Comentário de Siegfried J. Schwantes
Este capítulo constitui o prólogo à última profecia do livro. A profecia propriamente dita começa com 11:2 e termina com 12:4, o resto do cap.12 sendo uma espécie de espírito. Nestes capítulos nos é dada uma visão única do conflito que se desenrola nos bastidores da história. Vêm-se ai o jogo e o contra jogo de influência que operam nos centros de poder político para impedir ou promover a execução dos planos divinos. Embora a liberdade do homem como agente moral seja resguardada, influências diabólicas e celestes se fazem sentir sobre os líderes deste mundo, na esperança de levá-los a se opor ou a favorecer a missão do povo de Deus na Terra.
A visão é datada do terceiro ano de Ciro, rei da Pérsia, ou seja 536/535 A.C. Em contraste com as visões precedentes, nesta o profeta não vê, mas ouve o conteúdo da revelação que lhe é feita. A visão ou “palavra” envolvia um grande conflito, a matéria do qual não é comunicada ao profeta até 11:2. Como esta visão não envolvia imagens simbólicas o profeta não teve dificuldade em compreendê-la.
Versos 2 e 3 Esta visão foi dada a Daniel depois de três semana de penitência e preparação espiritual. O pranto e o jejum coincidiram com o tempo da Páscoa, mas nenhuma associação é feita entre uma cousa e outra. Embora tivesse mais de oitenta anos por esta época, Daniel buscava a comunhão com Deus com o mesmo fervor que em sua juventude. Milhares de judeus, podemos imaginar, estavam voltando para sua terra como resultado do decreto favorável de Ciro, mas o fruto do propósito de Deus para Seu povo parecia ainda incerto.
Verso 4 A borda do rio Tigre é designada como o local da visão. Por comparação com os rios da Palestina, o Tigre podia ser chamado um grande rio.
Versos 5 e 6 A descrição do vulto celeste que aparece a Daniel corresponde bem de perto à de Cristo quando apareceu a João na ilha de Patmos; “um semelhante a filho de homem, com vestes talares, e cingido à altura do peito com uma cinta de ouro, como chama de fogo; os pés semelhantes ao bronze polido, como que refinado numa fornalha; a voz de muitas águas” (Apocalipse 1:13-15). É razoável supor que como recompensa à sua vida de devoção a Deus Daniel recebeu em sua velhice uma visão do Cristo exaltado.
Como os homens que acompanharam a Paulo em sua jornada a Damasco, os companheiros de Daniel não viram, mas foram aterrorizados pela atmosfera misteriosa da ocasião. “Caiu sobre eles grande temor”.
Versos 8 e 9 Daniel mesmo ficou assoberbado por “esta grande visão”. Deve-se distinguir entre esta visão de um ser celeste que chocou Daniel até o mais profundo de sua alma da visão também chamada “palavra”, que é descrita nos versos 11:2 a 12:4. E de novo a visão de Paulo no caminho a Damasco, esta também incluía não só a aparição deslumbrante, mas uma voz “como o estrondo de muita gente”. Ouvindo-a Daniel cai por terra “em profundo sono”.
Verso 10 Daniel é despertado pelo toque da mão de um anjo. De igual modo Isaías, no meio de uma visão, sentiu-se a forte mão de Deus sobre ele (Isaías 8:11). Ezequiel e João tiveram a mesma experiência (Ezequiel 2:2; 3:24 e Apocalipse 3:17).
Verso 11 Como objeto do amor terno de Deus Daniel nada tinha a temer. Suas preocupações também são as preocupações de Deus. É lhe dito que se levantasse e ouvisse as palavras que lhe iam ser comunicadas. A expressão, “eis que te sou enviado“, parecem mais apropriadas nos lábios de um anjo do que nos de Cristo. Tudo indica que a visão de Cristo termina com o v.9, e que o restantes do capítulo contém as palavras de um anjo.
Verso 12 O anjo continua assegurando a Daniel que suas preces foram ouvidas. Seu desejo de melhor compreender o propósito de Deus era motivado por um genuíno amor para com seu povo, e a Deus aprazia responder-lhe. Não foi uma curiosidade vã que o levara a se humilhar diante de Deus em profunda contrição durante três semanas. A oração e o jejum o tinham predisposto a ouvir a voz do Espírito e a se tornar o recipiente de uma nova revelação.
Verso 13 “O príncipe do reino da Pérsia”. “Príncipe” é a tradução do hebraico sar, que pode se referir a um governador ou ao comandante de um exército, como em Josué, mas raramente a um rei. O rei em hebraico jamais é designado por “príncipe do reino”. Daniel usa várias vezes esta palavra com referência a seres sobrenaturais (8:11,25; 10:21 e 12:1). É provável que o termo sar aqui denote ser sobrenatural que no momento estava resistindo aos anjos de Deus na corte do rei da Pérsia. Joyce Baldwin num comentário recente adota esta interpretação: “Visa-se aqui um representante da Pérsia nos lugares celestes; a Grécia também teu seu anjo (v.20), e Miguel, ‘um dos primeiros príncipes’, pertence a Israel”1.
A demora em atingir o objetivo visado na corte da Pérsia sugere que neste conflito espiritual a liberdade humana não é violada. É feito uso da persuasão para obter a mudança desejada, mas não constrangimento físico. Escritores do Novo Testamento identificam Miguel com Cristo (ver Judas 9; João 5:28, 29 e I Tessalonicenses 4:16). O Comentário Bíblico Adventista favorece esta opinião: “O nome Miguel aparece na Bíblia apenas em passagens apocalíptica (Daniel 10:13 e 21; 12:1; Judas 9; Apocalipse 12:7). Além disto é em ocasiões em que Cristo está em confronto direto com Satanás. O nome que em hebraico significa, “Quem É como DEUS?” é ao mesmo tempo uma pergunta e um desafio. Em vista do fato que a rebelião de Satanás é essencialmente uma tentativa de instalar-se no trono de DEUS e ser “como o Altíssimo” (Isaías 14:14), o nome Miguel é muito apropriado para Aquele que empreendeu vindicar o caráter de DEUS e refutar as pretensões de Satanás.2
Somente quando Miguel veio para ajudar Gabriel é que este ficou livre para vir a Daniel a fim de fazê-lo entender o que havia de suceder a seu povo nos últimos dias (v.14). O cuidado de DEUS para com Seu povo em todas as épocas é o fio duradouro que deve guiar o estudante através da massa de pormenores históricos dados com cap. 11. Acontecimentos históricos podem servir de pontos de referência, mas a questão realmente significativa é a sorte do povo de DEUS em meio do tumulto político que agita o mundo.
Versos 15 a 17 Perplexo diante desta visão celeste, Daniel ficou mudo. Somente quando um anjo em forma humana tocou seus lábios é que ele recuperou a fala. Mesmo assim as primeiras palavras de Daniel continuam a expressar seu sentimento de desamparo. Sente-se como se fosse desfalecer na presença sobrenatural.
Versos 18 e 19 De novo um anjo toca a Daniel a fim de fortalecê-lo com a certeza do amor de DEUS, o qual devia banir todo temor de seu coração. Fortalecido, Daniel pede ao anjo que lhe comunique a mensagem divina.
Verso 20 O anjo fá-lo saber que o conflito na corte da Pérsia sobre a sorte do povo de DEUS ainda perdurava. O inimigo não dorme e aproveita toda oportunidade para frustrar os planos divinos. E necessário, portanto, que influências celestes continuem a neutralizar os planos do inimigo e a salvaguardar os desígnios divinos para com Seu povo. Da intensidade desta luta o texto de Esdras 4:2-24 dá-nos um pequeno vislumbre. Israel sofreu intensa oposição em seu esforço para restaurar sua nação, e teria sido esmagado por seus adversários não fosse a intervenção divina na corte da Pérsia. Esta guerra de natureza espiritual se estenderia além dos dias do domínio persa e seria não menos intensa durante o Reino da Grécia. Na realidade, a controvérsia tanto em seu aspecto celeste como terrestre continuaria até que “reino do mundo” se torne “de nosso Senhor e de Seu Cristo” (Apocalipse 11:15).
O seguinte comentário lança luz adicional sobre este verso: “A verdade declarada pelo anjo neste verso ilumina a revelação que segue. A profecia seguinte, um relato de guerra e mais guerra, assume maior significado quando compreendida à luz do que o anjo tinha observado. Enquanto os homens lutam pelo poder terrestre, nos bastidores, e longe dos olhos humanos, uma luta ainda maior se processa, da qual os altos e baixos da condição mundial são um reflexo”.4
Verso 21 O povo dos santos não tem razão para temer, pois tem a seu lado Miguel, que sendo como DEUS e Seu campeão lhe assegura a vitória final. Para Aquele que é o Senhor da História o fluxo e refluxo dos acontecimentos no mundo não encerram surpresa. São-Lhe tão claros como se estivessem escritos na “Escritura da Verdade”. As cenas sucessivas da visão a ser narrada são como páginas tiradas do livro e mostradas ao profeta.
11:1 Este verso é claramente parte do prólogo, pois contém uma palavra final das atividades de Gabriel na esfera terrestre. A visão propriamente dita foi dada a Daniel no terceiro ano de Ciro, rei da Pérsia (10:1). Mas já nos dias de Dario o Medo (5:31; 6:28; 9:1) Gabriel se ocupava em fortalecê-lo e animá-lo.
Siegfried J. Schwantes
Continuaremos
NOTAS
1. J. C. Baldwin, Daniel, p. 181.
2. The SDA Bible Commentary, IV, p. 860.
3. Ibid.
4. Ibid., p. 861.
4. Ibid., p. 861.
– Conversando sobre o Livro de Daniel
– por Ellen White , Profetas e Reis, Capítulo 35
– por Ruth Alencar com texto base de Luiz Gustavo Assis e vídeos da Tv Novo Tempo
– por Ruth Alencar com comentários de Flávio Josefo e Edward J. Young
– por Ruth Alencar
– por Ruth Alencar com comentários de Flávio Josefo
– por Ruth Alencar
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. Uma Introdução ao Livro de Daniel (parte 2) (Siegfried J. Schwantes)
. capítulo 1
. capítulo 2
. Revelação e explicação do sonho de Nabucodonosor (com Comentário de Siegfried J. Schwantes)
. O Reino da Pedra
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. capítulo 3
– por Ruth Alencar com comentário de Siegfried J. Schwantes
– comentários de C. Mervyn Maxwell e Ellen White
. capítulo 4
– comentário de Siegfried J. Schwantes
– por Ruth Alencar com comentários de C. Mervyn Maxwel, Urias Smith e Dr. Cesar Vasconcellos de Souza
. capítulo 5
– por Ruth Alencar com comentários de Siegfried J. Schwantes e C. Mervyn Maxwel
. capítulo 6
– comentários de Siegfried J. Schwantes e C. Mervyn Maxwel
. capítulo 7
– comentários de Siegfried J. Schwantes e C. Mervyn Maxwel.
– por Ruth Alencar
– por Ruth Alencar com comentários de Siegfried J. Schwantes
– com comentários de Siegfried J. Schwantes e José Carlos Ramos
– por Ruth Alencar
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– por Ruth Alencar
– com comentários de Siegfried J. Schwantes e José Carlos Ramos
– por Ruth Alencar
Continuando nossos estudos sobre Daniel 7
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Capítulo 8
– com comentários de Siegfried J. Schwantes e C. Mervyn Maxwel
Continuando nossos estudos sobre Daniel 8
– por Ruth Alencar
. capítulo 9
– com comentários de Siegfried J. Schwantes
– por Matheus Cardoso
. capítulo 11
– Comentário de Siegfried J. Schwantes
Se o livro já me fascina, este cap. 10 me chama a atenção.