transcrição Roger William Cabral
Este texto é uma transcrição adaptada para o blog Nossas Letras, porém em sua estrutura está fielmente com as palavras de seu autor.
“Vamos ler as Escrituras Sagradas no evangelho segundo São Mateus no capítulo 23:15 :
“Ai de vocês, mestres da Lei e fariseus hipócritas, porque percorrem terra e mar para fazer um prosélito e quando conseguem vocês o tornam duas vezes mais filho do inferno do que vocês. Ai de vocês, mestres da Lei e fariseus hipócritas, porque percorrem terra e mar para fazer um prosélito e quando conseguem, vocês o tornam duas vezes mais um filho do inferno do que vocês.”
Prosélito é quem muda de religião. Discípulo de Jesus é quem muda de vida. Prosélito vai para o inferno. Discípulo de Jesus é quem tem esperança de vida eterna.
Prosélito é filho do inferno duas vezes porque seguia a mentira e se converteu a outra mentira e agora já não considera mais a possibilidade de estar perdido. Mas está perdido duas vezes. Se você é do tipo de pessoa que lê a bíblia sagrada contra os outros, você vai considerar que esse texto oportuniza uma crítica à experiência religiosa alheia.
Mas, se você é do tipo de pessoa que lê a Bíblia Sagrada a seu favor você imediatamente se questiona: será que eu sou um prosélito ou eu sou um discípulo de Jesus? Será que eu tenho uma religião ou eu realmente tenho uma experiência espiritual com Jesus de Nazaré, Cristo de Deus? Será que eu sou um discípulo de Jesus ou eu sou um sujeito, uma mulher aculturada, aculturado à cristandade.
Eu me fiz essas perguntas e escrevi para mim mesmo e compartilho com você na esperança que lhe seja útil. Um gabarito mínimo para estabelecer a diferença entre um prosélito, alguém que simplesmente tem uma religião, e um discípulo, uma discípula, um seguidor, uma seguidora de Jesus Cristo.
Primeiro, um discípulo de Jesus Cristo, uma discípula de Jesus Cristo, tem uma consciência profunda da distância que os separa de Deus. Quem tem uma experiência pessoal com Jesus de Nazaré, ou uma experiência pessoal com Deus adquire uma consciência profunda de sua distância em relação a esse Deus.
Em termos teológicos e filosóficos, essa distância é definida como distância ontológica. Distância de natureza de ser, de qualidade de ser. Não é distância moral do tipo Deus jamais mente, nós mentimos de vez em quando. Deus ama a todos igualmente, nós amamos alguns de modo especial. Deus é cheio de bondade, compaixão e misericórdia, nós sabemos o que é, de vez em quando, um desejo de vingança. Deus perdoa e nós guardamos mágoas e ressentimentos. Isso quer dizer distanciamento moral.
Mas, quando falamos em distanciamento ontológico nós estamos fazendo referência voltando a nossa leitura de Romanos, a carta de Paulo aos Romanos. Quando conversamos a respeito da distância entre o homem em Adão e o homem no Cristo ressurreto, que é a distância entre um bonequinho de pano e um ser humano de verdade. Então, vamos trocar um pouco essa figura e vamos incluir um chimpanzé (pecador*). Distância ontológica é o que separa um chimpanzé de um ser humano. E quando nós temos uma experiência com Deus a partir de Jesus, nós adquirimos essa consciência de que não passamos de chimpanzés (pecador*). Chimpanzés são um pouco qualificados, mas são chimpanzés.
Chimpanzé é um religioso que decorou um credo. Religioso é um chimpanzé que aprendeu a ascender vela. Religioso é um chimpanzé que aprendeu a cantar no coral. Religioso é um chimpanzé que prega nas igrejas evangélicas aos domingos. Nossos templos estão cheios de chimpanzés. Pregadores chimpanzés… Deus me guarde e me perdoe se eu for um deles.
Mas essa distância é a distância que experimentou Isaías, no templo, quando no capítulo 6, no registro de sua profecia nos é dito que o templo se encheu de glória e Isaías caiu ao chão e disse: ‘ai de mim que vou perecer, vou morrer’ ou ‘ai de mim que vou perecendo, porque sou um homem de lábios impuros e que habito no meio de um povo de impuros lábios’, ou então Pedro, quando ele está num barco e Jesus está ensinando. O Pedro vai ouvindo aquele Jesus falando e as palavras e Jesus vão penetrando em sua consciência e no seu coração e num determinado momento as palavras de Jesus são transformadas no sopro do Espírito Santo em Palavra de Deus e o Pedro cai no chão e diz assim: ‘ai de mim, afasta-te de mim porque sou pecador’ (Lucas 5:8). O que ele está dizendo é que há uma distância entre nós. Essa distância, como entendemos hoje, eu não sei se foi isso que o Pedro entendeu ali, mas talvez tenha sido. A distancia que Isaías entendeu ali na sua experiência, mas talvez tenha sido. Essa distância é uma distância ontológica.
É uma distância que diz assim: ‘olha você é bom e eu sou mal’. Porque quando alguém interpelou Jesus e o chamou de bom mestre, Rabi, Nicodemos falou bom mestre, Cristo disse: ‘por que me chama de bom? Bom é só um, o Pai celestial.
Nós seres humanos conhecemos o mal. O mal habita em nós. Não apenas a possibilidade da maldade mas vivemos a condição da maldade. É como diz Paulo ‘bem algum habita minha carne’. Então o pecado habita em mim.
Pedro diz assim: ‘afasta de mim porque sou pecador. Você não é, mas eu sou’. Quando Jesus diz: ‘bom é só um e você me chama bom ou você está admitindo que Eu e o Pai somos um, ou você não deveria estar me chamando de bom, porque bom é só o Pai Celestial.
Nós humanos caímos de joelhos diante de Deus e dizemos assim: tem misericórdia de nós. Enquanto nós não adquirimos essa experiência de distanciamento nos tornamos como uma mosca que acredita que pode voar em direção ao sol. Somos moscas que já descobrimos que se entrássemos na presença de Deus nós dissolveríamos.
Nós somos pó. Pó que decorou versículo. Pó que dá o dízimo. Pó que canta louvores a Deus mas nós somos pó. É o que diz o salmista: ‘Deus sabe da minha estrutura, sabe que sou pó’ – Salmo 103.
Quem não chega diante de Deus com essa perspectiva de um ser que não sabe nada é um religioso, é um prosélito. Mudou de religião mas não adquiriu uma profunda consciência de de si mesmo.
Segundo, um discípulo de Jesus, uma discípula de Jesus, um seguidor de Jesus, uma seguidora de Jesus, alguém que teve uma experiência pessoal com Deus a partir de Jesus Cristo, traz a sua vivência de Deus e a sua vivência humana para a profundidade da subjetividade. Isto é, sai da armadilha de um gabarito objetivo para a sua própria avaliação ou auto- avaliação.
Isto é, sabe que o mal é alguma coisa que está para além do comportamento moral e não se ilude com o seu bom comportamento moral. Nem com o seu e nem com o de ninguém. Porque sabem que essa questão do mal não é o que eu faço ou que eu deixo de fazer. Não é o que eu toco ou deixo de tocar, o que eu como ou deixo de comer. O lugar que eu vou ou deixo de ir, a música que eu escuto ou a música que eu deixo de escutar. […]
Eu não frequento ‘os lugares do mundo’… essa é a régua moral, é a avaliação objetiva, dá para medir, isso é o espírito da lei de Moisés,” […] – é legalismo!
Então, “vem Jesus e diz assim: ‘ ouvistes o que foi dito, eu vos digo, porém, se você não matou, mas tem ódio é o mesmo que matar. Se você não adulterou; mas você olha com olhar impuro na perspectiva da lascívia, da luxúria, da posse do outro, você adulterou.
Então, quem houve Jesus falar, ouve Jesus dizendo: ‘por que vocês criticam meus discípulos porque eles comem sem lavar as mãos?’ O problema não é o que entra pela boca, é o que sai da boca. Sai lá da profundidade do ser. Os discípulos de Jesus entendem isso. Eles sabem disso! Os discípulos de Jesus ouvem Jesus: ‘Vocês, líderes religiosos e fariseus, são um caso perdido. Impostores! Mantêm registros contábeis meticulosos, dão dízimo de cada centavo que ganham, mas, no essencial da Lei de Deus, coisas como justiça, compaixão e compromisso — absolutamente básicas! —vocês deixam de lado, sem nenhum remorso. A atitude cuidadosa tem o seu valor, mas o essencial é indispensável. Vocês não imaginam quão tolos parecem, escrevendo uma história de vida equivocada do princípio ao fim, nessa preocupação com pontos e vírgulas?
Vocês, líderes religiosos e fariseus, são um caso perdido. Impostores! Vocês dão polimento ao exterior de suas taças e vasilhas, para que possam brilhar ao sol, enquanto o interior está sujo com sua cobiça e glutonaria. Fariseus tolos! Esfreguem o interior, e, então, o exterior brilhante fará algum sentido.
Vocês, líderes religiosos e fariseus, são um caso perdido. Impostores! Vocês são como as lápides das sepulturas: bem feitas, grama aparada e flores à volta, mas sete palmos abaixo o que existe são ossos podres e carne comida por vermes. Para quem olha, vocês parecem santos, mas, por baixo desse verniz, são uma fraude.
Vocês, líderes religiosos e fariseus, são um caso perdido. Impostores! Vocês constroem túmulos de granito para os profetas e monumentos de mármore para os santos. Dizem que, se tivessem vivido no tempo dos seus antepassados, não teriam sangue nas mãos. Conversa! Vocês e aqueles assassinos são farinha do mesmo saco, e cada dia acrescentam homicídios à sua ficha criminal.
Serpentes! Répteis traiçoeiros! Pensam que vão ficar sem castigo? Acham que vão sair sem pagar? É por causa de pessoas como vocês que envio profetas, guias sábios e mestres, geração após geração — e geração após geração vocês os tratam como lixo, incitando linchamentos e abusos contra eles.” (Bíblia Mensagem Mateus 23)
[…] Jamais um discípulo de Jesus oraria como orou o fariseu: ‘Obrigado Senhor porque não sou como os demais homens’ porque ele se conhece por dentro e ele inclui na sua vivência espiritual essas lições e noções de subjetividade. E quando inclui essas dimensões da subjetividade, ele sabe que é devedor.
Portanto, uma pessoa que tem uma experiência com Deus, a partir de Jesus, ela se liberta dos limites estabelecidos pela religião organizada. Ela explode as paredes da religião organizada, institucionalizada […]. Levar o evangelho TODO para o homem TODO é a nossa missão. Priorizando relacionamentos envolvendo todos os frequentadores além dos limites do culto, do clero, do domingo” [como adventista eu diria, do sábado] “e do templo. […] “
Nossas igrejas têm paredes, ‘mas nossa mente e nosso coração não têm paredes. Jesus, quando fala dos fariseus hipócritas e mestres da lei, Ele não apenas está criticando esse grupo específico de religiosos. Ele está criticando uma mentalidade, essa mentalidade que acredita que quando se cumpre as obrigações estabelecidas pela sua norma objetiva da sua religião está quite com Deus.
O seguidor de Jesus sabe que não, que não há vivência religiosa que possa conter a grandeza do amor de Deus e que possa estancar o potencial da maldade humana. Porque o apóstolo Paulo fala disso aos colossenses dizendo que os religiosos observam as festas, as luas, fazem as suas liturgias, os ritos e estas coisas tem aparência de piedade mas não têm poder para promover a transformação de dentro para fora. Quem tem uma experiência com Deus sabe que importa buscar o reino de Deus, e, antes e acima de todas as coisas, isso significa buscar que a vontade de Deus seja feita na terra como no céu, em todo lugar, a toda hora, em todas as relações e em tudo que é feito.
Os fariseus e religiosos do tempo de Jesus acreditavam que se fossem ao templo nos sábados, se levassem seu sacrifício e o entregassem ao sacerdote, se participassem ali da liturgia sacrificial; voltariam para suas vidas. Uma vida mesquinha, uma vida promíscua, uma vida alienada de Deus, ou uma vida displicente, simplesmente displicente porque garantiam sua relação com Deus a partir da sua rotina sacrificialista do sábado, do templo, do sacerdote e do animal sacrificado.
Mas não, nós sabemos que tudo o que fazemos, seja comer, seja beber, seja qualquer outra coisa a fazer que seja para a glória de Deus.
Ontem a noite estávamos discutindo espiritualidade para um mundo sustentável e um irmão disse assim: ‘Pastor, não seria melhor a gente fazer discipulado, em vez de ficar cuidando do meio ambiente?’
Isso é pergunta de prosélito.
O que esse irmão está sugerindo? Não seria melhor nós fazermos convertidos em vez de cuidar do meio ambiente? Então eu fico tentando entender o que ele quis dizer; é a velha máxima do protestantismo histórico tradicional – ‘converta-se o indivíduo e a sociedade se transformará’. Mentira! Isso é uma mentira.
Isso não tem se mostrado verdadeiro no nosso país, por exemplo. O índice de pessoas convertidas no Brasil se multiplica. Os evangélicos crescem assustadoramente no Brasil.” Como dizia “[…] nosso irmão Dom Robson Cavalcanti: ‘Brasil tem duas coisas que proliferam: crente e delinquente.
A pergunta do prosélito é ‘não seria melhor que todo mundo fosse crente?. Seria? Você acha que todo mundo que é crente tem consciência? Sabe viver? Não sabe, e sabe porque não sabe? Porque confundimos discipulado com proselitismo. Discipulado com ensino de religião, e não ensino de vida. Discipular é ensinar a viver e não ensinar Gálatas 2. Não é ensinar doutrina da santificação. Não é ter uma apostila para ensinar justificação, santificação, glorificação, redenção. […]”
Não vai haver um anjo fazendo chamada oral sobre apologética ou soteriologia na entrada do céu.
“Não é melhor a gente fazer discipulado do que cuidar do meio ambiente? E o que é discipulado gente? Discipulado é ensinar como cuidar da terra, da água. Fazer discípulo é ensinar como uma família vive se o pai é alcoólatra. Fazer discipulado é ensinar como a gente gasta dinheiro. É ensinar como a gente ganha dinheiro! Fazer discipulado é ensinar como a gente faz negócio! Fazer discipulado é ensinar como a gente cuida do Mico Leão Dourado! Fazer discipulado é ensinar como a gente cuida da depressão.
Fazer discipulado é ensinar como é que a gente vive e não como a gente se comporta dentro de uma religião.
Então, um seguidor de Jesus sabe que a sua vivência de Deus extrapola todos os limites de sua religiosidade organizada. Vai pra vida! E quando vai pra vida, ali os grandes desafios da sua espiritualidade afloram. Porque os desafios da espiritualidade não afloram no púlpito, no coral, na banda, ali na classe com as crianças.’ Na igreja, ‘estamos no ambiente religioso protegido. Todos mascarados! Todos com um comportamento padronizado pela nossa tradição religiosa’. Afloram ‘quando a gente cai na vida na segunda- feira, no anonimato da segunda-feira. Quando a gente cai no mundo na segunda-feira, isto é, quando a gente desce do vale… quando a gente desce do monte para o vale aí é que as coisas começam a acontecer de verdade.
Então um seguidor de Jesus sabe que isso aqui é bom, isso aqui é útil, mas andar com Deus extrapola tudo isto. E quando chega lá fora, o seguidor de Jesus vive um conflito constante com a sua dimensão de chimpanzé. Porque quando a gente quer realmente viver com Deus e andar com Jesus, nos passos de Jesus, como seguidor de Jesus, a gente vai se deparando o tempo inteiro com o chimpanzé que habita em nós. O seguidor de Jesus tem uma profunda consciência de que é um chimpanzé. E ele adquire essa consciência à medida que ele mergulha para dentro dele mesmo e traz toda a sua dimensão de subjetividade para sua experiência de vida. E ele descobre que essa subjetividade que se derrama na vida não é contida, não cabe nem na sua dimensão positiva, nem na negativa no espaço religioso.
E aí quando ele está na vida, derramado na vida com tudo isto, ele não se conforma de ainda ser um pecador*. Porque todo o tempo ele vai descobrindo um pecador*. Ele vai sendo tocado e a sua ira vai sendo despertada, a sua mágoa, o seu ressentimento, o seu egoísmo, a sua incapacidade de perdoar, a sua falta de compaixão, o seu distanciamento do próximo, a sua irresponsabilidade, a sua competitividade, a sua disposição em pegar atalhos, a sua inclinação em fazer o mal, a sua convivência com as possibilidades do que a gente chama de pecados, dos prazeres ilícitos, das relações conflitantes… então, na hora que a gente se vê agindo ainda como um chimpanzé […] a gente pensa que pensava ter superado isso, mas na verdade não conseguimos.
Quando saio do comportamento padronizado da minha vida religiosa eu me deparo com um chimpanzé e não me conformo com isso.
Porque o macaco que se conforma em ser macaco, podendo ser humano não foi alcançado pelo Cristo ressurreto. Nós os seguidores de Jesus nós fomos ganhos por uma utopia. Ele nos disse que nós poderíamos ser mais do que aquilo que nós somos. Ele nos disse que poderíamos nos relacionar com as outras pessoas de maneira diferente da que nos relacionamos. Ele nos disse que poderíamos nos livrar dos pesos de nossa alma que ainda carregamos. Ele nos disse que poderíamos ser curados de doenças e de feridas que nos dilaceram por dentro. E nós ainda não fomos curados e nós não nos conformamos com isso. Por que ?Porque Ele disse que era possível!
Ele disse para nós: ‘Tenham bom ânimo, Eu venci o mundo então vocês vão vencer. Então, quando a gente perde a gente cai de joelhos e grita pra Deus: ‘Senhor não é possível! Mata esse maldito pecador* em mim! Nós não somos conformados. Não somos satisfeitos.
O religioso é que diz: ‘Senhor graças te dou’, mas nós não! Nós dizemos assim: ‘Tem misericórdia de mim, Senhor’.
Pense! Um é o pecador que diz: ‘Senhor, tem misericórdia de mim’, o outro é o pecador religioso hipócrita que diz: Senhor, eu Te agradeço porque não sou como os demais pecadores*! Senhor, eu sei os versículos, eu canto louvores. Senhor, eu sou um pecador* dizimista.”
Não sejamos um religioso hipócrita “[…] diante do Cristo ressurreto devemos dizer assim: – ‘Senhor é isso que eu quero ser. Eu não me conformo com quem eu sou. Eu não me conformo por não superar as minhas limitações. Senhor eu quero ser como o Senhor quer que eu seja.’
Os discípulos pediram para Jesus: – ‘Senhor, ensina a gente a orar. A gente Te vê orando e queremos orar igual, como é que faz?’ […] Senhor, queremos beber de Teu cálice, queremos sentar a Tua direita e a Tua esquerda no Teu reino’.
Então, Jesus diz: – ‘Vocês nem sabem o que vocês estão pedindo’.
– “Ah, a gente não sabe, mas se for com o Senhor nós queremos’.
– ‘Queremos isso aí, isso aí que o Senhor é, essa intimidade que o Senhor tem com o Pai, é isso que queremos’.
Quem tem uma experiência com Jesus não se contenta com o que é, por isso sabemos a diferença que faz a graça de Deus. Religioso não entende a graça. Não entende! A graça de Deus é o princípio do evangelho mais difícil de ser assimilado porque nós ainda carregamos medo e culpa apesar da graça. Porque nós ainda desconfiamos de um discurso que fala muito da graça de Deus é um discurso perigoso que promove a libertinagem e a licenciosidade.
Não entendemos a graça porque ela fere todo nosso senso de justiça, e nós queremos viver baseados na justiça. A graça humilha nossas vontades.
[…] Se eu estou andando com Deus há vinte anos e chego na igreja para clamar ‘tem misericórdia de mim porque eu sou pecador’, duvido que não haja alguém olhando para mim e pensando ‘ainda?’. – ‘Você não é pastor? Você não está na igreja já faz 40 anos?’.
A gente acha que em algum determinado momento das nossas vidas passamos a viver dos méritos. Dos nossos méritos. Das nossas vitórias. Das nossas conquistas.
Não. A verdade é que sempre viveremos da graça de Deus. Porque também é verdadeiro o ditado que diz que quanto mais perto da luz nós estamos, mais nós vemos a sujeira. […] Quando estamos andando com Deus, percebemos que progredimos, mas Deus sempre abre uma nova porta e a cada porta que vou entrando aprofundo dentro de mim mesmo esse encontro e cada vez mais longe de mim mais próximo dEle.
A graça é escandalosa porque fere o nosso senso de justiça. E porque fere o nosso senso de justiça nós estamos impedidos de julgar os outros. Lembre-se, os religiosos julgam os outros olhando as pessoas de cima para baixo. As pessoas que têm uma experiência real com Deus não se comparam com os outros. Elas estão diante de Deus e não diante dos outros.
A graça fere nosso senso de justiça porque Cristo diz assim: – ‘Olha, o sujeito que trabalhou só as 17 horas vai receber a mesma coisa que o sujeito que começou à trabalhar às 8 da manhã’.
E falamos: – ‘Meu Deus! Isso não é justo!’.
E Deus diria pra nós: – ‘Mas aqui está falando em justiça? Você quer um mundo justo? Quer que eu dê para todo mundo o que todo mundo merece? É isso?’.
E Deus diria pra nós: – ‘Mas aqui está falando em justiça? Você quer um mundo justo? Quer que eu dê para todo mundo o que todo mundo merece? É isso?’.
[…] Na pergunta de Asafe para Deus, registrada no Salmo 73: ‘Por que prospera o ímpio?’, provavelmente Jesus conversasse com Asafe e responderia a pergunta com outra pergunta. Jesus provavelmente perguntaria ‘você não leu que meu Pai faz nascer o sol sobre justos e injustos? Dá a vida para justos e injustos’.
– ‘Ah, Senhor! Mas isso não é justo!’.
– ‘Mas aqui está falando de justiça? A gente está falando da graça!”.
A graça aos nossos olhos é aleatória e incontrolável. Porque você não nasceu escravo muitos anos atrás? Porque você não nasceu na periferia da periferia do Piaui? E não morreu com dois anos de idade? Por que não? Você sabe? Não sabe e eu também não sei.
Portanto quando somos impactados pela graça de Deus caímos de joelhos, humilhados e agradecidos. Nos constrangemos por sermos abençoados. Constrangemo-nos de receber tanto de Deus. […] É claro que você sofre. Todo mundo sofre. Acontece que tem gente que sofre de carro e tem gente que sofre de busão. Tem gente que sofre tendo a mesa farta e tem gente que sofre passando fome. Tem gente que sofre tendo mestrado e doutorado e tem gente que sofre sem nunca ter aprendido a ler e a escrever. Todo mundo sofre e sofre igual a você.
Tem gente que sofre como você e tem gente que sofre como a população de Calcutá. Como uma população das periferias das nossas cidades. Todo mundo sofre, mas nem todo mundo tem filho de 7 anos morto por bala perdida!
Convenhamos, um terremoto no Haiti faz muita gente sofrer. A raça humana sofre, mas o sofrimento dos haitianos foi maior porque se trata de uma população pobre.
Uma pessoa que tem uma experiência real com Deus a partir de Jesus Cristo sabe que vive no limite das suas impossibilidades e por isso vive de joelhos. Ouviu a palavra de Cristo dizendo que sem Ele não podemos fazer nada. Ouviu Jesus dizendo que receberia outro Consolador.
Esta fala de Jesus de João 14 é muito especial porque traz para nós o sentido de que seremos encorajados no momento do sofrimento. Traz também o sentido real da palavra Consolador. Consolado é aquele que se coloca ‘ao lado de’. Então, Ele não está ao nosso lado somente nos momentos de dificuldades ou de sofrimento, mas também no momento da superação, do desafio, da tentação. No momento de tornar-se o que Deus quer que sejamos.
E Jesus disse assim: ‘enquanto eu estiver com vocês estarei ao lado de vocês. Estarei levando vocês na direção que Deus quer levar vocês. Estou indo embora, mas vou enviar o Espírito Santo. Ele veio para fazer aquilo que eu estava fazendo.
E agora esperamos em Jerusalém até que do alto sejamos revestidos do poder do Espírito Santo para que nos tornemos aquilo que Deus quer que sejamos. Não somos, então caímos de joelho e damos graças a Deus. Por isso, vivemos sempre de joelhos.
O religioso não ajoelha. Não precisa! Está satisfeito. Ele tem créditos Ele tem méritos. Ele já descobriu a verdade. Ele tem uma régua muito fininha e muito superficial para avaliar a si mesmo. Ele olha para Deus dentro de uma moldura religiosa e esse deus é um bonequinho manipulado.
Agora nós que temos uma experiência com Deus, que Ele nos permita e que queira que estejamos incluídos nesse ‘nós’. Então, somos diferentes, vivemos de joelhos. Sempre diante da graça de Deus. Sempre inconformados com o que somos, sempre aspirando aquilo que Deus quer que sejamos e o que Ele tem para nos dar. Não contidos nessa estrutura religiosa, tenhamos uma consciência profunda de que somos o que somos e que pela graça de Deus estamos destinados a ser o que o Cristo Ressurreto é.
Nós vivemos o paradoxo da profunda agonia e desespero. Mas também, da profunda consolação da graça de Deus e do estímulo da graça de Deus para que abandonemos as coisas que para trás devem ficar e prossigamos para o alvo, a nossa conformação à imagem de Jesus Cristo, Nosso Senhor.
Que o Espírito Santo de Deus nos visite no mais íntimo da nossa consciência e que Ele revele a cada um de nós as dimensões e as categorias interiores de uma mentalidade de prosélito religioso. Que o Espírito de Deus nos visite e nos ajude a tirar as máscaras da hipocrisia religiosa e que sejamos de fato seguidores de Jesus, de Nazaré, Nosso Senhor. Que o Espírito Santo de Deus nos transforme de dentro para fora para que não sejamos filhos do inferno e nem estejamos a multiplicar filhos do inferno duas vezes piores que nós. Que a nossa experiência espiritual seja uma experiência de vida que só Deus pode dar.”
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– * substituímos a expressão ‘chimpanzé’ usada pelo autor pela palavra ‘pecador’.