Ano Bíblico 2021 – 173° Dia – Apocalipse 7- Interlúdio: Os Sobreviventes de Jacó – Comentário Dr. Jacques B. Doukhan

Apocalipse 7
Os 144 Mil selados: a visão dos glorificados

Os capítulos 1 ao 11 de Apocalipse tratam do que aconteceu entre a primeira vinda de Cristo e a volta de Jesus. Ou seja, na Era Cristã. 

Se quiser fazer um estudo mais profundo dê uma olhada antes neste texto: A Jihad Cristã. Visualize o Quinto e o Sexto Selos de Apocalipse 6.

A destruição repentinamente vacila, e o zoom do olho profético está sobre aqueles que “mantiveram-se” (cf. Apocalipse 6:17).

Estes sobreviventes trazem um sinal, ou uma marca, que vai protege-los da ira divina. Isso nos lembra dos eventos no Egito quando os filhos de Israel foram separados pelo sinal do sangue colocado nos batentes das portas (Êxodo 12:23). Mas neste tempo os quatro ventos da terra, que carregam a ira de Deus, ameaçam os “quatro cantos da terra,” isto é, a terra inteira48. A estrutura chiastica (ABA‟) do anúncio aos anjos identifica os sobreviventes. A primeira ação (A) poupa a terra, mar e árvores (Apocalipse 7:1). A segunda ação (B) ameaça a terra e o mar (verso 2). E a terceira ação (A‟) ameaça novamente a terra, mar e árvores (verso 3).

A (7:1)                                 B (7:2)                      A’(7:3)

Poupa                                ameaça                       poupa:

terra, mar, árvores          terra e mar         terra, mar, árvores

O centro do chiasmo revela os elementos da natureza ameaçados pelos ventos. O comando explicitamente limita a destruição para a terra e mar, representando a totalidade da terra46.

As árvores são os únicos sobreviventes do desastre. O texto já aponta, em nível de sintaxe, de seu excepcional caráter. Na primeira ação que introduz os outros dois, a palavra grega para “árvore” recebe uma declinação diferente das outras duas palavras “terra” e “mar,” embora cada uma seja precedida pela mesma preposição grega. “Árvore” está no acusativo enquanto as palavras “terra” e “mar” estão no genitivo. Esta diferença sugere que os ventos contam de modo diferente para a terra e o mar do que para as árvores.

Estas indicações estilísticas e sintáticas ajudam distinguir as árvores dos outros elementos, colocando-os à parte. As árvores representam persistência. Suas raízes, aprofundando na terra, protegem-nas dos ventos. Na Bíblia árvores simbolizam a justiça (Salmo 1:3; Jeremias 17:8), enquanto que palha, facilmente levada pelo vento, representa o mal (Salmo 1:4; Jó 21:18).

Devemos entender a salvaguarda das árvores pelo anjo como a proteção divina dos justos. Mas curiosamente, as árvores/justos não devem sua salvação à força de suas raízes. Sua sobrevivência é um presente do alto. Um anjo do leste – a direção simbólica do sol que traz vida e luz; o Jardim do Éden (Gênesis 2:8); o libertador humano, rei Ciro (Isaías 41:2); e o mesmo Deus Salvador (Ezequiel 43:2) – marca suas testas com um selo.

Em contraste com os outros selos no Apocalipse que trazem morte, este é o selo da vida (Apocalipse 7:2). O outro selo anunciou julgamento e destruição. Este significa salvação e criação. Os outros selos garantiram a confiabilidade do documento, mas este indica propriedade.

Os antigos muitas vezes marcavam sua mercadoria com um selo para designar a quem ela pertencia. Geralmente o selo usado para marcar argila ou cera consistia de uma peça de metal ou uma pedra preciosa (Êxodo 28:11; Ester 8:8) que imprimia o nome gravado ou símbolo do proprietário. Em nossa passagem, o selo marca a testa. Isso nos lembra de Caim que também recebeu uma marca na testa para sua própria proteção (Gênesis 4:15). Mas a passagem em Ezequiel vem próxima à nossa: “Disse-lhe o Senhor, passa pelo meio da cidade, pelo meio de Jerusalém, e marca com um sinal a testa dos homens que suspiram e que gemem por causa de todas as abominações que se cometem no meio dela ‟. E aos outros disse ele, ouvindo eu: […] matai os velhos, mancebos e virgens, criancinhas e mulheres… mas não vos chegueis a qualquer sobre quem estiver o sinal‟ (Ezequiel 9:4-6).

Aqueles que recebem a marca em suas testas são os fiéis que reagem com as “coisas detestáveis” (verso 4) feitas por seus contemporâneos. Os versos precedentes usam as mesmas palavras, “coisas detestáveis,” para falar da idolatria ao sol (Ezequiel 8:16). A marca na testa então representa a adoração do verdadeiro Deus, o Deus vivo, o Criador. O significado parece ser o mesmo aqui em Apocalipse 7. A sequência terra, mar e árvores (cf. Gênesis 1:9-13) intensifica a alusão à Criação. O selo marca aqueles que creem no Criador. Confessar Deus como dono de nossa vida é reconhecê-Lo como nosso Criador. Os salmos glorificam a Deus como dono de todas as coisas porque Ele é o Criador: “Do Senhor é a terra e a sua plenitude, o mundo e aqueles que nele habitam porque ele a fundou sobre os mares, e a firmou sobre os rios.” (Salmo 24:1, 2).50

Para reconhecer Deus como dono de tudo importa conhecê-Lo como Criador. Seu selo alude a todo um modo de pensamento.

Ser selado é mostrar que nós devemos tudo a Deus, o tema que permeia a Bíblia inteira. O dízimo representa nossa devolução a Deus do que já é dEle, um ponto já entendido por Melquizedeque, que justificou Abrão dando o dízimo com a proclamação de Deus como “Criador do Céu e da terra” (Gênesis 14:19). O livro de Levíticos faz a mesma associação. Antes de entrarem na Terra Prometida Deus falou ao povo de Israel que deveriam lembrar que a terra Lhe pertencia: “a terra é minha; pois vós estais comigo como estrangeiros e peregrinos” (Levítico 25:23). Por isso “os dízimos… pertencem ao Senhor; santos são ao Senhor” (Levíticos 27:30).

Não é coincidência que o Shabat ocupe o lugar central no Decálogo, normalmente reservado para o selo nos documentos da antiga aliança51. O Shabat celebra o Criador e Seu trabalho – ele é o selo de Deus na Criação. Nós distinguimos de novo o selo de Deus na escolha dietética de Daniel e seus companheiros, pois eles procuraram mostrar sua dependência do Criador em lugar de depender do rei (Daniel 1).52

O selo na testa representa a marca de Deus na pessoa inteira, o sinal de que nós pertencemos a Ele. A imagem de Deus, se refletida na criatura humana, constitui, de certo modo, Seu selo, pertencer a Deus é viver com Ele. Através desta imagem o Apocalipse designa aqueles que confessam o Deus da Criação em todas as facetas de suas vidas. O Shabat, o dízimo, escolhas dietéticas, e respeito pela lei de Deus – tudo pode indicar a presença do selo de Deus, mas eles não o produzem magicamente.

O selo de Deus é tanto visível como vivo, exatamente como ele representa o Deus Criador.

Da mesma forma para aqueles que portam o selo. Eles constituem uma entidade espiritual. Seu número, 144.000 composto de 12 x 12, é simbólico. O número 12 representa o número da aliança entre Deus e Seu povo (4, número da terra, x 3, número de Deus). Ele é também o número das 12 tribos de Israel, explicitamente mencionadas (Apocalipse 7:4-8). Cada tribo consiste de 12.000 pessoas. Portanto o número 1000, o qual multiplica 12, simboliza não apenas a multidão53, mas as tribos também. Em hebraico, a palavra elef (mil) é para a tribo, a coroa, o clã, ou até o regimento54. O número 12.000 descreve assim a tribo em sua totalidade. No tempo de João contudo, os registros, de quem pertencia à maioria das tribos, desapareceram com a destruição do Templo. Tudo o que qualquer um poderia ter certeza era aquela de que reclamavam ser parte de Judá, Benjamim e Levi. Assim devemos tomar o Israel mencionado aqui no sentido literal. A regularidade do ritmo da lista – igual àquela de um exército desfilando – reforça a impressão de integralidade e perfeição. A palavra ochlos representada no verso 9 por “multidão,” também significa “exército.”55 E assim, versos 9 e 10 descrevem um exército vitorioso.56 Estilo, linguagem e simbolismo numérico do texto tudo testemunha para a presença de todo o Israel. Os 144.000 pintam Israel marchando como um todo. Esse é “todo Israel” sonhado pelo apóstolo Paulo (Romanos 11:26), o número “completo” dos salvos, como aludido no quinto selo (Apocalipse 6:11). Também é a grande multidão, multicultural e multinacional, que João vê adornada pelas vestes brancas (Apocalipse 7:9; cf. 6:11), sobreviventes da opressão (Apocalipse 7:14; cf. 6:9, 11).

O grupo incompleto do quinto selo e dos 144.000 são o mesmo povo. Todos eles estão presentes. Refugiados da história, cujo único ponto de referência era os céus acima, condenados a perambular na terra, sempre estrangeiros, cidadãos do além, eles estão agora reunidos na descoberta de sua identidade perdida, de suas raízes, de seu povo – seu Israel. Partilhando memórias da opressão e sofrimento eles têm agora seu próprio lugar, juntos corpo e espírito. Emoção brota de corações partidos e explodem como um grande brado de glória, o brado de vitória (Apocalipse 7:10)

Para seus brados de vitória, os anjos, os anciãos e os quatro seres viventes respondem “Amém!” em uma adoração de sete desdobramentos: “Amém! Louvor, e glória, e sabedoria, e ação de graças, e honra, e poder, e força ao nosso Deus, pelos séculos dos séculos. Amém!” (verso 12).

A visão agora toma lugar no céu, no futuro distante, quando os céus devem se unir à terra em adoração; quando Deus deve verdadeiramente habitar no meio de seu povo. Os últimos devem servi-lo “dia e noite em seu santuário” (verso 15) como fizeram os primeiros sacerdotes e levitas (I Crônicas 9:33). A visão se desdobra com a imagem da tenda de Deus que se estende sobre eles (Apocalipse 7:15, evocativo do santuário do deserto. Em grego, skenoun (estender a tenda) soa como a palavra hebraica shekinah (do verbo shakan, para habitar), o qual designou a nuvem de fogo, um símbolo de Deus “habitando” no meio de Seu povo (Êxodo 40:34-38).

A presença de Deus é um fato. Ele está fisicamente com Seu povo. O texto conclui por uma alusão ao Salmo 23: “Por que o Cordeiro… os apascentará e os conduzirá às fontes das águas da vida; e Deus lhes enxugará dos olhos toda lágrima” (Apocalipse 7:17).57

Deus não se contenta em apenas prover as necessidades de suas criaturas, mas também anseia por um relacionamento íntimo com eles. Ele não vai só acabar com a fome, sede, calor e sofrimento de nossa existência, mas Deus nos confortará por Sua presença real.

Referências:

48 Ver Dan. 7:2.

49 Ver Apocalipse 10:2, 5; cf. Gênesis 1:1-9; Êxodo 20:11; Neemias 9:6; Salmo 95:5; Mateus 23:15, etc.

50 Ver também Salmo 89:12, 13; 100:3.

51 Ver Meredith G. Kline, Treaty of the Great King: The Covenant Structure of Deuteronomy, Studies and Commentary (Grand Rapids: 1963), pp. 18, 19; Meredith G. Kline, The Structure of Biblical Authority (Grand Rapids: 1972), p.120.

52 Ver Doukhan, Secrets of Daniel, pp. 18-20.

53 Juízes 15:15; I Crônicas 12:14; 16:15; Salmo 91:7, etc.

54 Êxodo 18:21; Deuteronômio 33:17; Juízes 6:15; Números 1:16; Josué 22:21. etc.

55 Ver Gerhard Kittel, ed., Theological Dictionary of the New Testament, trad. E ed. Geoffrey W, Bromiley (Grand Rapids: 1964-1976), vol. 5, p. 583.

56 Ver II Macabeus 11:8; I Macabeus 13:51; cf. João 12:13.

57 Ver Jacques B. Doukhan, Aux portes de l’esperance (Dammarie-les-lys, France: 1986), pp. 243ff.

Livro: Entenda as Grandes profecias de Daniel e Apocalipse

Estudar o Capítulo 18, Páginas 119 – 122

. Ele Sela Seus Servos

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