Por Ellen White
O Desejado de Todas as Nações
Este capítulo é baseado em Mateus 28:18; Lucas 7; João 1:9; 4:4 – 8; Hebreus 2: 14 – 15; Romanos 8:11; Efésios 5: 14; 1 Tessalonicenses 4: 16 – 17; Colossenses 1:13; Tito 3:5; Apocalipse 1: 18
Cristo dissera ao nobre cujo filho curara: “Se não virdes sinais e milagres, não crereis”. João 4:48. Doía-Lhe que Sua própria nação exigisse esses sinais exteriores de Sua messianidade. De quando em quando, maravilhara-Se da incredulidade deles. Igualmente, porém, Se admirou da fé do centurião que foi ter com Ele. O centurião não pôs em dúvida o poder do Salvador. Nem sequer pediu que fosse em pessoa realizar o milagre. “Dize somente uma palavra”, disse ele, “e o meu criado sarará”. Mateus 8:8.
O servo do centurião fora acometido de paralisia, e estava às portas da morte. Entre os romanos, os servos eram escravos, comprados e vendidos nas praças, maltratados e vítimas de crueldades; mas o centurião era ternamente afeiçoado a seu servo, e com ardor desejava seu restabelecimento. Acreditava que Jesus o poderia curar. Nunca vira o Salvador, mas as notícias que lhe chegaram aos ouvidos lhe inspiraram fé. Não obstante o formalismo dos judeus, esse romano estava convencido de que a religião deles era superior a sua. Já rompera as barreiras de preconceitos e ódios nacionais que separavam os conquistadores do povo conquistado. Manifestara respeito pelo serviço divino, e bondade para com os judeus, como Seus adoradores. Nos ensinos de Cristo, segundo lhe haviam sido comunicados, encontrara aquilo que satisfazia às necessidades da alma. Tudo quanto havia de espiritual dentro dele, correspondera às palavras do Salvador. Sentira-se, porém, indigno de chegar à presença de Jesus e apelara para os anciãos dos judeus, a fim de fazerem o pedido quanto à cura do servo. Estavam relacionados com o grande Mestre, e saberiam, pensava, aproximar-se dEle de maneira a Lhe conseguir o favor.
Ao entrar Jesus em Cafarnaum, foi-Lhe ao encontro uma delegação de anciãos, os quais Lhe falaram do desejo do oficial. Insistiram em que era digno de que lhe concedesse isto, porque, diziam: “ama a nossa nação, e ele mesmo nos edificou a sinagoga”. Lucas 7:5.
Jesus partiu imediatamente para a casa do oficial; mas, premido pela multidão, avançava devagar. As novas de Sua vinda O precederam, e o centurião, em sua desconfiança dos próprios méritos, enviou-Lhe a mensagem: “Senhor, não Te incomodes, porque não sou digno de que entres debaixo do meu telhado”. Lucas 7:6. Mas o Salvador continuou andando, e o centurião, ousando afinal aproximar-se dEle, completou a mensagem, dizendo: “Nem ainda me julguei digno de ir ter contigo; dize, porém, uma palavra, e o meu criado sarará. Porque eu também sou homem sujeito à autoridade, e tenho soldados sob o meu poder, e digo a este: Vai; e ele vai; e a outro: Vem; e ele vem; e ao meu servo: Faze isto; e ele o faz”. Lucas 7:7, 8. Como eu represento o poder de Roma, e meus soldados reconhecem minha autoridade como suprema, assim Tu representas o poder do infinito Deus, e todas as coisas criadas obedecem à Tua palavra. Podes ordenar à doença que saia, e ela Te obedecerá. Podes chamar Teus mensageiros celestiais, e comunicarão virtude vivificadora. Fala tão-somente uma palavra, e o meu criado sarará.
“E, ouvindo isto Jesus, maravilhou-Se dele, e, voltando-Se, disse à multidão que O seguia: Digo-vos que nem ainda em Israel tenho achado tanta fé”. Lucas 7:9. E ao centurião, disse: “Vai, e como creste te seja feito. E naquela mesma hora o seu criado sarou”. Mateus 8:13.
Os anciãos judeus que haviam recomendado o centurião a Cristo, tinham mostrado quão longe estavam de possuir o espírito do evangelho. Não reconheciam que nossa grande necessidade é nosso único título à misericórdia divina. Em sua justiça própria, louvaram o centurião por causa do favor que manifestara para com “nossa nação”. Mas o centurião disse de si mesmo: “Não sou digno.” Seu coração fora tocado pela graça de Cristo. Viu a própria indignidade; não temia, no entanto, pedir auxílio. Não confiava na própria bondade; o argumento que apresentava era sua grande necessidade. Sua fé apegou-se a Cristo em Seu verdadeiro caráter. Não cria nEle apenas como operador de milagres, mas como o amigo e salvador da humanidade.
É assim que todo pecador, se deve aproximar de Cristo. “Não pelas obras de justiça que houvéssemos feito, mas segundo a Sua misericórdia, nos salvou”. Tito 3:5. Quando Satanás vos diz que sois pecador, e não podeis esperar receber bênçãos de Deus, dizei-lhe que Cristo veio ao mundo para salvar pecadores. Nada temos que nos recomende a Deus; mas a justificação em que podemos insistir agora e sempre, é nossa condição de completo desamparo, o qual torna uma necessidade Seu poder redentor. Renunciando a toda confiança própria, podemos olhar à cruz do Calvário e dizer: “O preço do resgate eu não o tenho; à Tua cruz prostrado me sustenho.”
Os judeus haviam sido instruídos desde a infância, quanto à obra do Messias. Pertenciam-lhes as inspiradas declarações dos patriarcas e profetas, bem como o simbólico ensino do serviço sacrifical. Haviam, porém, desprezado a luz; e agora nada viam em Jesus de desejável. Mas o centurião, nascido no paganismo, educado na idolatria de Roma imperial, instruído como soldado, aparentemente separado da vida espiritual pela educação e o ambiente, e ainda mais excluído pelo fanatismo dos judeus, e pelo desprezo de seus patrícios pelo povo de Israel — esse homem distinguiu a verdade a que eram cegos os filhos de Abraão. Não esperou para ver se os próprios judeus receberiam Aquele que Se dizia o seu Messias. Ao brilhar sobre ele “a luz verdadeira, que alumia a todo o homem que vem ao mundo” (João 1:9), havia, embora afastado, discernido a glória do Filho de Deus.
Para Jesus este foi um penhor da obra que o evangelho havia de realizar entre os gentios. Com alegria, antecipou a reunião de almas de todas as nações ao Seu reino. Com profunda tristeza, descreveu aos judeus o resultado da rejeição de Sua graça por parte deles: “Eu vos digo que muitos virão do Oriente e do Ocidente, e assentar-se-ão à mesa com Abraão, e Isaque, e Jacó, no reino dos Céus; e os filhos do reino serão lançados nas trevas exteriores: ali haverá pranto e ranger de dentes.” Ai! quantos ainda se estão preparando para a mesma fatal decepção! Enquanto almas mergulhadas nas trevas do paganismo Lhe aceitam a graça, quantos há em terras cristãs, sobre os quais a luz resplandece apenas para ser rejeitada!
A uns trinta quilômetros de Cafarnaum, num planalto com vistas sobre a vasta e bela planície de Esdraelom, achava-se a vila de Naim, e para ali dirigiu Jesus em seguida os Seus passos. Muitos dos discípulos e outros se achavam com Ele, e pelo caminho vinha o povo, ansiando ouvir-Lhe palavras de amor e compaixão, trazendo-Lhe os doentes para que os curasse, e sempre com a esperança de que Aquele que empunhava tão assombroso poder Se manifestaria como Rei de Israel. Uma multidão apinhava-se-Lhe em torno, embaraçando-Lhe os passos, e alegre e esperançoso era o cortejo que O seguia pelo pedregoso trilho rumo à porta da cidade montanhesa.
Ao aproximarem-se, veem um cortejo fúnebre que saía da porta. Dirige-se lentamente ao local do enterro. Num esquife aberto, em frente, jaz o morto, e em volta os pranteadores, enchendo os ares de lamentosos gritos. Todo o povo da cidade parecia haver-se ajuntado para manifestar seu respeito pelo morto, e simpatia para com a enlutada família.
Era um espetáculo de molde a despertar a compaixão. O falecido era filho único de sua mãe, e esta uma viúva. A solitária aflita acompanhava à sepultura seu único sustentáculo e conforto terrestre. “Vendo-a, o Senhor moveu-Se de íntima compaixão por ela.” Caminhando a pobre mãe, olhos cegados pelo pranto, sem reparar em Sua presença, Ele Se lhe chegou bem perto, dizendo suavemente: “Não chores”. Lucas 7:13. Cristo estava prestes a transformar-lhe a dor em alegria; não pôde, no entanto, eximir-se a essa expressão de terna simpatia.
“Chegando-Se, tocou o esquife”; nem mesmo o contato com um morto Lhe podia comunicar qualquer contaminação. Os condutores detiveram-se; cessaram as lamentações dos pranteadores. Os dois acompanhamentos reuniram-se em torno do ataúde, esperando contra todas as expectativas. Ali estava Alguém que banira a enfermidade e vencera demônios; estaria também a morte sujeita a Seu poder?
Em voz clara, cheia de autoridade, são proferidas as palavras: “Jovem, eu te mando: Levanta-te”. Lucas 7:14. Aquela voz penetra nos ouvidos do morto. O jovem abre os olhos. Jesus o toma pela mão, e o ergue. Seu olhar pousa naquela que lhe chorava ao lado, e mãe e filho unem-se num longo, estreito, jubiloso abraço. A multidão, silenciosa, contempla a cena, como fascinada. “E de todos se apoderou o temor.” Mudos e reverentes permaneceram por algum tempo, como em presença do próprio Deus. Depois “glorificavam a Deus, dizendo: Um grande profeta se levantou entre nós, e Deus visitou o Seu povo”. A procissão fúnebre volveu a Naim como um cortejo triunfal. “E correu dEle esta fama por toda a Judéia e por toda a terra circunvizinha”. Lucas 7:16, 17.
Aquele que Se achava ao lado da desolada mãe à porta de Naim, vela ao pé de todo enlutado, à beira de um esquife. É tocado de simpatia por nossa dor. Seu coração, que amava e se compadecia, é de imutável ternura. Sua palavra, que chamava os mortos à vida, não é de maneira nenhuma hoje menos eficaz do que ao dirigir-se ao jovem de Naim. Diz Ele: “É-Me dado todo o poder no Céu e na Terra”. Mateus 28:18. Esse poder não diminui pelo espaço dos anos, nem se esgota pela incessante atividade de Sua excessiva graça. A todos quantos creem, continua a ser um Salvador vivo.
Jesus transformou a dor da mãe em alegria, quando lhe devolveu o filho; todavia, o jovem foi simplesmente chamado a esta vida, para lhe suportar as penas, as labutas e perigos, tendo de passar novamente pelo poder da morte. O pesar pelos mortos, porém, Ele conforta com a mensagem de infinita esperança: “Eu sou […] o que vivo e fui morto, mas eis aqui estou vivo para todo o sempre. […] E tenho as chaves da morte e do inferno”. Apocalipse 1:18. “Visto como os filhos participam da carne e do sangue, também Ele participou das mesmas coisas, para que pela morte aniquilasse o que tinha o império da morte, isto é, o diabo; e livrasse todos os que, com medo da morte, estavam por toda a vida sujeitos à servidão”. Hebreus 2:14, 15.
Satanás não pode reter os mortos em seu poder quando o Filho de Deus lhes ordena que vivam. Não pode manter em morte espiritual uma alma que, com fé, recebe a poderosa palavra de Cristo. Deus está dizendo a todos quantos se acham mortos em pecado: “Desperta, tu que dormes, e levanta-te dentre os mortos”. Efésios 5:14. Essa palavra é vida eterna. Como a palavra de Deus, que ordenou ao primeiro homem viver, dá-nos ainda vida; como a de Cristo: “Jovem, eu te mando: Levanta-te”, deu a vida ao jovem de Naim, assim essa frase “Levanta-te dentre os mortos”, é vida para a alma que a recebe. Deus “nos tirou da potestade das trevas e nos transportou para o reino do Filho do Seu amor”. Colossences 1:13. Tudo nos é oferecido em Sua palavra. Se recebemos a palavra, temos a libertação.
E “se o Espírito dAquele que dos mortos ressuscitou a Jesus habita em vós, Aquele que dos mortos ressuscitou a Cristo também vivificará os vossos corpos mortais, pelo Seu Espírito que em vós habita”. Romanos 8:11. “O mesmo Senhor descerá do Céu com alarido, e com voz de arcanjo, e com a trombeta de Deus; e os que morreram em Cristo ressuscitarão primeiro. Depois nós, os que ficarmos vivos, seremos arrebatados juntamente com eles nas nuvens, a encontrar o Senhor nos ares, e assim estaremos sempre com o Senhor”. 1 Tessalonicenses 4:16, 17. Tais são as palavras de conforto com que Ele nos manda consolar-nos uns aos outros.