Por Ellen White
O Desejado de Todas as Nações
Este capítulo é baseado em Isaías 42: 3; Mateus 12: 21; Marcos 10: 1; Lucas 2: 49; 11: 9; 12: 32 – 34; 14: 24; 15: 32; 18: 7 – 8, 11 – 13; 9: 51- 56; 10: 1 – 24; 24; João 2:4; 3: 14, 16; 7: 6; 14: 17; 2 Coríntios 12: 10; Apocalipse 3: 20; 19: 30;
À medida que se aproximava o termo do ministério de Cristo, operava-se uma mudança em Sua maneira de trabalhar. Até então procurava evitar agitação e publicidade. Recusara as homenagens do povo, e passara rapidamente de um lugar a outro, quando o entusiasmo popular em seu favor parecia exceder os limites do domínio. Repetidamente recomendara que ninguém declarasse ser Ele o Cristo.
Ao tempo da festa dos tabernáculos, Sua viagem para Jerusalém fora feita com rapidez e sigilo. Quando solicitado por Seus irmãos a Se apresentar publicamente como o Messias, respondera: “Ainda não é chegado o Meu tempo”. João 7:6. Fez o caminho para Jerusalém sem ser observado, e na cidade penetrou sem Se anunciar, não recebendo honras da multidão. Assim não se deu, porém, quando de Sua última viagem. Em razão da malícia dos sacerdotes e rabinos, deixara Jerusalém por algum tempo. Mas agora Se dispôs a voltar, jornadeando publicamente, numa viagem cheia de rodeios, e precedida de anúncios de Sua aproximação como nunca antes fizera. Ia avançando para a cena de Seu grande sacrifício, e para este devia ser dirigida a atenção do povo.
“Como Moisés levantou a serpente no deserto, assim importa que o Filho do homem seja levantado”. João 3:14. Como os olhos de todo Israel foram dirigidos à serpente erguida, o símbolo designado para cura deles, assim devem todos os olhares serem atraídos a Cristo, o sacrifício que trouxe salvação ao mundo perdido.
Fora o falso conceito da obra do Messias e a falta de fé no divino caráter de Jesus, que levaram Seus irmãos a solicitar que Se apresentasse publicamente ao povo na festa dos tabernáculos. Agora, em idêntico espírito, os discípulos quiseram impedir que Ele fizesse essa viagem a Jerusalém. Lembravam-se de Suas palavras quanto ao que Lhe sobreviria ali, conheciam a mortal hostilidade dos guias religiosos e de bom grado haveriam dissuadido seu Mestre de ir lá.
Dolorosa coisa era para o coração de Jesus, avançar em Seu caminho a despeito dos temores, decepções e incredulidade dos amados discípulos. Duro era conduzi-los à angústia e desespero que os aguardavam em Jerusalém. E Satanás estava a postos para forçar suas tentações sobre o Filho do homem. Por que iria agora a Jerusalém, a uma morte certa? Por toda parte, ao Seu redor, estavam almas famintas do pão da vida. Por todo lado, almas sofredoras a esperar-Lhe a palavra de cura. A obra a ser operada pelo evangelho de Sua graça apenas começara. E Ele Se achava em pleno vigor da primavera da varonilidade. Por que não ir aos vastos campos do mundo com as palavras de Sua graça, o toque de Seu poder de curar? Por que não Se dar a alegria de conceder luz e satisfação aos entenebrecidos e sofredores milhões de criaturas? Por que deixar a colheita aos discípulos, tão fracos na fé, tão pesados de entendimento, tão tardios para agir? Por que enfrentar a morte agora, e deixar a obra ainda em sua infância? O inimigo que no deserto se defrontara com Cristo, assaltou-O então com cruéis e sutis tentações. Houvesse Jesus cedido por um instante, houvesse mudado Sua orientação no mínimo particular para salvar a Si mesmo, e os instrumentos de Satanás haveriam triunfado, ficando o mundo perdido.
Mas Jesus “manifestou o firme propósito de ir a Jerusalém”. A única lei de Sua vida era a vontade de Seu Pai. Na visita ao templo, em Sua meninice, dissera a Maria: “Não sabeis que Me convém tratar dos negócios de Meu Pai?” Lucas 2:49. Em Caná, quando Maria desejou que Ele manifestasse o poder miraculoso que possuía, Sua resposta foi: “Ainda não é chegada a Minha hora”. João 2:4. Com as mesmas palavras respondeu a Seus irmãos, quando insistiram em que fosse à festa. Mas no grande plano de Deus fora designada a hora para que Ele Se desse em oferta pelos pecados dos homens, e essa hora estava prestes a soar. Ele não fracassaria nem vacilaria. Seus passos se dirigem a Jerusalém, onde Seus inimigos há muito planejam tirar-Lhe a vida; agora, Ele a deporá. Assentou firmemente o propósito de ir ao encontro da perseguição, da negação, rejeição e condenação e morte.
E “mandou mensageiros diante da Sua face; e, indo eles, entraram numa aldeia de samaritanos, para Lhe prepararem pousada”. Lucas 9:52. Mas o povo recusou recebê-Lo, porque estava de caminho para Jerusalém. Isso eles interpretaram como uma preferência de Cristo pelos judeus, a quem aborreciam com ódio intenso. Houvesse Ele vindo para restaurar o templo e o culto do Monte Gerizim, e tê-Lo-iam de boa vontade acolhido; mais ia para Jerusalém, e não Lhe dispensariam nenhuma hospitalidade. Mal percebiam que estavam repelindo de suas portas o melhor dom do Céu! Jesus convidava os homens a recebê-Lo, pedia-lhes favores a fim de Se aproximar deles, para lhes conferir as mais ricas bênçãos. Todo favor a Ele concedido, galardoava com uma bênção mais preciosa. Mas tudo se perdeu para os samaritanos, devido a seu preconceito e fanatismo.
Tiago e João, mensageiros de Cristo, ficaram muito ressentidos ante o insulto feito a seu Senhor. Encheram-se de indignação por verem-nO tão rudemente tratado pelos samaritanos, a quem estava honrando com Sua presença. Não havia muito, estiveram com Ele no monte da transfiguração e O viram glorificado por Deus, e honrado por Moisés e Elias. Esta manifesta desonra da parte dos samaritanos não devia, pensavam, ser passada por alto, sem assinalado castigo.
Indo ter com Cristo, relataram-Lhe as palavras dos habitantes da aldeia, dizendo que haviam recusado até oferecer-Lhe pousada para a noite. Pensavam que Lhe tinha sido feita grave ofensa e, avistando a distância o Monte Carmelo, onde Elias matara os falsos profetas, disseram: “Senhor, queres que digamos que desça fogo do Céu e os consuma, como Elias também fez?” Ficaram surpreendidos de ver que Jesus Se magoava com as palavras deles, e ainda mais ao ouvirem-Lhe a censura: “Vós não sabeis de que espírito sois. Porque o Filho do homem não veio para destruir as almas dos homens, mas para salvá-las”. Lucas 9:55, 56. E foi para outra aldeia.
Não faz parte da missão de Cristo obrigar os homens a recebê-Lo. Satanás, e homens movidos por seu espírito, é que buscam forçar a consciência. Sob pretendido zelo pela justiça, homens aliados a anjos maus infligem sofrimento aos semelhantes, a fim de os converter a suas ideias religiosas; mas Cristo está sempre mostrando misericórdia, sempre procurando conquistar mediante a revelação de Seu amor. Não pode admitir rival na alma, nem aceita serviço parcial; mas deseja apenas o serviço voluntário, a espontânea entrega do coração constrangido pelo amor. Não há mais conclusiva prova de possuirmos o espírito de Satanás, do que a disposição de causar dano e destruir aos que não apreciam nossa obra, ou procedem em contrário a nossas ideias.
Toda criatura humana é, corpo, alma e espírito, propriedade de Deus. Cristo morreu para redimir a todos. Coisa alguma pode ser mais ofensiva ao Senhor do que, através do fanatismo religioso, os homens causarem sofrimento aos que são o preço do sangue do Salvador.
“E, levantando-Se dali, foi para os termos da Judéia, além do Jordão, e a multidão se reuniu em torno dEle; e tornou a ensiná-los”. Marcos 10:1. Parte considerável dos últimos meses do ministério de Cristo foi passada na Peréia, província “além do Jordão”, de quem vem da Judéia. Ali a multidão se aglomerava aos Seus passos, como nos primeiros tempos de Seu ministério na Galileia, e foram repetidos muitos de Seus anteriores ensinos.
Como enviara os doze, assim designou “ainda outros setenta, e mandou-os adiante da Sua face, de dois em dois, a todas as cidades e lugares onde Ele havia de ir”. Esses discípulos haviam estado por algum tempo com Ele, preparando-se para sua obra. Ao serem os doze enviados em sua primeira missão à parte, outros discípulos acompanharam Jesus pela Galileia. Tinham tido assim o privilégio da íntima associação com Ele, e Suas instruções pessoais. Agora, esse maior número também devia ser enviado separadamente em missão.
As instruções transmitidas aos setenta, eram idênticas às comunicadas aos doze; mas a ordem dada aos doze, de não entrar em cidade de gentios ou de samaritanos, não foi repetida aos setenta. Embora Cristo houvesse sido repelido pelos samaritanos, permaneceu inalterável Seu amor para com eles. Quando os setenta foram, em Seu nome, visitaram antes de tudo as cidades de Samaria.
A visita do próprio Salvador a Samaria, e, mais tarde, o elogio do bom samaritano, e a reconhecida alegria do leproso, aquele que fora o único, dentre os dez, a voltar para agradecer a Cristo, foram fatos muito significativos para os discípulos. A lição penetrou-lhes fundo na alma. Na comissão que lhes deu exatamente antes de Sua ascensão, Jesus mencionou Samaria juntamente com Jerusalém e a Judéia, como sendo os lugares onde deviam ir primeiramente pregar o evangelho. Esta comissão, Seus ensinos os prepararam para cumprir. Quando, em nome de Seu Mestre, foram a Samaria, encontraram o povo pronto a recebê-los. Os samaritanos tinham ouvido falar nas palavras de louvor e nas obras de misericórdia concedidas por Cristo a homens de sua nação. Viram que, não obstante o rude tratamento que Lhe deram, Ele só tinha pensamentos de amor a seu respeito, e seu coração foi conquistado. Depois de Sua ascensão, receberam bem os mensageiros do Salvador, e os discípulos recolheram uma preciosa colheita dentre os que outrora haviam sido seus mais obstinados inimigos. “A cana trilhada não quebrará nem apagará o pavio que fumega; em verdade produzirá o juízo”. Isaías 42:3. “E no Seu nome os gentios esperarão”. Mateus 12:21.
Ao enviar os setenta, Jesus lhes recomendou, como fizera aos doze, não impor sua presença onde não fossem bem acolhidos. “Em qualquer cidade em que entrardes e não vos receberem”, disse, “saindo por suas ruas, dizei: Até o pó, que da vossa cidade se nos apegou, sacudimos sobre vós. Sabei, contudo, isto, que já o reino de Deus é chegado a vós”. Lucas 10:8, 10, 11. Não deviam proceder assim por motivos de ressentimento ou de dignidade ferida, mas para mostrar quão ofensivo é recusar a mensagem do Senhor ou Seus mensageiros. Rejeitar os servos do Senhor é rejeitar o próprio Cristo.
“E digo-vos”, acrescentou Jesus, “que mais tolerância haverá naquele dia para Sodoma do que para aquela cidade”. Lucas 10:12. Então Seus pensamentos se volveram para as cidades galileias onde se realizara tão grande parte de Seu ministério. Em acentos de profunda tristeza, exclamou: “Ai de ti, Corazim, ai de ti, Betsaida que, se em Tiro e em Sidom se fizessem as maravilhas que em vós foram feitas, já há muito, assentadas em saco e cinza, se teriam arrependido. Portanto, para Tiro e Sidom haverá menos rigor no juízo, do que para vós. E tu, Cafarnaum, serás levantada até ao Céu? Até ao inferno serás abatida”. Lucas 10:13-15.
Àquelas ativas cidades junto ao Mar da Galileia, haviam sido abundantemente oferecidas as mais preciosas bênçãos do Céu. Dia após dia, o Príncipe da vida entrara e saíra entre elas. A glória de Deus, que profetas e reis anelaram ver, brilhara sobre as multidões que se aglomeravam após o Salvador. Todavia, rejeitaram o Dom celestial.
Com grande ostentação de prudência, haviam os rabinos advertido o povo contra a recepção das novas doutrinas ensinadas por esse novo Mestre; pois Suas teorias e costumes eram contrários aos ensinos dos Pais. O povo deu crédito ao que ensinavam os sacerdotes e fariseus, de preferência a buscar entender por si mesmos a Palavra de Deus. Honravam aos sacerdotes e principais de preferência a Deus, e rejeitavam a verdade para poderem guardar as próprias tradições. Muitos foram impressionados e quase persuadidos; não agiram, porém, segundo suas convicções, e não se contaram do lado de Cristo. Satanás apresentou suas tentações, até que a luz pareceu como as trevas. Assim muitos rejeitaram a verdade que se teria demonstrado ser a sua salvação.
Diz a Testemunha Verdadeira: “Eis que estou à porta, e bato”. Apocalipse 3:20. Toda advertência, reprovação e súplica, transmitida pela Palavra de Deus ou por Seus mensageiros, é uma batida na porta do coração. É a voz de Jesus que solicita entrada. A cada toque não atendido, torna-se mais fraca a disposição para abrir. A impressão do Espírito Santo que é hoje rejeitada, não será tão forte amanhã. O coração torna-se menos impressionável, e cai numa perigosa inconsciência da brevidade da vida e da grande eternidade além. Nossa condenação no Juízo não será resultado de havermos estado em erro, mas do fato de termos negligenciado as oportunidades enviadas pelo Céu, para conhecer a verdade.
Como os apóstolos, os setenta receberam dons sobrenaturais como selo de sua missão. Quando sua obra estava completa, voltaram com alegria, dizendo: “Senhor, pelo Teu nome, até os demônios se nos sujeitam.” Jesus respondeu: “Eu via Satanás, como raio, cair do Céu”. Lucas 10:18.
Ao espírito de Jesus apresentaram-se as cenas do passado e do futuro. Contemplou Lúcifer, ao ser no princípio expulso dos lugares celestiais. Viu antecipadamente as cenas de Sua própria agonia, quando, perante todos os mundos, havia de revelar-se o caráter do enganador. Ouviu o brado: “Está consumado” (João 19:30), anunciando estar para sempre assegurada a redenção da raça perdida e achar-se eternamente a salvo das acusações, enganos e pretensões de Satanás.
Para além da cruz do Calvário, com sua angústia e opróbrio, contemplou Jesus o grande dia final, quando o príncipe das potestades do ar encontrará sua destruição na Terra tão longamente desfigurada por sua rebelião. Jesus contemplou a obra do mal para sempre finda, e a paz de Deus enchendo o Céu e a Terra.
Daí em diante os seguidores de Cristo haviam de olhar a Satanás como inimigo vencido. Na cruz havia de alcançar a vitória por eles; essa vitória queria Jesus que aceitassem como deles mesmos. “Eis que vos dou poder para pisar serpentes, e escorpiões, e toda a força do inimigo, e nada vos fará dano algum”. Lucas 10:19.
A onipotente força do Espírito Santo é a defesa de toda alma contrita. A ninguém que, em arrependimento e fé, haja invocado Sua proteção, permitirá Cristo que caia sob o poder do inimigo. O Salvador Se acha ao lado de Suas criaturas tentadas e provadas. Com Ele não pode haver coisa como fracasso, perda, impossibilidade ou derrota; podemos fazer todas as coisas por meio dAquele que nos fortalece. Ao sobrevirem as tentações e provas, não espereis até haverdes ajustado todas as dificuldades, mas olhai a Jesus, vosso ajudador.
Há cristãos que falam demais sobre o poder de Satanás. Pensam em seu adversário, oram a seu respeito, falam nele, e ele avulta mais e mais em sua imaginação. É certo que Satanás é um ser poderoso; mas, graças a Deus, temos um forte Salvador, que expulsou do Céu o maligno. Satanás regozija-se quando lhe engrandecemos a força. Por que não falar em Jesus? Por que não exaltar Seu poder e Seu amor?
O arco-íris da promessa, que circunda o trono no alto, é um perpétuo testemunho de que “Deus amou o mundo de tal maneira que deu o Seu Filho unigênito, para que todo aquele que nEle crê não pereça, mas tenha a vida eterna”. João 3:16. Ele testifica perante o Universo que Deus nunca abandonará Seu povo na luta com o mal. Enquanto durar o próprio trono de Deus, é para nós uma garantia de força e proteção.
Jesus acrescentou: “Mas não vos alegreis por que se vos sujeitem os espíritos; alegrai-vos antes por estarem os vossos nomes escritos nos Céus”. Lucas 10:20. Não vos regozijeis na posse do poder, para que não olvideis vossa dependência de Deus. Vigiai, não se dê o caso de vos achardes possuídos de confiança em vós mesmos, nem trabalheis em vossas próprias forças, em vez de o fazer no espírito e poder de vosso Mestre. O eu está sempre pronto a tomar a honra, caso seja seguido de qualquer êxito. O eu lisonjeia-se e exalta-se, e não se faz sobre os outros espíritos a impressão de que Deus é tudo em todos. Diz o apóstolo Paulo: “Quando estou fraco então sou forte”. 2 Coríntios 12:10. Quando temos a compreensão de nossa fraqueza, aprendemos a confiar num poder que nos não é inerente. Coisa alguma pode exercer sobre o coração tão poderoso domínio, como o permanente sentimento de nossa responsabilidade para com Deus. Coisa alguma atinge tão plenamente aos mais íntimos motivos de conduta, como o sentimento do amor perdoador de Cristo. Temos de pôr-nos em contato com Deus, então seremos possuídos de Seu Espírito Santo, que nos habilita a pôr-nos em contato com nossos semelhantes. Regozijai-vos, pois, de que, por meio de Cristo, vos tenhais ligado a Deus, vos tenhais tornado membros da família celestial. Enquanto puserdes os olhos para além de vós mesmos, haveis de experimentar contínuo sentimento da fraqueza da humanidade. Quanto menos acariciardes o próprio eu, tanto mais distinta e ampla se tornará vossa compreensão da excelência de vosso Salvador. Quanto mais intimamente vos relacionardes com a fonte da luz e do poder, tanto mais abundante a luz que sobre vós incidirá, e maior o poder com que haveis de trabalhar para Deus. Regozijai-vos de ser um com Deus, um com Cristo, e com toda a família do Céu.
Ao escutarem os setenta as palavras de Cristo, o Espírito Santo lhes estava impressionando a mente com realidades vivas, e escrevendo a verdade na tábua do coração. Embora rodeados pelo povo, achavam-se como que isolados com Deus.
Sabendo que haviam recebido a inspiração daquela hora, “alegrou-Se Jesus no Espírito Santo, e disse: Graças Te dou, ó Pai, Senhor do Céu e da Terra, que escondestes estas coisas aos sábios e inteligentes, e as revelastes às criancinhas; assim é, ó Pai, porque assim Te aprouve. Tudo por Meu Pai Me foi entregue; e ninguém conhece quem é o Filho senão o Pai, nem que é o Pai senão o Filho, e aquele a quem o Filho o quiser revelar”. Lucas 10:21, 22.
Os homens honrados neste mundo, os chamados grandes e sábios, com toda a sua alardeada sabedoria, não podiam compreender o caráter de Cristo. Julgavam-nO segundo as aparências exteriores, segundo a humilhação que Lhe sobreveio como criatura humana. Mas a pescadores e publicanos fora concedido ver o Invisível. Os próprios discípulos deixaram de compreender tudo quanto Jesus lhes desejava revelar; mas de quando em quando, ao entregarem-se ao poder do Espírito Santo, sua mente era iluminada. Percebiam que o poderoso Deus, revestido da humanidade, Se achava entre eles. Jesus regozijava-Se de que, embora os sábios e inteligentes não possuíssem esse conhecimento, houvesse ele sido revelado a esses humildes homens. Frequentemente, ao apresentar as Escrituras do Antigo Testamento e mostrar sua aplicação a Ele próprio e a Sua obra de expiação, haviam sido despertados por Seu Espírito e erguidos à atmosfera celestial. Tinham, das verdades espirituais de que falavam os profetas, uma compreensão mais clara do que possuíam os próprios que originalmente as escreveram. Daí em diante, poderiam ler as Escrituras do Antigo Testamento não segundo as doutrinas dos escribas e fariseus, não como declarações de sábios já mortos, mas como uma nova revelação vinda de Deus. Contemplavam Aquele “que o mundo não pode receber, porque não O vê nem O conhece; mas vós O conheceis porque habita convosco, e estará em vós”. João 14:17.
A única maneira por que podemos obter mais perfeita compreensão da verdade, é conservar o coração brando e submisso ao Espírito de Cristo. A alma deve ser purificada da vaidade e do orgulho, esvaziada de tudo quanto a tem dominado, e Cristo entronizado no interior. A ciência humana é demasiado limitada para compreender a expiação. O plano da redenção é de tão vasto alcance que a filosofia não o pode explicar. Permanecerá para sempre um mistério que o mais profundo raciocínio não logra aprofundar. Não é possível explicar a ciência da salvação; pode-se, no entanto, conhecê-la pela experiência; unicamente aquele que vê a própria pecaminosidade é capaz de discernir a preciosidade do Salvador.
Repletas de instruções foram as lições dadas por Cristo, enquanto caminhavam lentamente da Galileia para Jerusalém. O povo escutava ansiosamente Suas palavras. Na Pereira como na Galileia, a população estava menos sob a influência do fanatismo judaico que na Judéia, e Seus ensinos encontraram mais acolhimento no coração deles.
Foi durante esses últimos meses do ministério de Cristo, que proferiu muitas de Suas parábolas. Os sacerdotes e rabis O perseguiam cada vez mais encarniçadamente, e Ele velava em símbolos as advertências que lhes dirigia. Eles não se podiam enganar quanto à Sua intenção, mas também não Lhe podiam encontrar nas palavras coisa alguma em que basear uma acusação contra Ele. Na parábola do fariseu e do publicano, a presunçosa oração: “Ó Deus, graças Te dou, porque eu não sou como os demais homens”, ficou em frisante contraste com a contrita súplica: “Tem misericórdia de mim, pecador”. Lucas 18:11, 13. Assim repreendia Cristo a hipocrisia dos judeus. E sob a figura da figueira estéril e da grande ceia, predisse a condenação prestes a cair sobre o impenitente povo. Os que haviam desdenhosamente rejeitado o convite ao banquete evangélico, ouviram-Lhe as palavras de advertência: “Eu vos digo que nenhum daqueles varões que foram convidados provará a Minha ceia”. Lucas 14:24.
Muito preciosas foram as instruções dadas aos discípulos. A parábola da viúva importuna e do amigo que pedia pão à meia-noite, deu novo vigor a Suas palavras: “Pedi, e dar-se-vos-á; buscai, e achareis; batei, e abrir-se-vos-á”. Lucas 11:9. E muitas vezes sua vacilante fé se fortaleceu pela lembrança de que Cristo dissera: “E Deus não fará justiça aos Seus escolhidos, que clamam a Ele de dia e de noite, ainda que tardio para com eles? Digo-vos que depressa lhes fará justiça”. Lucas 18:7, 8.
Cristo repetiu a bela parábola da ovelha desgarrada. E desenvolveu ainda mais sua lição, ao proferir a da moeda perdida e do filho pródigo. A força dessas lições, os discípulos não podiam então apreciar plenamente; depois do derramamento do Espírito Santo, porém, ao verem a colheita de gentios e a invejosa ira dos judeus, entenderam melhor a lição do filho pródigo e puderam colher o resultado das palavras de Cristo: “Era justo alegrarmo-nos e folgarmos”; “porque este Meu filho estava morto, e reviveu, tinha-se perdido, e foi achado”. Lucas 15:32, 24. E ao saírem em nome do Mestre, enfrentando o opróbrio, a pobreza e a perseguição, fortaleceram muitas vezes a alma repetindo o que lhes recomendara, quando nessa última jornada: “Não temas, ó pequeno rebanho, porque a vosso Pai agradou dar-vos o reino. Vendei o que tendes, e dai esmolas. Fazei para vós bolsas que não se envelheçam; tesouro nos Céus que nunca acabe, aonde não chega ladrão e a traça não rói. Porque onde estiver o vosso tesouro, ali estará também o vosso coração”. Lucas 12:32-34.