Por Ellen White
Este capítulo é baseado em Mateus 8: 11; 27: 22; João 1: 29; 6: 30; 12: 20 – 43, 48
Ora havia alguns gregos, entre os que tinham subido a adorar no dia da festa. Estes, pois, dirigiram-se a Filipe, que era de Betsaida da Galileia, e rogaram-lhe, dizendo: “Senhor, queríamos ver a Jesus. Filipe foi dizê-lo a André, e então André e Filipe o disseram a Jesus”. João 12:20, 21.
Por esse tempo a obra de Jesus apresentava o aspecto de pungente derrota. Ele saíra vitorioso da contenda com os sacerdotes e fariseus, mas era evidente que nunca seria recebido por eles como o Messias. Chegara a separação final. Para Seus discípulos, o caso parecia desesperado. Mas Cristo aproximava-Se da consumação de Sua obra. O grande acontecimento, de interesse, não somente para a nação judaica, mas para o mundo inteiro, estava prestes a se realizar. Ao ouvir Cristo o ansioso pedido:
“Queríamos ver a Jesus” ecoando o sequioso clamor do mundo, iluminou-se-Lhe o semblante, e disse: “É chegada a hora em que o Filho do homem há de ser glorificado”. João 12:23. Na súplica dos gregos viu Ele um penhor dos resultados de Seu grande sacrifício.
Esses homens foram do Ocidente para encontrar o Salvador ao fim de Sua vida, como os magos tinham vindo do Oriente, ao começo. Ao tempo do nascimento de Cristo, os judeus estavam tão embebidos com as próprias ambições e planos, que não sabiam de Seu primeiro advento. Os magos de uma terra pagã foram à manjedoura com suas dádivas, para adorar o Salvador. Assim esses gregos, representando as nações, tribos e povos do mundo, foram ter com Jesus. Assim o povo de todas as terras e de todos os séculos seria atraído pela cruz do Salvador. E assim “muitos virão do Oriente e do Ocidente, e assentar-se-ão à mesa com Abraão, Isaque e Jacó, no reino dos Céus”. Mateus 8:11.
Os gregos tinham ouvido falar da entrada triunfal de Cristo em Jerusalém. Alguns supuseram, e propalaram, que Ele expulsara do templo os sacerdotes e principais, e havia de tomar posse do trono de Davi, dominando como rei de Israel. Os gregos anelavam conhecer a verdade quanto a Sua missão. “Queríamos ver a Jesus”, disseram eles. Seu desejo foi satisfeito. Ao receber a petição, achava-Se Jesus naquela parte interna do templo da qual eram excluídos todos os que não fossem judeus, mas saiu ao pátio para receber os gregos, e teve com eles uma entrevista em pessoa.
Chegara a hora da glorificação de Cristo. Ele Se achava à sombra da cruz, e o pedido dos gregos mostrou-Lhe que o sacrifício que estava para fazer traria muitos filhos e filhas a Deus. Sabia que os gregos O haviam de ver em breve numa posição que mal sonhavam agora. Vê-Lo-iam colocado ao lado de Barrabás, ladrão e assassino, cuja liberdade seria preferida à do Filho de Deus. Ouviriam o povo, inspirado pelos sacerdotes e principais, fazer sua escolha. E à pergunta: “Que farei então de Jesus, chamado Cristo?” a resposta dada: “Seja crucificado”. Mateus 27:22. Jesus sabia que, fazendo essa propiciação pelos pecados dos homens, Seu reino seria aperfeiçoado, e se estenderia pelo mundo. Ele operaria como Restaurador, e Seu Espírito havia de prevalecer. Olhou, por um momento, futuro adiante, e ouviu as vozes que proclamavam em toda parte da Terra:
“Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo”. João 1:29. Viu nesses estrangeiros as primícias de uma grande colheita, quando a parede divisória entre judeus e gentios fosse derribada, e todas as nações, línguas e povos ouvissem a mensagem de salvação. A antecipação desse fato, a consumação de Suas esperanças, acham-se expressas nas palavras: “É chegada a hora em que o Filho do homem há de ser glorificado.” O caminho pelo qual essa glorificação se havia de operar, porém, não estava nunca ausente do espírito de Cristo. A reunião dos gentios devia seguir Sua morte próxima. Unicamente por Sua morte podia o mundo ser salvo. Como um grão de trigo, o Filho do homem devia ser deitado no solo e morrer, e ser enterrado fora das vistas; mas havia de viver outra vez.
Cristo apresentou Seu futuro, ilustrando-o com coisas da natureza, para que os discípulos compreendessem. O verdadeiro resultado de Sua missão havia de ser atingido por Sua morte. “Na verdade, na verdade vos digo que, se o grão de trigo, caindo na terra, não morrer, fica ele só; mas se morrer, dá muito fruto”. João 12:24. Quando o grão de trigo cai no solo e morre, germina, e dá fruto. Assim a morte de Cristo daria em resultado frutos para o reino de Deus. Em harmonia com a lei do reino vegetal, a vida havia de ser o resultado de Sua morte.
Os que lavram o solo têm sempre diante de si essa ilustração. De ano para ano conservam seu abastecimento de cereais, por assim dizer, atirando fora a melhor parte. Por algum tempo deve ela estar oculta na cova, sendo cuidada pelo Senhor. Então aparece a haste, depois a espiga, e depois o grão na mesma. Mas esse desenvolvimento não pode ter lugar a menos que o grão seja enterrado fora das vistas, oculto, e, segundo todas as aparências, perdido.
A semente enterrada no solo produz frutos e esse é por sua vez plantado. Assim se multiplica a colheita. Da mesma maneira a morte de Cristo na cruz do Calvário produzirá fruto para a vida eterna. A contemplação desse sacrifício será a glória dos que, como fruto do mesmo, viverão através dos séculos eternos.
O grão de trigo que conserva a própria vida não produz frutos. Permanece sozinho. Cristo poderia, se preferisse, salvar-Se da morte. Mas, fizesse-o, e permaneceria só. Não poderia levar filhos e filhas a Deus. Unicamente entregando a própria vida, podia Ele comunicar vida à humanidade. Só caindo no solo para morrer Se poderia tornar a semente daquela vasta colheita — a grande multidão redimida para Deus dentre toda nação, e tribo, e língua e povo.
A essa verdade liga Cristo a lição de sacrifício que todos devem aprender: “Quem ama a sua vida, perdê-la-á, e quem neste mundo aborrece a sua vida, guardá-la-á para a vida eterna”. João 12:25. Todos quantos desejam produzir frutos como coobreiros de Cristo, devem cair primeiro no solo e morrer. A vida deve ser lançada na cova da necessidade do mundo. O amor-próprio, o próprio interesse, devem perecer. E a lei do sacrifício é a lei da conservação da vida. O lavrador conserva seus cereais lançando-os fora, por assim dizer. O mesmo quanto à vida humana. Dar é viver. A vida que há de ser conservada, é a que se dá abundantemente em serviço para Deus e o homem. Aqueles que sacrificam a existência por amor de Cristo neste mundo, conservá-la-ão para a vida eterna.
A vida gasta para o próprio eu, é como o grão que se come. Desaparece, mas não há aumento. Junte o homem para si tudo quanto pode; viva, pense e faça planos para o próprio proveito; sua vida passará, no entanto, e ele nada terá. A lei do serviço do próprio eu, é a lei da destruição de si mesmo.
“Se alguém Me serve”, disse Jesus, “Siga-Me, e, onde Eu estiver, ali estará também o Meu servo. E, se alguém Me servir, Meu Pai o honrará”. João 12:26. Todos quantos carregaram com Cristo a cruz do sacrifício, partilharão com Ele de Sua glória. A alegria de Cristo, em Sua humilhação e dor, era que Seus discípulos fossem glorificados com Ele. Eles são o fruto de Seu sacrifício. A formação, neles, de Seu próprio caráter e espírito, eis Sua recompensa, e será por toda a eternidade a Sua alegria. Esta alegria eles, os discípulos, partilharão com Ele, ao ser visto em outros corações e outras vidas o fruto de seus labores e sacrifícios. São coobreiros de Cristo, e o Pai os honrará como honra Seu Filho.
A mensagem dos gregos, prenunciando, como fazia, a reunião dos gentios, trouxe à mente de Jesus Sua inteira missão. A obra da redenção passou por diante dEle, desde o tempo em que, no Céu, foi elaborado o plano, até à morte, tão próxima agora. Uma misteriosa nuvem pareceu envolver o Filho de Deus. Sua sombra foi sentida pelos que O rodeavam. Ele quedou absorto em Seus pensamentos. Rompeu por fim o silêncio com as dolorosas palavras: “Agora a Minha alma está perturbada; e que direi Eu? Pai, salva-Me desta hora”. João 12:27. Antecipadamente bebia Cristo o cálice da amargura. Sua humanidade recuava da hora do abandono, quando, segundo todas as aparências, seria desamparado pelo próprio Deus, quando todos O veriam castigado, ferido de Deus, e aflito. Recuava de ser exposto publicamente, de ser tratado como o pior dos criminosos, e da desonra e ignominiosa morte. Um pressentimento de Seu conflito com os poderes das trevas, um sentimento do horrível fardo da transgressão humana, e da ira do Pai por causa do pecado, fez com que o espírito de Jesus desfalecesse, estampando-se-Lhe no rosto a palidez da morte.
Veio então a divina submissão à vontade do Pai. “Mas para isto vim a esta hora”, disse. “Pai, glorifica o Teu nome”. João 12:27, 28. Unicamente mediante a morte de Cristo poderia ser vencido o reino de Satanás. Unicamente assim poderia ser o homem redimido, e Deus glorificado. Jesus consentiu na agonia, aceitou o sacrifício. A Majestade do Céu consentiu em sofrer como O que levou sobre Si o pecado. “Pai, glorifica o Teu nome”, disse Ele. Ao proferir Cristo estas palavras veio, da nuvem que Lhe pairava sobre a cabeça, a resposta: “Já O tenho glorificado, e outra vez O glorificarei”. João 12:28. Toda a vida de Cristo, da manjedoura ao tempo em que estas palavras foram proferidas, havia glorificado a Deus; e na provação que se avizinhava, Seus sofrimentos divino-humanos haviam de, na verdade, glorificar o nome de Seu Pai.
Ao ser ouvida a voz, um clarão irrompeu da nuvem, circundando a Cristo, como se os braços do Poder Infinito se atirassem em torno dEle qual muralha de fogo. Com espanto e terror contemplou o povo esta cena. Ninguém ousou falar. Lábios cerrados e respiração suspensa, quedaram todos, olhos fixos em Jesus. Dado o testemunho do Pai, ergueu-se a nuvem dispersando-se no céu. Por então cessara a comunhão visível entre o Pai e o Filho.
“Ora, a multidão que ali estava, e que a tinha ouvido, dizia que havia sido um trovão. Outros diziam: Um anjo Lhe falou”. João 12:29. Mas os indagadores gregos viram a nuvem, ouviram a voz, compreenderam-lhe o sentido, e discerniram na verdade a Cristo; foi-lhes revelado como o Enviado de Deus.
A voz de Deus se fizera ouvir no batismo de Jesus, ao princípio de Seu ministério, e outra vez no monte da transfiguração. Agora, ao fim desse ministério, era ouvida pela terceira vez, por maior número de pessoas, e sob circunstâncias especiais. Jesus acabara de proferir as mais solenes verdades a respeito da condição dos judeus. Fizera Seu último apelo, e pronunciara-lhes a condenação. Então pôs Deus o selo na missão de Seu Filho. Reconheceu Aquele a quem Israel rejeitara. “Não veio esta voz por amor de Mim”, disse Jesus, “mas por amor de vós”. João 12:30. Era a prova suprema de Sua messianidade, o sinal, da parte do Pai, de que Jesus falara a verdade, e era o Filho de Deus.
“Agora é o juiz deste mundo”, continuou Cristo; “agora será expulso o príncipe deste mundo. E Eu, quando for levantado da Terra, todos atrairei a Mim. E dizia isto significando de que morte havia de morrer”. João 12:31-33. Esta é a crise do mundo. Se Me torno a propiciação pelos pecados dos homens, o mundo será iluminado. O domínio de Satanás sobre as almas dos homens será despedaçado. A desfigurada imagem de Deus será restaurada na humanidade, e uma família de crentes santos herdará afinal o lar celestial. Este é o resultado da morte de Cristo. O Salvador perde-Se na contemplação da cena de triunfo ante Ele evocada. A cruz, a cruel, ignominiosa cruz, com todos os horrores que a cercam, Ele a vê resplendente de glória.
Mas a obra da redenção humana não resume tudo quanto é realizado pela cruz. O amor de Deus manifesta-se ao Universo. São refutadas as acusações que Satanás fez contra Deus. O príncipe deste mundo é expulso. É para sempre removida a mancha que ele atirou sobre o Céu. Os anjos, da mesma maneira que os homens, são atraídos para o Redentor. “E Eu, quando for levantado da Terra”, disse, “todos atrairei a Mim.”. João 12:32.
Muita gente estava aglomerada em volta de Cristo ao proferir Ele estas palavras, e um disse: “Nós temos ouvido da lei, que o Cristo permanece para sempre; e como dizes Tu que convém que o Filho do homem seja levantado? Quem é esse Filho do homem? Disse-lhe pois Jesus: A luz ainda está convosco por um pouco de tempo; andai enquanto tendes luz, para que as trevas vos não apanhem; pois quem anda nas trevas não sabe para onde vai. Enquanto tendes luz, crede na luz, para que sejais filhos da luz”. João 12:34-36.
“E ainda que tinha feito tantos sinais diante deles, não criam nEle”.João 12:37. Eles perguntaram uma vez ao Salvador: “Que sinal pois fazes Tu, para que o vejamos, e creiamos em Ti?” João 6:30. Inúmeros sinais haviam sido dados; mas eles fecharam os olhos e endureceram o coração. Agora, que o próprio Pai falara, e não podiam mais pedir sinais, recusaram ainda crer.
“Apesar de tudo, até muitos dos principais creram nEle; mas não o confessaram por causa dos fariseus, para não serem expulsos da sinagoga”. João 12:42. Amavam mais o louvor dos homens do que a aprovação de Deus. Para se livrarem de censura e vergonha, negaram a Cristo, e rejeitaram a oferta da vida eterna. E quantos, através de todos os séculos, têm feito assim! A estes se aplicam todas as palavras de advertência dadas por Cristo: “Quem ama a sua vida perdê-la-á.” “Quem Me rejeitar a Mim”, disse Jesus, “e não receber as Minhas palavras, já tem quem o julgue; a palavra que tenho pregado, essa o há de julgar no último dia”. João 12:48.
Ai dos que não conheceram o tempo de sua visitação! Lenta e dolorosamente deixou Cristo para sempre os limites do templo.