Lendo Ellen White: Identifique os Princípios Subjacentes – Capítulo 16

Este artigo foi traduzido para o português, a partir do francês Lire Ellen White, por Ruth Mª C. Alencar. Título do original em inglês, Reading Ellen White: How to Understand and Apply Her Writings (Hagerstown, MD: Review and Herald, 1997, escrito pelo pastor George Knight.

Em julho de 1894, Ellen White enviou uma carta à Igreja da sede da Conferência Geral em Battle Creek (Michigan), na qual ela condenava a compra e o uso de bicicletas (Testemunhos ParaIgreja – Vol. 8, 50-53). À primeira vista, pode parecer estranho que tal assunto possa ser considerado por um profeta como muito importante a ponto de ser tratado por ele. Parece bizarro que a questão sobre bicicletas tenha sido objeto de uma visão específica.

Como deveríamos aplicar tal conselho hoje? Significa que os adventistas não devam comprar uma bicicleta? Para responder a estas questões, é preciso examinar o contexto histórico, como recomendamos no capítulo 12. Em 1894, a bicicleta moderna começava a ser fabricada e rapidamente, era moda adquiri-la, não como meio de transporte econômico, mas simplesmente para vaguear, para fazer compras e para se exibir na cidade. À noite, desfiles eram feitos com lanternas japonesas penduradas na bicicleta. Para estar “na moda”, era preciso circular de bicicleta, era a coisa a ser feita para ser alguém na escala social.

Uma citação de um artigo intitulado “Quando o mundo inteiro se põe a circular” nos ajudará a nos situarmos no contexto histórico deste assunto sobre a bicicleta. “No fim do último século, os americanos foram tomados por uma furiosa paixão que lhes tem deixado pouco tempo ou dinheiro para outra coisa. Qual era esta nova grande distração? Para toda resposta, os comerciantes só tinham a olhar pela janela para ver circular seus antigos clientes. A América havia descoberto a bicicleta e cada um empregava da melhor maneira a liberdade que ela oferecia. […] O engenho tornou-se um brinquedo de ricos. A sociedade e as celebridades pedalavam. […]

A melhor das primeiras bicicletas custava 150 dólares, um investimento comparável ao preço de um automóvel hoje. […] Cada membro da família queria uma “roda”, e sempre, a poupança de toda a família era empregada para satisfazer essa demanda.” (Reader’s Digest, dezembro 1951)

J.C. Furnas se exprime no mesmo sentido quando diz que “um dos espetáculos do Garden City, Long Island, no início dos anos 1890, era a elegante senhora Burke-Roche, vestida com seu traje de ciclista cinza e branco, pedalando sobre uma bicicleta prateada. A bicicleta deslumbrante de Lillian Russel no Central Park tinha adereços em ouro.”  (The Americans, p. 810)

À luz do contexto histórico, a declaração de Ellen White, em 1894, com relação à bicicleta, toma um novo tom. “Parece ter, escreve ela, uma loucura da bicicleta. Dinheiro é gasto para satisfazer o entusiasmo nesta direção quando ele teria sido mais bem empregado, muito mais, na construção de lugares de culto onde há grande necessidade. […] Uma influência sedutora parece levar nossa gente como uma onda. […] Satanás age com força induzir os nossos a investir seu tempo e dinheiro para satisfazer supostas necessidades. É uma forma de idolatria. […] Enquanto centenas de pessoas morrem de fome, que a fome  e as epidemias são reconhecidas e sentidas […] os que professam amar e servir a Deus agirão como os que viveram no tempo de Noé, seguindo a imaginação de seus corações? […]

Alguns procuram ser expert na matéria, cada um quer ultrapassar o outro na velocidade da sua bicicleta. Um espírito de competição e de rivalidade os anima para saber quem é o melhor. […] Meu guia me diz: ‘Essas coisas são uma ofensa para Deus. Perto e longe almas perecem por falta do pão da vida e da água da salvação.’ Quando Satanás é abatido sobre uma linha, ele se apronta para colocar em obra outras linhas, outros planos que podem parecer atrativos e necessários, que absorvam o dinheiro e os pensamentos e encorajam o egoísmo, de maneira que ele possa vencer os que se deixam levar facilmente no prazer enganoso e egoísta.

Que fardo, pergunta ela, levam essas pessoas no avanço da obra de Deus? […] Este investimento de recursos e este circular de bicicletas nas ruas de Battle Creek dá testemunho autêntico de vossa fé na última advertência solene que deve ser dada aos seres humanos tão próximos da eternidade?” (Testemunhos Para a Igreja vol.8, pág. 51-52)

Sua recomendação com relação às bicicletas está certamente ultrapassada. Alguns anos mais tarde, a bicicleta tornou-se barata e foi relegada ao domínio dos transportes para os jovens e os desprovidos. A moda transferiu-se para os sucessores a quatro rodas das humildes bicicletas. Após esta transformação social o conselho sobre as bicicletas não têm mais valor prático? Se for verdade que alguns conselhos específicos não são mais aplicáveis, os princípios sobre os quais esses conselhos repousam permanecem válidos no tempo e no espaço.

Quais são alguns desses princípios? Primeiramente, que os cristãos não deveriam gastar dinheiro para prazeres egoístas. Segundo, os cristãos não devem procurar ultrapassar uns aos outros fazendo coisas que desenvolvem um espírito de luta e de competição. Terceiro, que os cristãos deveriam dar prioridade ao reino de Deus e à ajuda que eles podem trazer aos outros no período presente da história. E quarto, que Satanás terá sempre um plano para conduzir os cristãos no domínio das satisfações egoístas.

Esses princípios são imutáveis. Eles se aplicam em todos os lugares e a toda época da história. As bicicletas eram o ponto de contato entre os princípios e a situação humana em Battle Creek, em 1894. As particularidades do lugar e do tempo mudam, mas os princípios universais permanecem.

Nossa responsabilidade, como cristãos, não é somente de tomar consciência dos conselhos que Deus nos dá, mas de aplicá-los fielmente à nossa vida pessoal. Nossa primeira missão é então procurar os princípios da vida cristã através do estudo da Bíblia e dos escritos de Ellen White conduzida pelo Espírito.

Nossa segunda missão é de levar os princípios descobertos para nossa vida e o nosso contexto social. Para isto, precisamos da compreensão da situação histórica que está na origem dos conselhos. Esta compreensão nos tornará capazes de fazer a diferença entre os princípios universais subjacentes às declarações inspiradas e as particularidades relativas a um problema, a uma época da história e de um certo lugar.

Terceiro, devemos compreender a situação presente à qual iremos aplicar os princípios universais. Somente com tal compreensão poderemos de forma inteligente colocá-los em prática em nossa vida cotidiana, nas escolas, nas igrejas e na sociedade.

A aplicação não deve ser feita sem inteligência. A compreensão dos princípios implica o emprego da razão e do bom senso, como já vimos. Temos todos que encarar um problema importante. Este do equilíbrio entre a fé nos documentos inspirados e a razão que Deus nos deu.

Uma posição extrema é confiar cegamente na autoridade profética (abordagem para resolver um problema com base em uma citação). A outra posição é contar com o raciocínio de uma maneira corruptora para racionalizar e justificar aquilo que queria fazer de qualquer maneira. Os conselhos inspirados devem sempre conduzir nosso raciocínio. Por outro lado, devemos sempre tomar e aplicar a verdade contida nesses conselhos com a ajuda da nossa razão.

Confiar somente nos escritos inspirados, ou numa compreensão racional, é um erro fatal. A revelação que tem autoridade e a razão santificada estão associadas juntas, mão a mão, quando buscamos compreender Deus e colocar Sua sabedoria em prática em nossas vidas diárias. Deus nos deu o poder da razão e Ele espera que o empreguemos para Sua glória. (Isaías 1:18; Êxodo 20). Os conselhos inspirados fornecem os princípios de base que situam os limites e dão a direção ao nosso pensamento, enquanto que o pensamento nos torna capazes de aplicar esses conselhos à nossa situação única e sempre nova. A vida cristã é uma experiência dinâmica ligada de maneira inseparável ao bom senso, na qual cada um pensa e age segundo sua própria ideia.

O cristianismo é, portanto, uma empreitada moral na qual os indivíduos são responsáveis aos olhos de Deus. A rigidez e inflexibilidade do pensamento e da ação são os opostos de um cristianismo vivo. A missão do cristão é de procurar as revelações de Deus para colocá-las em prática na vida cotidiana, sem fazer violência à intenção dos princípios fundamentais. Isto exige uma consagração pessoal assim como uma sensibilidade conduzida pelo Espírito.

Foi com comunhão com o Espírito vivo que Ellen White White viveu e procurou conduzir a Igreja adventista. Jesus, por sua muita flexibilidade, esteve em condições de encontrar todas as categorias de pessoas. Ele ilustra esta mesma verdade. Sua vida e Seus ensinos, que se acomodavam em todas as circunstâncias, eram fundamentados nos princípios.  Eles explodiram conceitos velhos dos fariseus.

Poderíamos acrescentar que o sermão na montanha é um excelente exemplo das idéias avançadas neste capítulo. Em cada uma das seis ilustrações no final de Mateus 5, Jesus procura conduzir seus auditores ao coração do princípio da lei para que eles o aplicassem em suas próprias vidas.

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