Nas regiões distantes: Anjos abrem a prisão em Filipos – Capítulo 21


por Ellen White
Atos dos Apóstolos ou O Embaixadores
Este capítulo é baseado em Atos 16:7 – 40; Efésios 6: 12; Filipenses1: 29 – 30; 3 – 5; 1 Timóteo 5: 3

Chegara o tempo em que o evangelho devia ser pregado além dos confins da Ásia Menor. O caminho estava preparado para Paulo e seus companheiros passarem à Europa. Em Trôade, às margens do Mediterrâneo, “Paulo teve de noite uma visão, em que se apresentou um varão da Macedônia, e lhe rogou, dizendo: Passa à Macedônia, e ajuda-nos”. Atos 16:9. 
O chamado era imperativo, não admitindo demora. “Logo depois desta visão”, declara Lucas, que acompanhava Paulo, Silas e Timóteo em sua viagem pela Europa, “procuramos partir para a Macedônia, concluindo que o Senhor nos chamava para lhes anunciarmos o evangelho. E, navegando de Trôade, fomos correndo em caminho direito para a Samotrácia, e no dia seguinte para Nápoles. E dali para Filipos, que é a primeira cidade desta parte da Macedônia, e é uma colônia”. Atos 16:10-12. 
“E no dia de sábado”, continua Lucas, “saímos fora das portas, para a beira do rio, onde julgávamos ter lugar para oração; e, assentando-nos, falamos às mulheres que ali se ajuntaram. E uma certa mulher, chamada Lídia, vendedora de púrpura, da cidade de Tiatira, e que servia a Deus, nos ouvia, e o Senhor lhe abriu o coração” Lídia recebeu a verdade alegremente. Ela e os de sua casa foram convertidos e batizados, e ela insistiu com os apóstolos para que se hospedassem em sua casa. 
Enquanto os mensageiros da cruz se entregavam a sua obra de ensinar, uma mulher possessa de espírito de adivinhação seguia-os, clamando: “Estes homens, que nos anunciam o caminho da salvação, são servos do Deus altíssimo. E isto fez ela por muitos dias”. Atos 16:13-18. 
Essa mulher era um instrumento especial de Satanás e, por meio de adivinhação, dava muito lucro a seus senhores. Sua influência auxiliara o fortalecimento da idolatria. Satanás sabia que seu domínio estava sendo invadido, e recorreu a esse meio de opor-se à causa de Deus, esperando misturar seus sofismas com as verdades ensinadas pelos que proclamavam a mensagem do evangelho. As palavras de recomendação proferidas por essa mulher representavam um dano à causa da verdade, distraíam o espírito do povo dos ensinos dos apóstolos e traziam má reputação para o evangelho, e, por meio delas, muitos foram levados a crer que esses homens que falavam no Espírito e poder de Deus, eram impelidos pelo mesmo espírito dessa emissária de Satanás.
Por algum tempo os apóstolos suportaram essa oposição; por inspiração do Espírito Santo, Paulo ordenou ao espírito mau que deixasse a mulher. Seu imediato silêncio provou serem os apóstolos servos de Deus e que o demônio tinha conhecimento disso e obedecera a sua ordem.
Libertada do espírito mau e restituída ao uso da razão, a mulher preferiu seguir a Cristo. Seus senhores ficaram alarmados por causa de seus lucros. Viram que estava perdida toda esperança de obter dinheiro por meio de suas adivinhações e predições, e que, se fosse permitido aos apóstolos continuar com a obra do evangelho, estaria logo esgotada inteiramente sua fonte de renda.
Muitos outros na cidade estavam interessados em alcançar lucro mediante satânicos enganos; e esses, temendo a influência de um poder que pudesse tão eficazmente deter sua obra, levantaram um forte clamor contra os servos de Deus. Levaram os apóstolos diante dos magistrados com a acusação: “Estes homens, sendo judeus, perturbaram a nossa cidade, e nos expõem costumes que nos não é lícito receber nem praticar, visto que somos romanos”. Atos 16:20, 21. 
Impelida por um frenesi, a multidão se levantou contra os discípulos. Prevaleceu o espírito de tumulto, sancionado pelas autoridades, que, rasgando a roupa dos apóstolos, ordenaram que fossem açoitados. “E, havendo-lhes dado muitos açoites, os lançaram na prisão, mandando ao carcereiro que os guardasse com segurança. O qual, tendo recebido tal ordem, os lançou no cárcere interior, e lhes segurou os pés no tronco”. Atos 16:23, 24.
Os apóstolos sofreram extrema tortura por causa da dolorosa posição em que foram postos, mas não murmuraram. Em vez disso, nas densas trevas e desolação do calabouço, encorajavam-se mutuamente com palavras de oração, e cantavam louvores a Deus por terem sido considerados dignos de sofrer por Sua causa. Seus corações foram animados por um amor fervoroso e profundo a seu Redentor. Paulo lembrava-se da perseguição movida contra os discípulos de Cristo, da qual ele havia sido instrumento, e rejubilava-se de que lhe tivessem sido abertos os olhos para ver, e seu coração para sentir o poder das gloriosas verdades que uma vez desprezara. 
Com espanto os outros prisioneiros ouviram os sons de oração e hinos que saíam do interior da prisão. Estavam habituados a ouvir gritos e gemidos, maldições e blasfêmias a quebrarem o silêncio da noite, mas nunca antes haviam eles ouvido palavras de oração e louvor ascenderem daquela sombria cela. Guardas e prisioneiros se maravilharam, e perguntavam quem poderiam ser esses homens que, com frio, fome e torturados, podiam ainda se regozijar. 
Enquanto isso, os magistrados voltaram a seus lares, lisonjeando-se de, com medidas prontas e decisivas, haverem acabado com o tumulto. Mas, no caminho, ouviram mais pormenores com respeito ao caráter e à obra desses homens que haviam sentenciado ao açoite e prisão. Viram a mulher que havia sido liberta da satânica influência, e ficaram impressionados com a mudança em sua aparência e comportamento. Antes ela havia causado perturbação na cidade; agora, estava calma e em paz. Sentindo que haviam provavelmente aplicado a dois homens inocentes as rigorosas penalidades da lei romana, ficaram indignados, e decidiram que, pela manhã, ordenariam que os apóstolos fossem secretamente libertados e escoltados para fora da cidade, longe do perigo de violência por parte da turba. 
Mas, conquanto houvessem os homens sido cruéis e vingativos, ou criminosamente negligentes nas responsabilidades solenes sobre eles postas, Deus não Se havia esquecido de ser misericordioso para com Seus servos. Todo o Céu estava interessado nos homens que estavam sofrendo por amor de Cristo, e anjos foram enviados a visitar a prisão. A terra tremeu aos seus passos. As portas da prisão pesadamente aferrolhadas abriram-se; cadeias e grilhões caíram das mãos e pés dos prisioneiros; e brilhante luz inundou a prisão. 
O guarda do cárcere tinha ouvido extasiado as orações e cânticos dos apóstolos prisioneiros. Quando foram encarcerados, havia ele visto suas feridas intumescidas e sangrentas, e por si próprio tinha-se decidido a colocar seus pés no cepo. Esperara ouvir-lhes amargos urros e imprecações; mas ouvia em lugar disto cânticos de louvor. Com esses sons nos ouvidos havia o carcereiro caído no sono de que foi despertado pelo terremoto e pelo sacudir das paredes da prisão. 
Erguendo-se alarmado, viu com espanto que todas as portas da prisão estavam abertas e dele se apossou o temor de que os prisioneiros tivessem escapado. Lembrou-se com que explícitas recomendações Paulo e Silas haviam sido confiados a seu cuidado na noite anterior, e estava certo de que a morte seria a pena de sua aparente infidelidade. Em amargura de espírito, sentia que lhe seria melhor morrer pelas próprias mãos que submeter-se a uma vergonhosa execução. Tirando a espada, estava prestes a matar-se, quando a voz de Paulo foi ouvida em palavras de animação: “Não te faças nenhum mal, que todos aqui estamos”. Atos16:28. Cada prisioneiro estava em seu lugar, retido pelo poder de Deus exercido por intermédio de um companheiro de prisão. 
A severidade com que o carcereiro tratara os apóstolos não havia despertado neles ressentimento. Paulo e Silas tinham o Espírito de Cristo, e não o de vingança. Em seu coração, repleto do amor do Salvador, não havia lugar para a maldade contra os perseguidores. 
O carcereiro, depondo a espada e pedindo luz, apressou-se a descer ao calabouço. Queria ver que espécie de homens eram esses, que retribuíam com bondade a crueldade com que haviam sido tratados. Alcançando o lugar onde estavam os apóstolos, prostrou-se diante deles e pediu perdão. Então, levando-os para um recinto aberto, interrogou: “Senhores, que é necessário que eu faça para me salvar?” Atos 16:30. 
O carcereiro havia estremecido ao contemplar a ira de Deus no terremoto; quando supôs que os prisioneiros tinham escapado, esteve prestes a matar-se pela própria mão; mas agora, todas essas coisas pareciam de pouca importância, comparadas com a nova e estranha perturbação que lhe agitava a mente, e por seu desejo de possuir a tranquilidade e alegria mostradas pelos apóstolos debaixo de sofrimento e maus-tratos. Via-lhes no semblante a luz do Céu; sabia que Deus Se havia interposto de maneira miraculosa para salvar-lhes a vida e com força peculiar, vieram-lhe à mente as palavras da mulher possessa: “Estes homens que nos anunciam o caminho da salvação são servos do Deus altíssimo”.
Com profunda humildade, pediu aos apóstolos que lhe mostrassem o caminho da vida. “Crê no Senhor Jesus Cristo e serás salvo, tu e a tua casa”, responderam eles; “e lhe pregavam a Palavra do Senhor, e a todos os que estavam em sua casa”. Atos 16:31, 32. O carcereiro, então, lavou as feridas dos apóstolos e serviu-os, sendo a seguir batizado por eles, juntamente com todos os que estavam em sua casa. Uma santificadora influência foi difundida entre os prisioneiros, e a mente de todos foi aberta às verdades expostas pelos apóstolos. Eles estavam convictos de que o Deus a quem esses homens serviam os havia milagrosamente libertado da servidão. 
Os cidadãos de Filipos haviam ficado grandemente atemorizados com o terremoto e quando, pela manhã, os funcionários da prisão contaram aos magistrados o que havia ocorrido durante a noite, eles ficaram alarmados, e enviaram oficiais para libertar os apóstolos. Paulo, porém, declarou: “Açoitaram-nos publicamente e, sem sermos condenados, sendo homens romanos, nos lançaram na prisão, e agora encobertamente nos lançam fora? Não será assim; mas venham eles mesmos e tirem-nos para fora”. Atos 16:37.
Os apóstolos eram cidadãos romanos, e era contra a lei açoitar um romano, ou privá-lo da liberdade, sem justo julgamento, salvo no caso do mais flagrante crime. Paulo e Silas haviam sido presos publicamente, e agora se recusavam a aceitar a liberdade secreta, sem as necessárias explicações da parte dos magistrados. 
Quando esse fato foi levado ao conhecimento das autoridades, estas ficaram alarmadas, temendo que os apóstolos apelassem para o imperador; indo imediatamente à prisão, se desculparam diante de Paulo e Silas pela injustiça e crueldade a eles feita, e pessoalmente conduziram-nos para fora da prisão, suplicando-lhes que partissem da cidade. Os magistrados temeram a influência dos apóstolos sobre o povo, e temeram também o Poder que se interpusera em benefício desses homens inocentes. 
Agindo segundo as instruções dadas por Cristo, os apóstolos não insistiram em permanecer onde sua presença não era desejada. “E, saindo da prisão, entraram em casa de Lídia, e, vendo os irmãos, os confortaram, e depois partiram”. Atos 16:40. 
Os apóstolos não consideraram infrutíferas suas atividades em Filipos. Haviam encontrado muita oposição e perseguição; mas a intervenção da Providência em seu favor, e a conversão do carcereiro e de sua casa, foram mais que suficientes para cobrir a desventura e o sofrimento que haviam suportado. As novas de sua injusta prisão e milagroso libertamento tornaram-se conhecidas em toda a região, e isso levou a obra dos apóstolos ao conhecimento de um grande número que de outra maneira não teriam sido alcançados. 
As atividades de Paulo em Filipos deram em resultado ser aí estabelecida uma igreja, cujo número de membros aumentava firmemente. Seu zelo e devoção, e acima de tudo, sua disposição de sofrer por Cristo exerciam profunda e perdurável influência sobre os conversos. Os irmãos apreciavam as preciosas verdades por que os apóstolos se haviam sacrificado tanto, e davam-se com devoção e inteiro coração à causa de seu Redentor. 
Que essa igreja não escapou à perseguição é mostrado por uma expressão da carta de Paulo a eles. Diz Paulo: “Porque a vós vos foi concedido, em relação a Cristo, não somente crer nEle, como também padecer por Ele. Tendo o mesmo combate que já em mim tendes visto” E era tal a firmeza deles na fé que ele declara: “Dou graças ao meu Deus todas as vezes que me lembro de vós, fazendo sempre com alegria oração por vós em todas as minhas súplicas, pela vossa cooperação no evangelho desde o primeiro dia até agora”. Filipenses 1:29, 30, 3-5. 
Terrível é a luta que se trava entre as forças do bem e do mal em centros importantes onde os mensageiros da verdade são chamados ao trabalho. “Porque não temos que lutar contra a carne e o sangue”, declara Paulo, “mas sim contra os principados, contra as potestades, contra os príncipes das trevas deste século”. Efésios 6:12. Até o fim do tempo haverá conflito entre a igreja de Deus e os que estão sob o controle dos anjos maus. 
Os cristãos primitivos foram chamados muitas vezes a enfrentar face a face os poderes das trevas. Mediante a perseguição e o engano, o inimigo se esforçava por fazê-los desviarem-se da verdadeira fé. Neste tempo, quando o fim de todas as coisas terrestres está-se aproximando rapidamente, Satanás faz desesperados esforços para enredar o mundo. Está arquitetando muitos planos para ocupar as mentes e distrair a atenção das verdades essenciais à salvação. Em cada cidade seus agentes estão ativamente organizando em partidos todos os que se opõem à lei de Deus. O arquienganador está em atividade para introduzir elementos de confusão e rebelião, e os homens estão sendo possuídos de ardente zelo que não está de acordo com o entendimento. 
A impiedade está alcançando um nível nunca antes atingido; contudo, muitos pastores estão clamando: “Paz e segurança”. 1 Timóteo 5:3. Mas os fiéis mensageiros de Deus devem prosseguir firmemente com sua obra. Revestidos com a armadura do Céu, devem avançar destemida e vitoriosamente, jamais cessando de lutar até que cada pessoa a seu alcance tenha recebido a mensagem da verdade para este tempo.
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