres celestiais. Ela também levanta a pergunta “Quanto tempo?” (Daniel 8:13). De novo a resposta leva ao tempo do fim: “Até duas mil e trezentas tardes e manhãs; então o santuário será purificado” (verso 14). No final do livro de Daniel a mesma questão flutua em relação aos 1.335 dias, um tempo de intensa expectativa (Daniel 12:12). Dessa forma devemos entender estes dois períodos proféticos como conduzindo ao mesmo evento, um Kippur celestial20. É interessante que o ser celestial que anuncia este Kippur do tempo-final está vestido em linho, igual ao sumo sacerdote em serviço no Kippur.
Este tempo de juízo é a resposta à pergunta dos mártires: “Até quando?” Ele é também uma resposta à questão do clamor das almas no quinto selo (Apocalipse 6:10). O sexto selo, de fato, introduz este “tempo do fim”, como antecipado pelo profeta Daniel (Daniel 8:17, 19 e 26) Agora entendemos o significado por trás do traje do poderoso anjo (Apo. 10:1). Um anjo falou ao profeta Daniel que sua visão seria “selada até o tempo do fim” (Daniel 12:9). O anjo agora declara que o “tempo do fim” chegou, e que “não haveria mais demora” (Apocalipse 10:6). O tempo do sexto shofar marca a abertura do selo da profecia de Daniel. Agora ele pode ser entendido.
O Livro
Avidamente João toma o “livro que está aberto na mão do anjo”, e come-o (Apoalipse 10:8, 9). A palavra é assim assimilada e digerida. “O livro que está aberto” representa o livro de Daniel previamente selado, mas agora acessível a todos. A experiência de João é igual à do profeta Ezequiel, que foi também confrontado com um anjo de luz que lhe ordenou comer um livro (Ezequiel 3:1) O próximo verso explica a estranha ordem: o profeta depois de assimilar o conteúdo do livro agora comunica sua mensagem aos seus contemporâneos. (verso 4-6).
Mas notamos ainda outra similaridade entre as duas experiências. Como João, Ezequiel achou o conteúdo do livro “doce como mel” (verso 3; cf. Apocalipse 10:9, 10). Mas em ambas as experiências depois têm um gosto amargo. O livro contém “lamentações, e suspiros e ais” (Ezequiel 2:10), parte de sua mensagem dual de juízo e restauração. “O fim! O fim vem!” declara o profeta (Ezequiel 7:2, 3, 6) Ezequiel, profeta no exílio, anuncia o juízo iminente de Deus. A destruição de Jerusalém está perto. O Senhor escolheu o profeta para ficar de guarda sobre Israel (Ezequiel 33:2) e admoestar seu povo da maldição da nação. A mensagem de Ezequiel não está limitada às palavras e parábolas, mas ele vive-a na carne: Sua mulher, a “delícia dos [seus] olhos” será atingida pela morte (Ezequiel 24:15-27).
Então o profeta vai ser condenado a silenciar o luto por três anos, do cerco de Jerusalém até sua queda. (Ezequiel 33:22).
Mas no coração do chamado e da ameaça de destruição está a promessa de esperança. Ezequiel é também o profeta da restauração, por que os cativos estão para serem libertados, e as tribos reunidas (Ezequiel 37:21), Jerusalém reconstruída (Ezequiel 40-48), e a terra prosperando (Ezequiel 47:12) Homens e mulheres vão receber um novo coração (Ezequiel 36:24-28). O profeta prediz o evento como uma ressurreição. A Palavra de Deus traz ossos de volta à vida (Ezequiel 37). O mundo mais uma vez testemunha o milagre da criação. Como em Genesis 2:7, o Espírito transforma o pó em vida (Ezequiel 37:9).
É esta mensagem agridoce de juízo e de criação que o livro de Apocalipse alude aqui através de sua referência ao livro de Ezequiel – a mensagem do Kippur.
As visões de Daniel e do Apocalipse convergem para a revelação do “tempo do fim”. Daniel compara-a ao Kippur, ao tempo de tremenda esperança de juízo e recriação. O Apocalipse retrata este período através da visão do “livro aberto” com o gosto agridoce, evocativo da mensagem dual de juízo e recriação que caracteriza a natureza do Kippur.
Os livros de Daniel e do Apocalipse se complementam um ao outro. O fato que o anjo pede para João comer o livro de Daniel também enfatiza a interdependência deles. Uma vez que João tem assimilado a mensagem do “livro aberto”, o anjo fala-lhe para profetizar para “muitos povos, nações, línguas e reis” (Apocalipse 10:11.) Vamos ouvir uma frase similar depois no capítulo 14. O mensageiro celestial deve profetizar a “toda nação, tribo, língua e povo” (Apocalipse 14:6) Aqui novamente, a mensagem é dualista – uma mensagem de juízo, mas também de re-criação21. O Apocalipse apresenta o povo de Deus no tempo do fim como profetas comissionados para dar a mensagem de Daniel, “digerida” pelo próprio Apocalipse.
Referências:
20 Ibid., PP. 186-188.
21 Ver seção em Apocalipse 14:7-11
Você pode ler mais textos – estudo de Apocalipse 10 aqui
Você pode ver o estudo completo do Livro Apocalipse aqui