Por Ellen White O Desejado de Todas as Nações CPB
Este capítulo é baseado em Levítico 19: 17; Deuteronômio 10: 9; Salmo 18: 35; 50: 10 – 12; Isaías 14: 12 – 14; 66: 1 – 2; Mateus 5: 13; 17: 22 – 27; 18: 1 – 20; Marcos 9: 30 – 50; Lucas 9: 46 – 48; Romanos 12: 1; 15: 1; 2 Coríntios 5: 20; Gálatas 6:1; Filipenses 2: 7 – 8; Tiago 5:20
Voltando a Cafarnaum, Jesus não procurou os bem conhecidos lugares em que havia ensinado o povo, mas, tranquilo, buscou com os discípulos a casa que Lhe devia servir temporariamente de lar. Durante o resto de Sua permanência na Galileia, era Seu intuito instruir os discípulos de preferência a trabalhar em favor das multidões.
Na viagem pela Galileia, tentara Cristo outra vez preparar o espírito dos discípulos para as cenas que O aguardavam. Disse-lhes que devia ir a Jerusalém para ser morto e ressuscitar. E acrescentou a estranha e solene comunicação de que devia ser entregue nas mãos dos inimigos. Nem ainda então compreenderam os discípulos as Suas palavras. Embora os envolvesse a sombra de uma grande tristeza, ainda em seu coração encontrou lugar o espírito de rivalidade. Discutiram entre si qual seria considerado maior no reino. Essa contenda, pensaram eles ocultar de Jesus, e não procuraram, como de costume, achegar-se para mais perto dEle, mas demoraram-se atrás, de modo que Ele lhes ia na dianteira quando entraram em Cafarnaum. Jesus leu-lhes os pensamentos, e ansiou aconselhá-los e instruí-los. Esperou, porém, para isso, uma hora de sossego quando os corações estivessem abertos para Lhe receber as palavras.
Pouco depois de haverem chegado à cidade, o coletor do tributo do templo foi ter com Pedro, fazendo a pergunta: “O vosso Mestre não paga as didracmas?” Mateus 17:24. Esse tributo não era uma taxa civil, mas uma contribuição religiosa, exigida de todo judeu, anualmente, para manutenção do templo. A recusa de pagar o tributo seria considerada como deslealdade ao templo — segundo o conceito dos rabis, um gravíssimo pecado. A atitude do Salvador para com as leis dos rabis, e Suas positivas reprovações aos defensores da tradição, proporcionaram pretexto para a acusação de estar Ele procurando deitar por terra o serviço do templo. Agora, os inimigos viram um ensejo de lançar descrédito sobre Ele. No coletor dos tributos encontraram um ponto aliado.
Pedro viu na pergunta do dito funcionário uma insinuação quanto à lealdade de Cristo ao templo. Zeloso da honra do Mestre, respondeu precipitadamente, sem O consultar, que Jesus pagaria o tributo.
Mas Pedro não compreendeu senão em parte o intuito do que o interrogava. Havia algumas classes consideradas isentas do pagamento do tributo. No tempo de Moisés, quando os levitas foram separados para o serviço do santuário, não lhes foi dada herança entre o povo. O Senhor disse: “Levi com seus irmãos não têm parte na herança; o Senhor é a sua herança”. Deuteronômio 10:9. Nos dias de Cristo, os sacerdotes e levitas eram ainda tidos como especialmente consagrados ao templo, não lhes sendo exigida a contribuição anual para a manutenção do mesmo. Também os profetas estavam isentos desse pagamento. Requerendo tributo de Jesus, os rabis punham à margem Seus direitos como profeta e mestre, e tratavam-nO como uma pessoa comum. A recusa de Sua parte, de pagar o tributo, seria apresentada como deslealdade ao templo; ao passo que, por outro lado, o pagamento do mesmo seria tomado como justificação de O rejeitarem como profeta.
Havia pouco tempo, apenas, Pedro reconhecera Jesus como o Filho de Deus; mas deixara nesse caso de salientar o caráter divino do Mestre. Por sua resposta ao coletor, de que Jesus havia de pagar o tributo, sancionara, virtualmente, o falso conceito que os sacerdotes e principais estavam procurando generalizar a Seu respeito.
Ao entrar Pedro em casa, o Salvador não fez referência ao que sucedera, mas perguntou: “Que te parece, Simão? De quem cobram os reis da Terra os tributos, ou o censo? Dos seus filhos, ou dos alheios?” Pedro respondeu: “Dos alheios.” E Jesus disse: “Logo, estão livres os filhos”. Mateus 17:25, 26. Ao passo que o povo de um país é obrigado a pagar imposto para manutenção de seu rei, os filhos do próprio rei ficam livres. Assim de Israel, o professo povo de Deus, era exigido que mantivesse Seu serviço; mas Jesus, o Filho de Deus, não estava sob tal obrigação. Se os sacerdotes e levitas estavam isentos, em virtude de sua ligação com o templo, quanto mais Aquele para quem o templo era a casa de Seu Pai!
Se Jesus houvesse pago o tributo sem protestar, teria, virtualmente, reconhecido a justiça da reclamação, tendo assim negado Sua divindade. Mas ao passo que viu ser bom satisfazer à exigência, negou o direito sobre que esta se pretendia basear. Provendo o necessário para pagamento do tributo, deu Ele o testemunho de Seu caráter divino. Foi demonstrado que Ele era um com Deus e, portanto, não Se achava sob tributo, como um simples súdito do reino.
Vai ao mar”, disse Ele a Pedro, “lança o anzol, tira o primeiro peixe que subir, e, abrindo-lhe a boca, encontrarás um estáter; toma-o, e dá-o por Mim e por ti”. Mateus 17:27.
Conquanto houvesse revestido Sua divindade com a humanidade, revelou, nesse milagre, a Sua glória. Era evidente ser Este Aquele que, por meio de Davi, declara: “Porque Meu é todo animal da selva, e as alimárias sobre milhares de montanhas. Conheço todas as aves dos montes; e Minhas são todas as feras do campo. Se Eu tivesse fome, não to diria, pois Meu é o mundo e a sua plenitude”. Salmos 50:10-12.
Conquanto Jesus tornasse claro não Se achar sob obrigação de pagar o tributo, não entrou em discussão com os judeus a respeito do assunto; pois teriam interpretado mal Suas palavras, virando-as contra Ele. Para não escandalizá-los por não dar o tributo, fez aquilo que não Lhe poderia com justiça ser exigido. Essa lição deveria ser de grande valor para os discípulos. Notáveis mudanças se haveriam de em breve operar nas relações deles para com o serviço do templo, e Cristo os ensinou a não se colocarem, desnecessariamente, em antagonismo com a ordem estabelecida. Deveriam, o quanto possível, evitar dar ocasião a que sua fé fosse mal-interpretada. Conquanto os cristãos não devam sacrificar um único princípio da verdade, cumpre-lhes evitar debates sempre que isso seja possível.
Quando Cristo e os discípulos se achavam a sós em casa, enquanto Pedro se dirigira ao mar, Jesus chamou os outros a Si e perguntou: “Que estáveis vós discutindo pelo caminho?” Marcos 9:33. A presença de Jesus e Sua pergunta fizeram a questão aparecer-lhes num aspecto inteiramente diverso daquele em que a tinham considerado quando questionavam pelo caminho. A vergonha e um sentimento de condenação própria fê-los emudecer. Jesus lhes dissera que havia de morrer por amor deles, e sua egoísta ambição achava-se em doloroso contraste com o abnegado amor dEle.
Quando Jesus lhes disse que havia de ser condenado à morte e ressurgir dos mortos, buscava atraí-los a uma conversação a respeito da grande prova de fé por que haviam de passar. Houvessem os discípulos estado prontos a receber o que Ele lhes desejava comunicar, e ter-se-iam poupado a atroz angústia e desespero. Suas palavras lhes teriam levado consolo na hora de se verem privados dEle, cheios de decepção. Mas se bem que lhes houvesse falado tão claramente acerca do que O aguardava, a menção de Sua próxima ida a Jerusalém lhes suscitou novamente as esperanças de que o reino estava para ser estabelecido. Isto levara à questão quanto a quem deveria ocupar os mais altos lugares. Voltando Pedro do mar, contaram-lhe os discípulos a pergunta do Salvador, e por fim alguém se animou a perguntar a Jesus: “Quem é o maior no reino dos Céus?”
O Salvador reuniu os discípulos em torno de Si, e disse-lhes: “Se alguém quiser ser o primeiro, será o derradeiro de todos e o servo de todos”. Marcos 9:35. Havia nestas palavras uma solenidade e impressividade que os discípulos estavam longe de compreender. O que Cristo discernia não podiam ver. Não compreendiam a natureza de Seu reino, e esta ignorância era a causa aparente de sua contenda. A causa real, porém, jazia mais fundo. Explicando a natureza de Seu reino, Cristo acalmaria temporariamente a questão; isto, no entanto, não teria tocado no motivo básico. Mesmo depois de haverem recebido o mais pleno conhecimento, ter-se-ia renovado a dificuldade a qualquer questão de precedência. Assim sobreviria ruína à igreja de Cristo depois de Sua partida. A luta pelo mais alto lugar era a operação do mesmo espírito que dera origem à grande controvérsia nos mundos de cima, e trouxera a Cristo do Céu para morrer. Diante dEle surgiu a visão de Lúcifer, o “filho da alva”, sobrepujando em glória a todos os anjos que rodeavam o trono, e ligado pelos mais íntimos laços ao Filho de Deus. Lúcifer dissera: “Serei semelhante ao Altíssimo” (Isaías 14:12, 14); e o desejo de exaltação própria levara conflito às cortes celestiais, e banira uma multidão das hostes de Deus. Houvesse na verdade Lúcifer desejado ser semelhante ao Altíssimo, e nunca teria perdido o lugar que lhe fora designado no Céu; pois o espírito do Altíssimo manifesta-se em abnegado ministério.
Quando Jesus lhes disse que havia de ser condenado à morte e ressurgir dos mortos, buscava atraí-los a uma conversação a respeito da grande prova de fé por que haviam de passar. Houvessem os discípulos estado prontos a receber o que Ele lhes desejava comunicar, e ter-se-iam poupado a atroz angústia e desespero. Suas palavras lhes teriam levado consolo na hora de se verem privados dEle, cheios de decepção. Mas se bem que lhes houvesse falado tão claramente acerca do que O aguardava, a menção de Sua próxima ida a Jerusalém lhes suscitou novamente as esperanças de que o reino estava para ser estabelecido. Isto levara à questão quanto a quem deveria ocupar os mais altos lugares. Voltando Pedro do mar, contaram-lhe os discípulos a pergunta do Salvador, e por fim alguém se animou a perguntar a Jesus: “Quem é o maior no reino dos Céus?”
O Salvador reuniu os discípulos em torno de Si, e disse-lhes: “Se alguém quiser ser o primeiro, será o derradeiro de todos e o servo de todos”. Marcos 9:35. Havia nestas palavras uma solenidade e impressividade que os discípulos estavam longe de compreender. O que Cristo discernia não podiam ver. Não compreendiam a natureza de Seu reino, e esta ignorância era a causa aparente de sua contenda. A causa real, porém, jazia mais fundo. Explicando a natureza de Seu reino, Cristo acalmaria temporariamente a questão; isto, no entanto, não teria tocado no motivo básico. Mesmo depois de haverem recebido o mais pleno conhecimento, ter-se-ia renovado a dificuldade a qualquer questão de precedência. Assim sobreviria ruína à igreja de Cristo depois de Sua partida. A luta pelo mais alto lugar era a operação do mesmo espírito que dera origem à grande controvérsia nos mundos de cima, e trouxera a Cristo do Céu para morrer. Diante dEle surgiu a visão de Lúcifer, o “filho da alva”, sobrepujando em glória a todos os anjos que rodeavam o trono, e ligado pelos mais íntimos laços ao Filho de Deus. Lúcifer dissera: “Serei semelhante ao Altíssimo” (Isaías 14:12, 14); e o desejo de exaltação própria levara conflito às cortes celestiais, e banira uma multidão das hostes de Deus. Houvesse na verdade Lúcifer desejado ser semelhante ao Altíssimo, e nunca teria perdido o lugar que lhe fora designado no Céu; pois o espírito do Altíssimo manifesta-se em abnegado ministério.
Lúcifer desejava o poder de Deus, mas não o Seu caráter. Buscava para si mesmo o mais alto lugar, e toda criatura que é movida por seu espírito fará o mesmo. Assim serão inevitáveis a separação, a discórdia e a contenda. O domínio torna-se o prêmio do mais forte. O reino de Satanás é um reino de força; cada indivíduo considera todos os outros como obstáculo no caminho de seu próprio progresso, ou um degrau sobre o qual pode subir para chegar a uma posição mais elevada.
Enquanto Lúcifer reputava o ser igual a Deus uma coisa de que se devesse apoderar, Cristo, o Exaltado, “aniquilou-Se a Si mesmo, tomando a forma de servo, fazendo-Se semelhante aos homens; e, achado na forma de homem, humilhou-Se a Si mesmo, sendo obediente até à morte, e morte de cruz”. Filipenses 2:7, 8. Agora a cruz se achava justamente diante dEle; e Seus próprios discípulos estavam tão cheios de interesse egoísta — o próprio princípio do reino de Satanás — que não lhes era possível encher-se de compassivo interesse para com seu Senhor, ou mesmo compreendê-Lo ao falar de Sua humilhação por eles.
Mui ternamente, mas com solene acento, Jesus procurou corrigir o mal. Mostrou qual o princípio que domina no reino do Céu, e em que consiste a verdadeira grandeza, segundo a estimativa das normas do alto. Os que eram atuados por orgulho e amor de distinções, estavam pensando em si mesmos e nas recompensas que deveriam obter, em vez de cuidar em como devolver a Deus os benefícios recebidos. Eles não teriam lugar no reino do Céu, pois achavam-se identificados com as fileiras de Satanás.
“Diante da honra vai a humildade”. Provérbios 15:33. Para ocupar um elevado cargo diante dos homens, o Céu escolhe o obreiro que, como João Batista, assume posição humilde diante de Deus. O mais infantil dos discípulos é o mais eficiente no trabalho para Deus. Os seres celestes podem cooperar com aquele que procura não se exaltar, mas salvar almas. Aquele que mais profundamente sente sua necessidade de auxílio divino, há de pedi-lo; e o Espírito Santo lhe dará vislumbres de Jesus que lhe fortalecerão e elevarão a alma. Da comunhão com Cristo sairá ele para trabalhar pelos que estão perecendo em seus pecados. Está ungido para sua missão; e é bem- sucedido onde muitos instruídos e intelectualmente sábios fracassariam.
Mas quando os homens se exaltam, sentindo que são uma necessidade para o êxito do grande plano de Deus, o Senhor faz com que sejam postos de lado. Torna-se evidente que o Senhor não depende deles. A obra não se detém por causa de seu afastamento da mesma, mas vai avante com maior poder.
Não bastava aos discípulos de Jesus o serem instruídos quanto à natureza de Seu reino. O que necessitavam era uma mudança de coração que os pusesse em harmonia com seus princípios. Chamando a Si uma criancinha, Jesus a colocou no meio deles; e, envolvendo ternamente o pequenino nos braços, disse: “Em verdade vos digo que, se vos não converterdes e não vos fizerdes como meninos, de modo algum entrareis no reino dos Céus”. Mateus 18:3. A simplicidade, o esquecimento de si mesma e o confiante amor de uma criancinha, são os atributos estimados pelo Céu. São essas as características da verdadeira grandeza.
Jesus tornou a explicar aos discípulos que Seu reino não se caracteriza por terrena dignidade e ostentação. Junto a Jesus esquecem-se todas estas distinções. O rico e o pobre, o instruído e o ignorante se encontram, sem nenhuma ideia de classe ou mundana preeminência. Todos se aproximam como almas compradas por sangue, igualmente dependentes dAquele que as redimiu para Deus.
A alma sincera e contrita é preciosa diante de Deus. Ele coloca o Seu sinete sobre os homens, não por posição, não por fortuna, não por sua grandeza intelectual, mas pela sua unidade com Cristo. O Senhor da glória fica satisfeito com aqueles que são mansos e humildes de coração. “Também me deste o escudo da Tua salvação: […] e a Tua mansidão” — como elemento no caráter humano — “me engrandeceu”. Salmos 18:35.
“Qualquer que receber um destes meninos em Meu nome”, disse Jesus, “a Mim Me recebe; e qualquer que a Mim Me receber, recebe, não a Mim, mas ao que Me enviou”. Marcos 9:37.“ Assim diz o Senhor: O Céu é o Meu trono, e a Terra o escabelo dos Meus pés:… mas eis para quem olharei: para o pobre e abatido de espírito, e que treme da Minha palavra”. Isaías 66:1, 2.
As palavras do Salvador despertaram nos discípulos um sentimento de desconfiança de si mesmos. Ninguém fora especialmente apontado na resposta; mas João foi levado a duvidar de que em certo caso sua atitude fora correta. Com espírito de criança, expôs a questão a Jesus. “Mestre”, disse ele, “vimos um que em Teu nome expulsava demônios, o qual não nos segue; e nós lho proibimos, porque não nos segue”. Lucas 9:49.
Tiago e João pensaram que, opondo-se a esse homem, tinham tido em vista a honra de seu Senhor; começaram a ver que tiveram ciúmes da sua própria. Reconheceram seu erro e aceitaram a reprovação de Jesus: “Não lho proibais; porque ninguém há que faça milagres em Meu nome e possa logo falar mal de Mim”. Marcos 9:39. Pessoa alguma que se mostrasse de algum modo amiga de Cristo, devia ser repelida. Muitos havia que tinham sido profundamente movidos pelo caráter e a obra de Cristo, e cujo coração se estava abrindo para Ele com fé; e os discípulos, que não podiam ler os motivos, deviam ter cuidado em não desanimar essas almas. Quando Jesus não mais Se achasse pessoalmente com eles, e a obra fosse deixada em suas mãos, não deviam ceder a um espírito estreito, exclusivista, mas manifestar a larga simpatia que tinham visto em seu Mestre.
O fato de uma pessoa não se conformar em tudo com nossas próprias ideias e opiniões, não nos justifica proibir-lhe o trabalhar para Deus. Cristo é o grande Mestre; não nos compete julgar ou ordenar, mas deve cada um sentar-se com humildade aos pés de Jesus e dEle aprender. Toda alma que Deus tornou voluntária, é um instrumento por onde Cristo revelará Seu amor cheio de perdão. Quão cuidadosos devemos ser para não desanimar um dos que transmitem a luz de Deus, interceptando assim os raios que Ele queria fazer brilhar no mundo!
A aspereza e a frieza manifestadas por um discípulo para com uma pessoa a quem Cristo estava atraindo — um ato como o que João praticara ao proibir alguém de operar milagres em nome de Cristo — poderia dar em resultado o encaminhar aquela criatura para a senda do inimigo, ocasionando a ruína de uma alma. De preferência a fazer alguém isso, disse Jesus: “Melhor lhe fora que se lhe pendurasse ao pescoço uma mó de azenha e se submergisse na profundeza do mar.” E acrescentou: “Se a tua mão te escandalizar, corta-a; melhor é para ti entrares na vida aleijado do que, tendo duas mãos, ires para o inferno, para o fogo que nunca se apaga. E, se o teu pé te escandalizar, corta-o; melhor é para ti entrares coxo na vida do que, tendo dois pés, seres lançado no inferno”. Marcos 9:42-44.
Por que essa veemente linguagem, a cujo vigor nenhuma outra pode exceder? Porque “o Filho do homem veio salvar o que se tinha perdido”. Mateus 18:11. Hão de Seus discípulos mostrar menos consideração pela alma de seus semelhantes do que manifestou a Majestade do Céu? Cada alma custou um infinito preço, e quão terrível é o pecado de desviar uma alma de Cristo, de maneira que para ela hajam sido em vão o amor, a humilhação e agonia do Salvador!
“Ai do mundo, por causa dos escândalos; porque é mister que venham escândalos.” O mundo, inspirado por Satanás, há de sem falta opor-se aos seguidores de Cristo e procurar destruir-lhes a fé; mas ai daquele que tomou o nome de Cristo, e é todavia encontrado a fazer essa obra! Nosso Senhor é exposto à injúria pelos que pretendem servi-Lo, mas Lhe representam mal o caráter; e multidões são enganadas e induzidas a falsas veredas.
Qualquer hábito ou prática conducente ao pecado, capaz de trazer desonra sobre Cristo, convém ser posto de lado, seja qual for o sacrifício. Aquilo que desonra a Deus, não pode ser benéfico à alma. A bênção do Céu não pode seguir qualquer homem no violar os eternos princípios do direito. E um pecado alimentado é suficiente para operar a degradação do caráter e desencaminhar a outros. Se o pé ou a mão seriam cortados, ou mesmo arrancado o olho, para salvar o corpo da morte, quanto mais zelosos deveríamos ser em lançar fora o pecado, que traz a condenação eterna!
No serviço ritual, era adicionado o sal a todo sacrifício. Isto, como a oferta de incenso, significava que unicamente a justiça de Cristo poderia ser aceitável a Deus. Referindo-Se a esse costume, disse Jesus: “Cada sacrifício será salgado com sal.” “Tende sal em vós mesmos, e paz uns com os outros”. Marcos 9:50. Todos quantos se quiserem apresentar a si mesmos como “sacrifício vivo, santo e agradável a Deus” (Romanos 12:1), devem receber o sal salvador — a justiça de nosso Redentor. Tornam-se então “o sal da terra” (Mateus 5:13), restringindo o mal entre os homens, como o sal preserva da corrupção. Mas se o sal perdeu o sabor, se existe apenas uma profissão de piedade, sem o amor de Cristo, não há poder para o bem. A vida não pode exercer salvadora influência no mundo. Vossa energia e eficiência em edificar o Meu reino, diz Jesus, dependem de receberdes de Meu Espírito. Deveis ser participantes de Minha graça, a fim de ser um cheiro de vida para vida. Então, não haverá rivalidade, nem interesses egoístas, nem desejo de obter o lugar mais elevado. Haveis de ter aquele amor que não busca o que é propriamente seu, mas o bem de outros.
Que o pecador arrependido fixe os olhos sobre “o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo” (João 1:29); e, contemplando, é transformado. Seu temor transmuda-se em alegria, suas dúvidas em esperanças. Surge a gratidão. Abranda-se a alma empedernida. Uma onda de amor inunda a alma. Cristo é nele uma fonte que salta para a vida eterna. Quando vemos a Jesus, um Homem de dores e familiarizado com os trabalhos, esforçando-Se por salvar os perdidos, rejeitado, escarnecido, expulso de cidade em cidade, até que se cumprisse Sua missão; quando O contemplamos no Getsêmani, suando grandes gotas de sangue, e na cruz, morrendo em agonia — quando vemos isto, não mais o próprio eu clama por atenções. Olhando a Jesus, envergonhamo-nos de nossa frieza, nossa letargia, nosso espírito interesseiro. Estaremos dispostos a ser qualquer coisa e a não ser nada, contanto que façamos um serviço de amor para o Mestre. Regozijar-nos-emos em levar a cruz após Cristo, suportar a prova, a vergonha ou a perseguição por amor dEle.
“Nós, que somos fortes, devemos suportar as fraquezas dos fracos, e não agradar a nós mesmos”. Romanos 15:1. Nenhuma pessoa que creia em Cristo, embora seja fraca a sua fé, e seus passos vacilantes como os de uma criancinha, deve ser desconsiderada. Por tudo que nos confere vantagem sobre outros — seja educação e refinamento, seja nobreza de caráter, educação cristã ou experiência religiosa — achamo-nos em dívida para com os menos favorecidos; e, o quanto estiver ao nosso alcance, cumpre-nos ajudá-los. Se somos fortes, devemos sustentar as mãos do fraco. Anjos de glória, que contemplam continuamente a face do Pai no Céu, regozijam-se em servir aos Seus pequeninos. Almas trementes, com muitos objetáveis traços de caráter, são seu particular encargo. Os anjos se acham sempre presentes onde mais necessários são, ao lado dos que têm a mais dura batalha a combater contra o próprio eu, e cujo ambiente é o mais desanimador. E neste ministério hão de cooperar os verdadeiros seguidores de Cristo.
Se um desses pequeninos for vencido, e cometer uma falta contra vós, é vosso trabalho então buscar restaurá-lo. Não espereis que ele faça o primeiro esforço para a reconciliação. “Que vos parece?” disse Jesus. “Se algum homem tiver cem ovelhas, e uma delas se desgarrar, não irá pelos montes, deixando as noventa e nove, em busca da que se desgarrou? E, se porventura a acha, em verdade vos digo que maior prazer tem por aquela do que pelas noventa e nove que não se desgarraram. Assim também não é vontade de vosso Pai que está nos Céus, que um destes pequeninos se perca”. Mateus 18:12-14.
Em espírito de mansidão, “olhando por ti mesmo, para que não sejas também tentado” (Gálatas 6:1), vai ter com o que está em falta, e “repreende-o entre ti e ele só”. Mateus 18:15. Não o exponhas à vergonha, contando sua falta aos outros, nem desonres a Cristo tornando público o pecado ou o erro de uma pessoa que Lhe usa o nome. Muitas vezes, a verdade deve ser francamente dita ao que está em erro; ele deve ser levado a ver esse erro, para que se emende. Mas não te compete julgar nem condenar. Não faças tentativas de justificação própria. Sejam todos os teus esforços no sentido de o restabelecer. Exige o mais delicado tato, a mais fina sensibilidade, o tratamento das feridas da alma. Unicamente o amor emanado da Vítima do Calvário pode aí ser eficaz. Trate o irmão com piedosa ternura o outro irmão, sabendo que, se for bem-sucedido, “salvará da morte uma alma”, e “cobrirá uma multidão de pecados”. Tiago 5:20.
Mas mesmo esse esforço poderá ser infrutífero. Então, disse Jesus, “leva ainda contigo um ou dois”. Mateus 18:16. Talvez sua influência unida prevaleça onde a do primeiro fora malsucedida. Não sendo partes na questão, estarão mais aptos a agir com imparcialidade, e isso dará a sua opinião mais peso diante do que se acha em falta.
Se ele não os atender, então, e só então, o assunto deve ser levado perante o inteiro corpo de crentes. Que os membros da igreja, como representantes de Cristo, se unam em oração e amoráveis súplicas para que o ofensor seja restaurado. O Espírito Santo falará por meio de Seus servos, pleiteando com o errante para voltar para Deus. O apóstolo Paulo, falando por inspiração, diz: “Como se Deus por nós rogasse. Rogamo-vos pois da parte de Cristo que vos reconcilieis com Deus”. 2 Coríntios 5:20. Aquele que rejeita esta unida tentativa, rompeu o laço que o ligava a Cristo, separando-se assim da sociedade da igreja. Daí em diante, disse Jesus, “considera-o como um gentio e publicano”. Mas a ele não se deve olhar como separado da misericórdia de Deus. Não seja desprezado ou negligenciado por seus antigos irmãos, mas tratado com ternura e compaixão, como uma das ovelhas perdidas a quem Cristo ainda está buscando trazer para o aprisco.
As instruções de Cristo quanto ao tratamento dos transviados repetem, de maneira mais específica, o ensino dado a Israel por intermédio de Moisés: “Não aborrecerás a teu irmão no teu coração; não deixarás de repreender o teu próximo, e não levarás sobre ti o pecado por causa dele”. Levítico 19:17. Isto é, se alguém negligencia o dever que lhe é imposto por Cristo, de procurar restabelecer os que se acham em erro e pecado, torna-se participante do pecado. Somos tão responsáveis por males que poderíamos haver reprimido, como se fôssemos nós mesmos culpados da ação.
Mas é ao que procedeu mal mesmo que nos cumpre apresentar o erro. Não devemos fazer disso assunto de comentários e críticas entre nós; nem mesmo depois de isso haver sido comunicado à igreja, achamo-nos na liberdade de o repetir aos outros. O conhecimento das faltas dos cristãos só servirá de pedra de tropeço para o mundo incrédulo; e, demorando-nos sobre essas coisas, só nos fazemos mal; pois é pela contemplação que somos transformados. Ao procurarmos corrigir os erros de um irmão, o Espírito de Cristo nos levará a resguardá-lo quanto possível até da crítica dos próprios irmãos, quanto mais de censura do mundo incrédulo. Nós mesmos somos falíveis, e necessitamos da piedade e do perdão de Cristo, e da mesma maneira que desejamos que nos trate, pede-nos que nos tratemos uns aos outros.
“Tudo o que ligardes na Terra será ligado no Céu, e tudo o que desligardes na Terra será desligado no Céu”. Mateus 18:18. Estais agindo como embaixadores do Céu e os resultados de vossa obra são para a eternidade.
Não temos, porém, de tomar sozinhos esta grande responsabilidade. Onde quer que Sua Palavra seja obedecida com sinceridade de coração, aí habita Cristo. Ele não somente Se acha presente nas assembleias da igreja, mas onde quer que discípulos, por poucos que sejam, se reúnam em Seu nome, ali também estará. E diz: “Se dois de vós concordarem na Terra acerca de qualquer coisa que pedirem, isso lhes será feito por Meu Pai, que está nos Céus”. Mateus 18:19.
Jesus diz: “Meu Pai, que está nos Céus”, como a lembrar os discípulos de que, enquanto por Sua humanidade Ele Se lhes acha ligado, participante das provações deles, e compadecendo-Se deles em seus sofrimentos, por Sua divindade está em comunicação com o trono do Infinito. Maravilhosa certeza! Os seres celestes unem-se aos homens em simpatia e trabalho pela salvação daquilo que se havia perdido. E todo o poder do Céu é posto ao lado da habilidade humana para atrair pessoas a Cristo.