Conversando sobre a Reforma Protestante (parte 1)

Chamamos de Reforma Protestante o movimento reformista cristão iniciado no século XVI por Martinho Lutero (Luteranismo), Calvino e Zuínglio (Calvinismo), Menno Simon (Anabatista),  Jan Hus, John Wycliffe (Hussitas), Teodoro de Baza, Jonh Fox e outros. Não é correto afirmar que a Reforma começou com a publicação das 95 teses de Lutero contra diversos pontos da doutrina da Igreja Católica, pois homens valorosos em vários países clamavam no mesmo período por um retorno ao Evangelho. É preciso, no entanto, que ressaltemos que antes mesmo desses homens houve o testemunho dos Valdenses.

Entre os muitos pontos de questionamento dos reformadores estava o pensamento de que a igreja deveria retornar  aos ensinos dos evangelhos, à primitiva pobreza dos tempos dos evangelistas e deveria limitar-se às questões religiosas, deixando o poder político para o estado, representado pelos reis. 
 
Em 1516 e 1517, Lutero proferiu 3 sermões contra as indulgências e em 31 de outubro de 1517 foram pregadas as 95 teses na porta da Igreja do Castelo de Wittenberg. Lutero não desejava sair do catolicismo, sua proposta com suas 95 teses era dialogar com a igreja. Nessas teses Lutero condenava a ‘avareza e o paganismo’ existentes nas cerimônias e tradições da igreja romana. Lutero desejava um diálogo sobre o significado das indulgências. A igreja romana, por sua vez vendo que por toda a Europa se espalhara os questionamentos, abre um processo contra Lutero. O reformador era acusado de heresia e sua excomunhão foi inevitável.
 
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Exilado contra sua vontade no Castelo de Wartburg, em Eisenach, Lutero pode então fazer a tradução da Bíblia para o alemão.
Muitas mudanças aconteceram com o movimento da reforma. Inclusive resultantes de rebeliões armadas, por exemplo a Guerra dos Camponeses nos anos de 1524-1525, liderada pelo pastor Müntzer em resposta aos discursos de Lutero. 
“Como pregador na paróquia de Zwickau, no leste do país, passou a divulgar as teorias da Reforma. Ao contrário de Lutero, Müntzer acreditava que as pessoas simples entendiam muito melhor sua pregação que os nobres e ricos. Sua conclusão de que a Igreja sempre estava ao lado dos ricos e poderosos levou ao conflito com Lutero e seus seguidores, sendo afastado da paróquia em 1521.” O pastor Müntzer propunha uma sociedade sem diferenças entre ricos e pobres e sem propriedade privada, Lutero por sua vez defendia que a existência de classes entre ‘senhores e servos’ era da vontade divina. Essa diferença de opinião levou o rompimento do relacionamento entre os dois. 
Entretanto, os princípios fundamentais da Reforma Protestante são conhecidos como os Cinco Solas:
1- Solus Christus
Todos nós somos naturalmente pecadores. Não somos pecadores porque pecamos, pecamos porque somos pecadores. Fomos excluídos da presença gloriosa de Deus (Romanos 3:23) por conta do pecado. Estamos todos condenados a morte (Romanos 6:23), mas Deus traçou um plano de salvação inclusivo em Cristo Jesus que nasceu, viveu, morreu e ressuscitou por nós. O Deus gracioso e amoroso sacrificou seu Filho Unigênito para fazer justiça em nosso lugar (Romanos 6:24). Não há salvação sem Jesus. Sua obra expiatória na cruz é poderosa e suficiente para salvar todo aquele que verdadeiramente se converter com arrependimento e fé (Atos 20:21). Cremos que Jesus e só Jesus é o mediador entre o Deus santo e o homem pecador (1 Timóteo 2:5).
2- Sola Gratia
Como somos naturalmente pecadores e mortos espiritualmente não podemos fazer nada sozinhos para nos salvar. Não existe nenhum outro caminho para Deus que não seja através de Sua graça. A graça acontece quando recebemos algo que não merecemos. Recebemos o privilégio irresistível de estarmos na presença de Deus, tendo nosso relacionamento restaurado com Ele por meio de Jesus Cristo. A cruz é a maior demonstração de graça da história e não há mais nada que eu e você possamos fazer a respeito da salvação, não existe mérito humano nenhum nela, mas tudo vem de Deus (Efésios 2:8-9)
3- Sola Fide
Através da graça precisamos ter fé em Cristo Jesus como nosso salvador. Ação essa que não temos a capacidade de ter sem a obra regeneradora de Deus, que nos concede nova vida e abre nossos olhos para Sua glória. Se a fé viesse de nós a salvação seria mérito nosso. Até nosso ato de crer é um dom dado por Deus (Efésios 2:8). Nada mais importa para nossa salvação, somos salvo pela fé e não por obras, mas isso não significa que as obras devem ser deixadas de lado. Pelo contrário, as obras são consequências de uma fé genuína e salvadora. São a resposta ética de um pecador arrependido e desejoso de ser fiel ao querer de Deus. A fé sem obras não é verdadeira e não tem poder para salvar, por isso a fé sem obra é uma fé morta que não tem poder de nos dar vida (Tiago 2:26)
4- Sola Scriptura
Temos na Bíblia a revelação suficiente da vontade de Deus. Os cristãos creem que ela contém tudo aquilo que o homem precisa saber. Deus operou na história para completar o Canon bíblico e nada lhe deve ser retirado ou acrescentado (Apocalipse 22:18-19). Mesmo sendo escrita por mãos humanas foi inspirada por Deus e Suas palavras estão de acordo com Sua soberana vontade, servindo para o ensino, a repreensão, a correção e a instrução (2 Timóteo 3:16).
5- Soli deo Gloria
Desde a criação até hoje os atos de Deus serviram para mostrar toda a grandeza e supremacia de Sua glória. Nosso dever como cristãos e filhos de Deus é refletirmos a glória do Pai e reconhecer a Sua soberania em nossas vidas.  Não existe outra maneira de fazer isso a não ser vivendo em humildade diante de Sua majestade, debaixo da Sua autoridade e de acordo com Sua vontade. (Filipenses 4:20)
 
 
A noite de São Bartolomeu em Paris e que se espalhou por várias cidades francesas em 24 de agosto de 1572 foi um acontecimento marcante. Milhares de protestantes foram torturados e assassinados com requinte de crueldade por líderes tanto da igreja como do Estado. Foi o lado prático da Contra Reforma, movimento organizado pela igreja católica contra o protestantismo. Você pode ver mais sobre a noite de São Bartolomeu aqui  .
O maior legado da Reforma Protestante para os cristãos foi o fato de ter colocado a Bíblia em suas mãos e o mais interessante é que tanto protestantes como católicos usufruem dessa benção. Graças aos reformadores a Bíblia foi traduzida do latim para as mais diversas línguas. A possibilidade do conhecimento da Palavra oportunizou a liberdade e diversidade de crenças.
A tradição católica de que a Bíblia deveria ser interpretada somente pelos padres da igreja católica e de que a salvação pela fé dependia das obras, fora derrubada pelos postulados dos princípios fundamentais da Reforma Protestante.
Ellen White em seu livro O Grande Conflito escreveu: “[…] Destituídos das Escrituras, e tendo uma religião de meras formas e cerimônias, que não transmitia luz ao espírito, voltaram às crenças supersticiosas e práticas pagãs de seus antepassados gentios”. (O Grande Conflito)
Os reformadores cumpriram com excelência sua missão: colocar a palavra de Deus nas mãos dos que a desejassem conhecer. Mas, como bem disse Ellen White em seu livro o Grande Conflito, “ a Reforma não terminou com Lutero, como muitos supõem. Continuará até ao fim da história deste mundo. Lutero teve grande obra a fazer, transmitindo a outros a luz que Deus permitira brilhar sobre ele; contudo, não recebeu toda a luz que deveria ser dada ao mundo. Desde aquele tempo até hoje, nova luz tem estado continuamente a resplandecer sobre as Escrituras, e novas verdades se têm desvendado constantemente.” 
Em Mateus 24 Jesus nos adverte de que está chegando a hora em que milhões de pessoas serão esmagadas pelo mais poderoso e sofisticado engano de todos os tempos: Líderes religiosos altamente convincentes serão o braço de um poder que operará “grandes sinais e prodígios para enganar, se possível, os próprios eleitos”  (ver também 2 João 7).
Líderes religiosos? Sim, a Bíblia nos alerta de que a obra mais maligna do Anticristo sairá de dentro do cristianismo. Certamente do cristianismo apostatado. Infelizmente, se percorrermos os traços da História, veremos que tanto esta apostasia como a luta pela verdade de Deus é, de certa forma, histórica.
Em 2 Timóteo 2 o apóstolo Paulo nos dá uma  instrução detalhada sobre a maneira de agirmos diante da instrução de más influências que ameaçam enfraquecer a fé do povo de Deus. Paulo descreveu a igreja de Deus como ‘uma grande casa’: “Ora, numa grande casa, não somente há vasos de ouro e de prata, mas também de madeira e de barro; e uns, na verdade, para uso honroso, outros, porém, para uso desonroso.” (2 Timóteo 2:20)
Paulo anteviu que muitos migrariam do cristianismo consciente para o cristianismo do emocionalismo, do ter e não do ser. Escute o que estão pregando os pastores das mais diversas denominações religiosas. Escute o que estão dizendo os padres e compare com o que Jesus disse e Seus discípulos nos escreveram nas páginas dos evangelhos. Infelizmente, o que temos visto é que há um grande número de cristãos que estão construindo sua fé sobre a filosofia humana, alicerçando-a em homens, líderes religiosos e em objetos de culto. Louvado seja Deus porque em Sua Palavra nos deixou escrito que a salvação não está no status de religião.
E Ellen White continua sua reflexão: “Uma vez Satanás se esforçou por estabelecer um compromisso mútuo com Cristo. Chegando-se ao Filho de Deus no deserto da tentação, e mostrando-Lhe todos os reinos do mundo e a glória dos mesmos, ofereceu-se a entregar tudo em Suas mãos se tão somente reconhecesse a supremacia do príncipe das trevas. Cristo repreendeu o pretensioso tentador e obrigou-o a retirar-se. Mas Satanás obtém maior êxito em apresentar ao homem as mesmas tentações. Para conseguir proveitos e honras humanas, a igreja foi levada a buscar o favor e apoio dos grandes homens da Terra; […] 
Mas os que temem e reverenciam a Deus enfrentam esta audaciosa presunção do mesmo modo porque Cristo enfrentou as solicitações do insidioso adversário: “Adorarás ao Senhor teu Deus, e a Ele somente servirás.” (Lucas 4:8). Deus jamais deu em Sua Palavra a mínima sugestão de que tivesse designado a algum homem para ser a cabeça da igreja. […]
Satanás bem sabia que as Escrituras Sagradas habilitariam os homens a discernir seus enganos e resistir a seu poder. Foi pela Palavra que mesmo o Salvador do mundo resistiu a seus ataques. Em cada assalto Cristo apresentou o escudo da verdade eterna, dizendo: “Está escrito.” A cada sugestão do adversário, opunha a sabedoria e poder da Palavra. A fim de Satanás manter o seu domínio sobre os homens e estabelecer a autoridade humana, deveria conservá-los na ignorância das Escrituras. A Bíblia exaltaria a Deus e colocaria o homem finito em sua verdadeira posição; portanto, suas sagradas verdades deveriam ser ocultadas e suprimidas. Esta lógica foi adotada pela Igreja de Roma. Durante séculos a circulação da Escritura foi proibida. Ao povo era vedado lê-la ou tê-la em casa, e sacerdotes e prelados sem escrúpulos interpretavam-lhe os ensinos de modo a favorecerem suas pretensões. Assim o chefe da igreja veio a ser quase universalmente reconhecido como o vigário de Deus na Terra, dotado de autoridade sobre a igreja e o Estado. […]
A única razão é que a igreja se conformou com a norma do mundo, e, portanto não suscita oposição. A religião que em nosso tempo prevalece não é do caráter puro e santo que assinalou a fé cristã nos dias de Cristo e Seus apóstolos. É unicamente por causa do espírito de transigência com o pecado, por serem as grandes verdades da Palavra de Deus tão indiferentemente consideradas, por haver tão pouca piedade vital na igreja, que o cristianismo, é aparentemente tão popular no mundo. Haja um reavivamento da fé e poder da igreja primitiva, e o espírito de opressão reviverá, reacendendo-se as fogueiras da perseguição.” (O Grande Conflito)
Algo de muito sério precisa acontecer e os cristãos sinceros sabem disto. Falam da necessidade de uma nova reforma, mas me pergunto se não nos bastaria um retorno ao evangelho puro e simples pregado por Jesus.  Paulo não nos exorta a limpar por nós mesmos a “grande casa” na qual convivem as boas e más influências. Por outro lado, nos aconselha a evitarmos nos associar ao mal que está presente na “grande casa”. Ele disse que quem pronuncia o nome de Cristo deve se afastar da iniquidade, mas não nos encoraja a abandonar a “grande casa”. O apóstolo nos instrui a ter uma fé firme, fundada na Palavra e na oração.
“De acordo com a Bíblia, é evidente que o ideal de Deus é levar as pessoas da exclusão à inclusão. No fim dos tempos, Deus vai derrubar as barreiras e dar aos seres humanos um novo vislumbre de Seus propósitos de salvação. A maior barreira contra a inclusão não é o coração de Deus, mas os corações humanos. A verdadeira fidelidade a Deus abrirá o caminho para uma deslumbrante inclusão que envolverá uma multidão vinda de “toda nação, tribo, língua e povo” (Apocalipse 14:6). No fim, a casa de Deus será uma “casa de oração para todos os povos” (Isaías 56:7).
Tal atitude de inclusão será muito animadora e positiva para os pós-modernos. Muitos sofreram abuso físico e psicológico ou negligência da parte de pais e familiares. Vivenciaram casos semelhantes de opressão no contexto de instituições religiosas. Eles levantam suspeita de qualquer pessoa que diga: “Eu estou certo e você está errado.” Antes de estarem dispostos a ouvir o desafio do evangelho, eles precisam experimentar as boas-vindas do evangelho.” (Matheus Cardoso, retirado de Jon Paulien, Everlasting Gospel, Ever-changing World: Introducing Jesus to a Skeptical Generation (Pacific Press, 2008), p. 145-146, 132-133)
A ‘nova reforma’ tem que entender esse processo. Deus estabeleceu uma prova especial para um momento específico e esta prova separará finalmente de uma vez por todas o joio do trigo. O ouro da escoria, transformando a igreja militante em igreja triunfante. Como consequência, os fiéis serão todos reunidos visivelmente em um só corpo. As más ervas existentes hoje no cristianismo serão arrancadas e desraigadas.
A Reforma protestante foi uma obra humana e divina. Precisamos repensar hoje não mais a igreja romana, esta escolheu sua posição, mas, sobretudo a igreja evangélica. Infelizmente, os evangélicos – ou uma parte deles – não deram ouvidos às palavras de Paulo, de que é válido tentarmos não parecer mais loucos do que já nos consideram. Existe no meio evangélico tanta insensatez, falta de sabedoria, superstição  coisas ridículas que acabamos dando aos inimigos de Cristo um chicote para nos baterem. Somos ridicularizados, desprezado, nos tornamos motivo de escárnio, não porque pregamos Cristo crucificado, mas pelas sandices, tolices e bobagens, todas feitas em nome de Jesus Cristo.” (Augustus Nicodemus, O ateísmo e outras ameaças à Igreja, cap. 1. São Paulo. Editora Mundo Cristão. 2011) 
 
Indicamos:

 

 
 
 
 
 
 
Ruth Alencar

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